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Nas valas comuns de Manaus, o luto vai além da pandemia

Mortos pela violência, como o pedreiro Messias Viana, são enterrados em meio a vítimas de coronavírus

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Manaus

O corpo do pedreiro Messias Correa Viana, 26, é o último a ser descido em uma vala comum do cemitério público municipal Nossa Senhora Aparecida, em Manaus, na manhã desta segunda-feira (11). Na cruz pintada à mão, recebeu o número 1.144. Mas ele não morreu vítima da Covid-19 —foi espancado após uma confusão de bar.

Minutos antes do enterro, com a ajuda de um coveiro, a família desparafusa a tampa. Aos prantos, tocam o corpo, provocando uma revoada de moscas. O rosto está desfigurado. O caixão veio direto do IML, sem velório. A família não tinha dinheiro para o embalse, orçado em R$ 1.500.

“Os traficantes mataram ele. Saíram arrastando na rua. Mais de 20 homens que mataram. Queriam o celular. Ele não quis dar e revidou”, disse um dos parentes, sem dar o nome, indeciso entre falar da barbaridade do crime e não se expor.

Segundo o boletim de ocorrência, Viana morreu por volta das 4h do sábado (9). “Ele teria sido agredido fisicamente por várias pessoas, ainda não identificadas, vindo a óbito." Local do crime: beco Alvarães, situado na rua Limão de Cheiro, antiga rua Britânia, invasão Grande Vitória, bairro Gilberto Mestrinho, zona leste de Manaus.

Ninguém foi preso. Segundo o site do Tribunal de Justiça do Amazonas, Viana não tinha antecedentes criminais.

Muito emocionados, os parentes não se conformavam por ele estar sendo enterrado em uma vala comum da ala nova do cemitério, aberta por causa da alta demanda. “Ele não morreu de Covid!”, gritavam ao punhado de jornalistas presentes.

Além de Viana, houve outros 99 sepultamentos nos cemitérios públicos da cidade nesta segunda-feira (11). No ano passado, a média foi de 28 sepultamentos por dia.

Segundo o informe da prefeitura para a data, 13 morreram por "síndrome, insuficiência respiratória ou parada cardiorrespiratória”, 13 por causa desconhecida ou indeterminada, 15 por Covid-19 e outros 10 com suspeita de coronavírus. Esses números indicam uma grande subnotificação de casos em Manaus.

Manaus teve um início de ano particularmente sangrento. Em janeiro, quando a facção Comando Vermelho (CV) tomou os presídios e várias regiões da cidade, houve 106 assassinatos, um aumento de 54% em relação ao mesmo período do ano passado.

Após a vitória do CV, comemorada com um foguetório ouvido em toda a cidade, a violência começou a diminuir. Em abril, foram 35 assassinatos em Manaus, quase metade dos 65 homicídios de abril de 2019.

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