Descrição de chapéu Folhajus cracolândia

Polícia de SP investiga delegado Da Cunha por 'operação Rambo' na cracolândia

Integrantes da cúpula da SSP afirmam que policial, com mais de 3 milhões de seguidores, pode ser demitido

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São Paulo

Como que encarnando o icônico personagem John Rambo, o “exército de um homem só” vivido por Sylvester Stallone nos cinemas, um delegado da Polícia Civil de São Paulo decidiu deflagrar, sozinho, uma operação na região da cracolândia, no centro da capital, área controlada por criminosos do PCC.

“Operação São Paulo em andamento. De volta às ruas. Mas agora sozinho. O tio Da Cunha só sabe uma coisa: para cima deles!”, postou nas redes sociais o delegado Carlos Alberto da Cunha, 42, com uma foto em que segura uma pistola na mão enquanto olha fixo um grupo de pessoas na cracolândia.

Em princípio, tudo não passou de uma encenação para agradar a legião de fãs. Cunha é um fenômeno das redes sociais, com mais de 3 milhões de seguidores. Segundo a Secretaria da Segurança, o delegado está em férias e nenhuma operação oficial foi feita na região da Nova Luz pela 4ª Seccional Norte.

A postagem teve, porém, repercussão negativa na cúpula da Polícia Civil de São Paulo, que determinou, na sexta-feira (16), abertura imediata de um procedimento disciplinar para apurar o caso. Delegados ouvidos pela Folha consideraram a postagem uma afronta, já que Cunha vem respondendo a outros procedimentos internos (a maioria por conta de postagens em redes sociais) e por isso foi afastado das operações de rua.

delegado segura arma
Delegado de polícia de São Paulo publica em redes sociais operação solitária na cracolândia, no centro de São Paulo - Reprodução/Redes sociais

De acordo com integrantes do comando da Segurança Pública ouvidos pela Folha, o delegado pode ser demitido. Na avaliação dos chefes, embora possa agradar leigos nas redes sociais, no meio policial o delegado “vem sendo ridicularizado e ridicularizando a imagem da Polícia Civil”.

Após a publicação da reportagem, o delegado gravou um vídeo no qual disse considerar assédio moral e perseguição.

A investigação sobre a conduta do policial foi aberta porque, segundo os chefes, houve descumprimento de protocolos de segurança que colocaram em risco não só o próprio delegado mas também os usuários de drogas da região, muitas vezes usados como escudo humano por parte de traficantes.

Em junho, por exemplo, a Polícia Civil realizou uma operação de combate ao tráfico de drogas naquela mesma região e empregou um efetivo superior a 500 policiais, com apoio da Polícia Militar e da GCM. Além do reforço aéreo, os policiais chegaram a usar um “caveirão” para adentrar no local.

O delegado responsável pela operação, Roberto Monteiro, explicou à época que o contingente era justamente para não colocar em risco as equipes e, também, os dependentes químicos ali presentes —que poderiam reagir a mando de criminosos. Como um efetivo maior, as chances de reação ficam reduzidas.

Ainda segundo Monteiro, há um histórico de ataques às forças de segurança na cracolândia, como disparos de armas de fogo contra viaturas da polícia e da GCM, além de lá já terem morrido ao menos dois policiais, atacados após serem identificados por criminosos.

Monteiro informou ainda que agentes infiltrados no fluxo tomaram conhecimento da presença de armas longas na cracolândia, categoria que engloba de espingarda calibre 12 a fuzil. Esse armamento longo não foi apreendido na operação de junho e, assim, ainda está em poder dos criminosos.

Ainda segundo a Folha apurou, delegados da Corregedoria da Polícia Civil devem propor à Delegacia Geral que Cunha seja afastado definitivamente de trabalhos externos até que todas as investigações no órgão sejam concluídas. Os policiais dizem que há sete procedimentos sobre ele instaurados.

Há, porém, policiais que consideram não ver irregularidades na foto publicada na cracolândia, até porque a técnica de segurar a arma estaria correta. Esses policiais avaliam que o rigor da Corregedoria tem como objetivo tentar inibir policiais civis que querem usar a polícia para promoção pessoal.

Um dos procedimentos que envolvem Cunha foi aberto pela Corregedoria no início deste ano após o delegado aparecer como garoto propaganda de uma empresa de segurança privada, o Grupo Delta Uno, conforme reportagem publicada pela Folha.

“Liderados pelo delegado dr. Da Cunha, estamos preparados para atender com seriedade, eficiência e superar suas expectativas”, informava o site, com uma foto do delegado com símbolos da polícia, como camiseta preta, colete a prova de balas e distintivo no peito.

Após a reportagem, as referências ao policial foram retiradas do site. A empresa informou ainda que ele (que fazia parte do quadro societário) também se desligou da empresa.

Em resposta à Folha à época, o delegado negou ferir a lei ou a ética.

“Não tendo qualquer participação na administração e gerência da mesma, atuando apenas como consultor e palestrante em segurança condominial, a título de magistério. Da mesma forma não se utiliza do cargo ocupado para qualquer tipo de promoção da referida empresa. A atuação do sr. Carlos Alberto da Cunha na Delta Uno se dá nos mais estritos ditames da lei e da ética”, diz a empresa.

Procurado para comentar sobre a investigação da foto na cracolândia, o delegado Cunha não foi localizado pela reportagem. A Folha enviou mensagens por meio da Secretaria de Segurança Pública, para sua ex-empresa de segurança, para dois emails do próprio delegado e, ainda, uma mensagem para o celular do delegado. Nenhuma delas foi respondida até a publicação desta reportagem.

Após a publicação da reportagem, contudo, Da Cunha gravou um vídeo em que diz não ser investigado, argumentando que o termo se refere a um procedimento policial para apurar a prática de crime. Também afirma que existe apenas uma apuração preliminar relativa a uma possível irregularidade administrativa.

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