Barbeiro da zona leste de SP aprende três idiomas para atender clientes estrangeiros

Com clientela formada por imigrantes que moram em Guaianases, Eraldo Silva cobra R$ 5 pelo corte de cabelo

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Gabriela Alves
São Paulo | Agência Mural

Quem passa em frente ao salão do barbeiro Eraldo Silva, 33, em Guaianases, na periferia da zona leste de São Paulo, é surpreendido por um banner de boas-vindas em português, inglês, espanhol e francês.

Profissional na área há dez anos, Silva se interessou pelo aprendizado de idiomas durante a Copa do Mundo de 2014, sediada no Brasil. Naquele ano, ele tinha um salão em Itaquera, também na zona leste da cidade, e passou a receber clientes estrangeiros em razão do evento.

Segundo ele, os jogos realizados na Neo Química Arena, o Itaquerão, atraíram turistas de diferentes países para a região. "Os gringos chegavam para pedir água, refrigerante ou qualquer outra coisa no salão e eu não sabia falar com eles", conta.

Imagem em primeiro plano mostra homem de boné posando para foto sentado ao lado de um banner com fotos de cortes de cabelo
O profissional busca fazer 50 cortes de cabelo por dia ao custo de R$ 5 cada - Gabriela Alves/Agência Mural

Para melhorar a comunicação, o barbeiro começou a estudar idiomas assistindo a vídeos na internet. "Na época, atendi holandês, americano e pessoas de outras nacionalidades. Isso me incentivou porque é importantíssimo conseguir se comunicar, então não parei mais", explica.

Depois disso, ele engatou no estudo dos idiomas por conta própria e passou a ter uma clientela de imigrantes que moram ou transitam por Guaianases —a região conta com uma população grande estrangeiros vindos de países da América Latina e da África.

"Agora tenho clientes colombianos e bolivianos com quem pratico o espanhol. Falo francês com haitianos e também já cortei o cabelo de nigerianos que falam o inglês britânico", pontua.

Silva ainda relembra o episódio em que atendeu um australiano depois de alguns anos de estudo. "A namorada dele, que é brasileira, o levou até o salão. Ele ficou impressionado porque eu conseguia interagir e conversar. Até tirou foto e disse que só ia cortar o cabelo comigo", recorda.

Outra língua de interesse do barbeiro é o mandarim, que ele começou a gostar após frequentar o Brás, na região central, para fazer compras de roupas, bonés e óculos para vender no salão. O bairro é popularmente conhecido pelo comércio e a presença de chineses.


A história com as tesouras e as maquininhas teve início quando o barbeiro era cliente de uma escola de cabeleireiro no centro de São Paulo. Silva frequentemente palpitava durante os cortes e a proprietária sugeriu que ele investisse na profissão porque tinha o dom.

Ele chegou a se matricular no curso, mas ficou apenas um mês devido à falta de tempo. Para aprender, comprou a primeira máquina de cortar cabelo e barba, e chamou as crianças e adolescentes de Itaquera para fazer os cortes de graça.

"Colocava uma bolacha e um refrigerante para os moleques da vila. No começo foi ‘mó’ luta, as pessoas não queriam ser cobaias", lembra.

Desde 2015, ele também atua com ações sociais em outros bairros da cidade. Diz que começou a pensar em cortes a preços acessíveis quando se deparou com a realidade dos salários baixos em Itaquera, em Guarulhos, na Grande São Paulo e nas favelas de Paraisópolis e Heliópolis, na zona sul da capital. Em contraponto, notava o aumento dos valores na prestação desses serviços.

No começo, os clientes lhe davam R$ 5 como "caixinha" ou para ajudar na gasolina. "Lembro como hoje que tinha uma senhora em Heliópolis que me pagava R$ 20 para cortar o cabelo dos cinco filhos", comenta.

Silva mantém o mesmo valor dos primeiros cortes para reafirmar o propósito da obra social. Gás, água, luz e outros serviços básicos aumentaram, mas ele permanece com o preço de origem no salão que tem na rua Antônio Peçanha, na zona leste. "É um corte profissional com risquinho, disfarce e tudo", diz.

Agora, a meta do barbeiro é realizar 50 cortes por dia, além dos demais serviços oferecidos na barbearia, como a limpeza de sobrancelhas com navalha.

Já a próxima ambição é montar um salão itinerante dentro de um caminhão e fazer os cortes em várias quebradas de São Paulo ou até de outros estados do país.

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