Prima de diretor de mineradora vai chefiar órgão ligado à Serra do Curral

Nomeada por Zema, Marília Palhares Machado comandará instituto que decidirá sobre tombamento estadual; empresa nega proximidade

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Belo Horizonte

O governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), escolheu a arquiteta e urbanista Marília Palhares Machado para assumir a presidência do Iepha (Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico). Marília é prima do advogado Guilherme Augusto Machado, diretor-executivo da Tamisa, empresa que quer instalar um projeto de mineração na Serra do Curral.

Como presidente do Iepha, Palhares assume também o cargo de secretária-executiva do Conep (Conselho Estadual do Patrimônio Cultural). Este é o órgão responsável por votar sobre a aprovação do dossiê de tombamento da Serra do Curral.

O parentesco entre a nova presidente do Instituto e o diretor da Tamisa foi revelado por reportagem da Agência Pública nesta segunda (23).

Fotos da área da Serra do Curral, onde poderá ter início um empreendimento de mineração
Serra do Curral, onde poderá ter início um empreendimento de mineração. - Douglas Magno/Folhapress

A Serra do Curral possui tombamento municipal em Belo Horizonte e os picos são tombados a nível federal pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional). O processo de tombamento estadual está em andamento.

De acordo com o governo de Minas, o dossiê elaborado pelo Iepha recebeu aprovação técnica e o Ministério Público de Minas Gerais recomendou o encaminhamento para aprovação do Conep. No entanto, os municípios de Nova Lima, Sabará e Belo Horizonte questionaram as consequências do tombamento para seu território.

"No intuito de ampliar o debate e somar contribuições aos estudos, além de garantir a manifestação dos municípios, Iepha e MPMG acordaram em aditar o Termo de Compromisso para o possível tombamento. Atualmente, comunicações e reuniões entre os gestores de Belo Horizonte, Nova Lima e Sabará estão sendo realizadas", disse a nota do governo estadual.

Marília Palhares assumiu a presidência do Iepha no lugar de Felipe Cardoso Vale Pires. A nomeação foi publicada no Diário Oficial de Minas Gerais no dia 14 de maio.

No dia 22 de março, o então presidente do Iepha enviou um ofício ao Ministério Público afirmando que o licenciamento ambiental do projeto de mineração da Tamisa na Serra do Curral não havia passado por análise do instituto e não possuía anuência do órgão.

De acordo com o ofício, a última anuência expedida pelo Iepha é do ano de 2018 e se tratava de um primeiro projeto de mineração da Tamisa, que foi descontinuado pela empresa em 2019. O novo projeto foi formalizado em janeiro de 2020 e não passou por análise do instituto.

"Por se tratar de processo hoje em tramitação, com nova solicitação administrativa de licenciamento ambiental do empreendimento/atividade, é necessária a apresentação de estudos completos acompanhados de toda documentação pertinente à avaliação de impacto ao patrimônio cultural para nova análise por este Instituto", diz o ofício.

De acordo com o Ministério Público, o Estudo Prévio de Impacto ao Patrimônio Cultural (EPIC), a ser realizado pelo Iepha, em o objetivo de avaliar a proteção dos bens e a adequação do empreendimento com as leis relacionadas à cultura e ao patrimônio.

"Somente por meio dessa avaliação poderá ser atestada a viabilidade do empreendimento em relação ao meio ambiente cultural. Em outras palavras, sem a documentação (ausente no procedimento a ser deliberado) é impossível aferir a viabilidade do empreendimento no aspecto do patrimônio histórico e cultural", diz a Promotoria em ação que pede a revogação da licença pela Justiça.

O Governo de Minas Gerais afirmou que Marília Palhares Machado foi convidada para ocupar o cargo devido ao seu currículo e trajetória relacionada à defesa do patrimônio histórico. A arquiteta já atuou no Iepha, no Iphan e na Faop (Fundação de Arte de Ouro Preto), entre outras instituições.

Em relação à saída de Felipe Pires, o governo estadual disse que seu pedido para deixar o cargo foi encaminhado há três meses.

Segundo a mineradora Tamisa, o parentesco entre a nova presidente do Iepha e o diretor-executivo da empresa não é proibido por lei. A empresa também diz, em nota, que os dois possuem um relacionamento distante, sem proximidade pessoal. De acordo com a Tamisa, Guilherme Machado é diretor da Tamisa, mas não é sócio nem acionista da empresa.

"Em manifestação oficial ao órgão licenciador, o ex-presidente Felipe confirmou que o projeto já possui análise e anuências emitidas por presidente anterior do Iepha, e que estas dispensam nova manifestação do órgão", diz a nota

"A Tamisa segue as normas legais. As relações com órgãos públicos são estritamente formais e baseadas em princípios éticos, independentemente de quem ocupe cargos políticos, em qualquer momento de seu procedimento administrativo", afirma a nota da mineradora.

O Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Minas Gerais, do qual Palhares foi conselheira entre 2018 e 2020, enviou uma carta aberta à presidente do Iepha. Além de parabenizá-la pela nomeação, o texto diz que o governo está conduzindo o Instituto para um caminho mais técnico e pede que a nova dirigente mostre a importância do tombamento da Serra do Curral.

"Sabemos do momento delicado em que você assume essa função, mas temos a expectativa de que, com sua experiência, você consiga desvencilhar o Iepha das pressões do setor minerário e consiga mostrar ao governo a importância da preservação da Serra do Curral e demonstrar-lhe que, do ponto de vista legal, a Serra já se encontra protegida", diz a carta.

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