Comunidade de Porto Alegre se mobiliza contra rua Filósofo Olavo de Carvalho

Homenagem foi aprovada pela Câmara de Vereadores; autora do projeto diz que críticas são 'politicagem barata'

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Porto Alegre

Parte da comunidade da Vila Orfanotrófio, no bairro Santa Tereza, zona sul de Porto Alegre (RS), está contrariada com a aprovação de um projeto de lei que batiza uma de suas vias como rua Filósofo Olavo de Carvalho.

Um abaixo assinado com mais de 12 mil assinaturas pede que o prefeito Sebastião Melo (MDB) não sancione a lei porque, no entendimento da comunidade, a rua já homenageia uma líder comunitária local.

A imagem, desbotada pelo tempo, mostra uma mulher negra sorridente com um bebê no colo em frente a uma parede com tijolos à vista. O bebê olha para a mulher. A mulher veste bermuda e uma camisa regata com estampas de bolinha enquanto a bebê veste um vestido branco e um laço pequeno na cabeça.
A líder comunitária Odilia Feliciano de Souza, morta em 1995, com a neta - Arquivo pessoal

A lei aprovada em 5 de setembro, de autoria da vereadora bolsonarista Comandante Nádia (PP), gerou protestos de vereadores de esquerda, que classificaram a homenagem como descabida. Uma das reclamações é que Olavo não tinha formação como filósofo.

Um deles, Matheus Gomes (PSOL), esteve na Vila Orfanotrófio. Segundo ele, os moradores ficaram surpresos com a informação de que o bairro receberia a homenagem ao guru intelectual do bolsonarismo.

O logradouro que passaria a homenagear Olavo é um apêndice de poucos metros que hoje, no entendimento dos vizinhos, faz parte da Rua Odilia Feliciano de Souza, batizada em 2007 em homenagem a uma líder comunitária local morta em 1995.

Semianalfabeta e mãe de oito filhos, Odilia fundou o Clube de Mães Força e Esperança para ajudar os demais moradores. Ela era conhecida por pedir doações de retalhos das lojas de tecido do centro de Porto Alegre para transformar em roupas e cobertas para vizinhos.

Pelo menos sete parentes de primeiro e segundo grau de Odilia ainda residem no local. Eles dizem que é uma tradição local homenagear em nomes de ruas e equipamentos públicos do bairro pessoas mortas da própria comunidade. Até 2007, a rua de aproximadamente 120 metros se chamava de Beco F.

"Inicialmente, ficamos ainda mais revoltados porque havíamos entendido que o nome da rua mudaria. Depois, soubemos que é um trechinho dela que seria batizado com o nome desse senhor [Olavo], mas não faz sentido. Não há mais do que três casas ali, e todos se consideram moradores da rua Odilia", declara Ana Luisa Bastos, 53, filha da homenageada.

A Folha tentou contato com Nadia, mas ela não respondeu até a publicação desta reportagem.

No dia da aprovação na Câmara, a vereadora disse que as críticas eram "mais demagógicas do que técnicas" e "politicagem barata", dado que o projeto havia cumprido todos os pré-requisitos técnicos para ir a plenário.

Nadia disse ainda que Olavo foi uma pessoa "diferenciada, com trabalho profícuo não apenas no Brasil, mas mundo afora". Os vereadores aprovaram a homenagem por 18 votos a 9.

Esse não é a primeira polêmica envolvendo a Câmara Municipal de Porto Alegre e nomes de ruas.

Por quatro anos, vereadores de direita e de esquerda lutaram pelo nome da avenida Castelo Branco, uma das principais na saída da cidade, que em 2014 passou a se chamar de avenida da Legalidade e da Democracia.

Em 2018, em razão de irregularidades no rito de votação, uma ação na Justiça determinou que ela voltasse a homenagear o primeiro presidente da ditadura militar.

Ainda em 2018, a Casa foi palco de uma nova disputa, dessa vez sobre a pertinência de uma rua Marielle Franco.

Após o projeto ter sido aprovado, vereadores de esquerda tentaram voltar atrás por considerar que a via escolhida —praticamente um terreno baldio— não dava o destaque que a homenageada merecia.

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