Cidade de padre Cícero deve receber 400 mil fiéis em feriado de Finados

Além da estátua do religioso, Colina do Horto de Juazeiro do Norte abriga museu e igreja em construção

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Juazeiro do Norte (CE)

Praça Padre Cícero, hotel Padre Cícero, farmácia Padre Cícero. Em Juazeiro do Norte, a 531 km de Fortaleza, por todo lado há referências a padre Cícero Romão Batista (1844-1934), o líder religioso que atrai milhões de peregrinos ao interior do Ceará para suas romarias, que são pelo menos nove ao longo do ano.

Em agosto, o Vaticano autorizou a abertura do processo de beatificação do religioso, chamado pelo povo de Padim Ciço. Juazeiro do Norte se prepara para receber mais de 400 mil fiéis em sua maior romaria do ano, a de Finados, nos dias que antecedem o 2 de novembro.

estátua de padre cícero com por do sul ao fundo
Estátua do padre Cícero erguida em 1969, com 27 metros de altura, em Juazeiro do Norte (CE) - Adriano Alves/Folhapress

Entre a Romaria de Morte do Padre Cícero, realizada em julho, e o feriado de Nossa Senhora Aparecida, no 12 de outubro, a cidade recebeu mais 350 mil fiéis, de acordo com a Secretaria Municipal de Turismo.

Em setembro, a Romaria de Nossa Senhora das Dores, padroeira do município, marcou a volta das atividades sem nenhuma restrição.

Abençoando a cidade, no alto da Colina do Horto, está a estátua do religioso. Com 27 metros de altura, o monumento foi erguido em 1969.

Junto com ela, formam o chamado geossítio o Horto, o Museu Vivo Casarão do Padre Cícero, a Igreja do Senhor Bom Jesus do Horto, em construção desde 1999, e a trilha do Santo Sepulcro, área ecológica de peregrinação.

O local, antes da pandemia, recebia cerca de 2,5 milhões de pessoas por ano. "A expectativa é que, nos próximos meses, o retorno de milhares de visitantes volte a acontecer", diz Fran Santana, gestora do Horto.

Padre Cícero chegou à região do Cariri há 152 anos, quando a cidade ainda era a Vila Tabuleiro Grande, e iniciou sua forte atuação religiosa e política, sendo o primeiro prefeito de Juazeiro do Norte e até vice-governador do Ceará.

Sua ligação com supostos milagres fez sua imagem ser venerada no catolicismo popular do Nordeste, mas o padre chegou a perder suas ordens religiosas na Igreja Católica. Foi perdoado em 2015 e, só recentemente, o Vaticano autorizou a abertura do seu processo de beatificação.

O horto antes era conhecido como Serra do Catolé, onde havia uma capelinha, e pertencia ao próprio Padre Cícero. Ali, ele construiu o casarão que posteriormente virou museu e, após sua morte, suas terras ficaram de herança aos salesianos.

"O horto é um dos espaços mais expressivos da experiência religiosa do Romero em Juazeiro. Costuma-se dizer que na briga que padre Cícero travou com a Igreja Católica, no final do século 19, ele subia a Serra do Catolé como um espaço de contemplação", diz a antropóloga da Urca Renata Marinho Paz.

Segundo a antropóloga, a serra passou a ser associada a locais bíblicos marcados pela penitência, como o horto das Oliveiras.

Os seguidores construíram o que hoje é o bairro do Horto, junto com comerciantes que lucram com vendas de velas e imagens sacras. Na entrada do geossítio, antes dos grandes portões, um cruzeiro é espaço de orações e também de descanso da longa subida.

detalhe de terço branco em mãos de idosa que veste branco
Maria de Lourdes Soares Tenório, 90, com um rosário herdado do padre Cícero - Adriano Alves/Folhapress

Sentada em um banco de madeira na capela de orações, Maria de Lourdes Soares Tenório, 90, dedilha as contas de seu rosário branco.

A peça é herança de Padre Cícero, de quem é neta por consideração, pois sua mãe foi uma das crianças do orfanato que o líder religioso manteve na cidade.

Questionada sobre sua fé nos milagres do "padim", ela não titubeia: "Ninguém acredita [nele] mais do que eu". Maria diz que visita sempre o horto e todo dia 20 do mês veste preto. "É promessa. A família toda, homens e mulheres vestem, pois cada um fez sua promessa."

Ao seu lado, a filha Maria da Guia Costa de Oliveira, 58, que mora em Teresina, diz que aproveitou a estadia para "visitar meu Padim Ciço".

"Ele é muito milagroso, a gente já alcançou muitas graças por ele. Quando eu tinha 15 anos, botava muito sangue pelo nariz e mamãe fez promessa para eu colocar preto e, desde então, todo dia 20 eu uso", conta a revendedora de cosméticos.

As bênçãos por intermédio do padre milagreiro se multiplicam nas histórias da família, contam sobre uma neta que veio abraçar a estátua e conseguiu um emprego para o pai, além de um neto que conseguiu a tão sonhada vaga na faculdade e deixou uma foto no museu.

Os ex-votos fazem parte de uma forte tradição do catolicismo. É o ato de deixar algo que represente a bênção alcançada, como fotos, peças em gesso, roupas e outros objetos. No Horto, a prática já era comum antes da abertura do Museu Vivo e está espalhada por vários espaços.

Aos pés da estátua, as pessoas abraçam, encostam a testa, escrevem nomes na parede e sempre perguntam "já fez as três voltas?". O ritual é de circular o cajado da estátua três vezes entoando seu pedido. "Tem que falar com fé", orienta um mais atento.

pedaços de pernas e mãos feitos madeira pendurados em telhado
Ex-votos são espalhados pelo Horto como forma de gratidão pelas bênçãos alcançadas - Adriano Alves/Folhapress

De joelhos, de carro ou teleférico

A tradição dos romeiros é percorrer os mais de dois quilômetros da ladeira do Horto a pé. Dependendo da promessa, alguns carregam pedras na cabeça ou fazem o trajeto de joelhos, inclusive o costume criou um novo ponto turístico, a Pedra do Joelho, local onde param para descansar.

A visita já é possível de carro até a entrada do geossítio ou até de teleférico, equipamento recém-inaugurado que tem lá uma parada, a Estação Beata Maria de Araújo, em homenagem à protagonista do milagre da hóstia, cuja história diz que em sua boca uma hóstia dada pelo padre Cícero virou sangue.

O espaço fica aberto diariamente das 7h às 17h. A celebração de missas é realizada de segunda a sábado, sempre às 8h. Contando com mais sessões aos domingos, nos horários de 7h30, 9h, 10h30 e 19h. A entrada é gratuita, mas a gestão é feita com doações dos fiéis.

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