Descrição de chapéu yanomami

Senador pró-garimpo recua, e comitiva cancela ida à terra yanomami

Chico Rodrigues pressionou, mas não conseguiu derrubar veto de órgão do Ministério da Saúde

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Brasília

Chico Rodrigues (PSB-RR), presidente da Comissão Yanomami do Senado, recuou e decidiu cancelar a visita parlamentar à Terra Indígena Yanomami após tentar e não conseguir reverter o veto do COE (Centro de Operações Estratégicas), instância do Ministério da Saúde.

A negativa foi feita nesta terça (11), um dia antes da previsão do início das agendas. O COE avaliou existir risco sanitário ao povo yanomami por causa da crise de malária e afirmou que, no momento, apenas profissionais de saúde devem poder entrar na área —a posição foi reiterada pela Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas).

Ofício obtido pela Folha mostra que Rodrigues, defensor do garimpo e apoiador de Jair Bolsonaro (PL), ainda pressionou e pediu a revisão do entendimento dos órgãos, "tendo em vista que houve um mal entendimento".

Chico Rodrigues, senador que preside a comissão Yanomami
Chico Rodrigues, senador que preside a comissão yanomami - Edilson Rodrigues - 22.dez.2022/Agência Senado

Segundo o senador, a negativa teria acontecido apenas porque o órgão sanitário entendeu que a visita duraria dois dias e não duas horas. O documento, no entanto, em nenhum momento cita a questão da malária, justificativa dada pelo COE para o veto.

Ainda nesta quarta ele ligou para a presidente da Funai, Joenia Wapichana, reiterando o desejo de entrar no território, mas não teve efeito.

Questionado pela Folha durante a tarde, por meio de sua assessoria, Rodrigues afirmou que que manteria a visita à base militar de Surucucu (que fica dentro do território) e que tentava dar um jeito de conseguir a autorização.

No início da noite, no entanto, a reportagem foi comunicada que a visita havia sido cancelada e que apenas agendas fora do território seriam realizadas.

Antes, senadores da base do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Humberto Costa (PT-PE) e Zenaide Maia (PSD-RN), já haviam desistido da viagem. "Cancelei minha ida pela orientação do COE e da Funai", disse ela, citando que as restrições sanitárias devem prevalecer.

Por outro lado, nomes bolsonaristas e pró-garimpo mantiveram a agenda, fora da TI Yanomami. Mecias de Jesus (Republicanos-RR) e o Astronauta Marcos Pontes (PL-SP) embarcaram no fim da tarde desta quarta para Roraima, em voo da FAB (Força Aérea Brasileira).

A comissão instaurada no Senado vem sendo criticada justamente por ter membros ligados não ligados às causas indígenas. A própria senadora Damares Alves (Republicanos-DF) vem marcando presença nas reuniões do grupo e foi especulada na viagem.

Desde que foi decretado estado de emergência sanitária na Terra Indígena Yanomami, o COE é quem organiza e controla as ações na região, inclusive a entrada e saída do território, atribuição que usualmente é da Funai. A exceção é o trânsito de militares.

Na manhã desta terça, em email obtido pela Folha, o órgão respondeu à solicitação feita pela comissão de senadores para visita a aldeias desta quarta (12) até sexta-feira (14). No documento, pede-se que seja evitada a entrada de "equipes que não sejam de saúde" na área.

"Considerando o surto de malária no território yanomami e a necessidade de ampliar nossos esforços para encaminharmos o maior número de profissionais ao território, o COE Yanomami não aprova essa solicitação, sugerimos os dias 20 a 22/04 para a entrada dos mesmos", afirmou o COE.

A Funai encaminhou a mensagem a Rodrigues, presidente da comissão, na tarde desta terça. Mesmo com a falta de autorização, o senador queria manter a viagem.

A Funai não só endossa a posição do COE, como também cita uma nota, emitida por três instituições indígenas da região, da qual consta a queixa de que a comitiva não é integrada por nenhuma liderança da região.

"A população dos povos Yanomami e Ye’kwana enfrenta atualmente uma aguda crise humanitária em consequência da desassistência sanitária e impactos da invasão de suas terras pelo garimpo, causando sua maior vulnerabilidade a doenças infectocontagiosas, desnutrição, bem como à violência associada ao garimpo", afirmaram, em nota, as entidades Hutukara Associação Yanomami, Urihi Associação Yanomami e Associação Wanasseduume Ye’kwana.

Em fevereiro, a primeira viagem dos senadores a Roraima acabou virando alvo do Ministério Público Federal, após a Funai apontar para irregularidades na visita justamente de Rodrigues.

A entrada do senador no território ocorreu sem que houvesse um acordo prévio com o COE e sem aval da Funai, segundo fontes envolvidas nas ações de emergência.

Rodrigues é um defensor do garimpo em terras indígenas. No último dia 15, ele foi eleito presidente da comissão temporária do Senado sobre a situação dos yanomamis.

Em 2021, ele integrou uma comitiva de parlamentares para averiguar a situação dos yanomamis. Na viagem, faltou a agendas do grupo e preferiu comparecer à eventos de obras do governo do estado, do qual é aliado.

A operação de desintrusão do garimpo na terra indígena tem registrado dificuldades para enfrentar invasores em áreas mais profundas do território, uma vez que, apesar do bloqueio da Força Aérea Brasileira (FAB), os acampamentos continuam sendo abastecidos por vias aéreas.

Por isso, no último dia 6, a FAB determinou o fechamento total do espaço aéreo na região. Até então, havia um corredor liberado para que garimpeiros deixassem a área.

A restrição no espaço aéreo sobre o território yanomami começou no dia 1º de fevereiro. No entanto, relatos e vídeos que circularam em grupos de WhatsApp e nas redes sociais mostram que aeronaves continuavam a operar, levando comida, combustível e até armamento para acampamentos ilegais, sobretudo na região do Mucajaí e em áreas mais distantes da terra indígena.

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