Reconhecimento facial em SP começa com 1% das câmeras e sem central de dados

Aparelhos do Smart Sampa devem ser integrados aos órgãos de segurança e outros sistemas apenas em 2024

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São Paulo

A Prefeitura de São Paulo iniciou no último dia 16 a operação do Smart Sampa, projeto de monitoramento com reconhecimento facial que terá ao menos 20 mil câmeras distribuídas pela cidade.

Até esta sexta (27), no entanto, somente 200 câmeras foram instaladas na capital, todas na região central. Além disso, os equipamentos ainda não estão integrados a outras instituições, como Polícia Militar, Samu, CET (Companhia de Engenharia de Tráfego), Defesa Civil e GCM (Guarda Civil Metropolitana).

A expectativa da gestão Nunes é chegar a 40 mil dispositivos de monitoramento. Esta conta inclui 20 mil câmeras que serão compradas para o Smart Sampa, além de 10 mil aparelhos de concessionárias e ainda câmeras de moradores que quiserem aderir ao programa.

O programa deve ganhar sua central de operação até fevereiro do ano que vem. Segundo Júnior Fagotti, secretário-adjunto de Segurança Urbana do município e responsável pela implantação do Smart Sampa, serão, então, 5.000 câmeras de monitoramento na cidade. Tais condições já estavam previstas no edital.

Tecnologia de reconhecimento facial usada na linha 3-vermelha - Eduardo Knapp - 21.nov.2022/Folhapress

A gestão Ricardo Nunes (MDB) não revela o endereço exato dessas câmeras sob a justificativa de despistar a ação de vândalos. No mês passado, alguns dispositivos instalados na cracolândia, na região central, foram depredados.

Espaços públicos como escolas e UBSs (Unidades Básicas de Saúde) também receberão equipamentos. Ao todo, serão 3.300 câmeras no centro, 6.000 na zona leste, 3.500 na zona oeste, 2.700 na zona norte e 4.500 na zona sul.

Esta primeira fase, até fevereiro de 2024, será destinada a treinamento de equipes, adaptação ao sistema e ajustes tecnológicos, diz a gestão municipal. Servidores da GCM, por exemplo, estão começando a se familiarizar com o programa.

"Além do treinamento, nesse período vamos investigar e, se tiver erros, buscar soluções. Como exemplo, se falhar na leitura de uma placa de carro, temos que corrigir já", afirmou Fagotti à Folha.

A promessa do prefeito de integrar o Smart Sampa a estruturas policiais e outras autarquias também fica para fevereiro.

"É óbvio que se acontecer de um flagrante ou se tiver uma câmera que captou um delito e a polícia pedir, a imagem será disponibilizada. As câmeras já estão oficialmente captando imagens, mas o foco é no treinamento, não é no monitoramento", afirmou o secretário.

Ele também citou um episódio que, segundo ele, poderá ser esclarecido com a ajuda das câmeras do Smart Sampa.

"O que aconteceu na cracolândia nesta semana, se tivesse uma câmera, a gente ia fornecer as imagens para a polícia elucidar o caso. Só que, naquele lugar, ainda não tinha câmera", diz Fagotti.

No domingo (22), um motorista atropelou um grupo de pessoas e deixou ao menos 16 feridos na região que concentra usuários de drogas. Em depoimento à polícia, o homem disse que acelerou após ter sido roubado.

A central de monitoramento do Smart Sampa irá ocupar pelo menos um andar do edifício Palácio dos Correios, no vale do Anhangabaú. A Secretaria Municipal de Infraestrutura Urbana e Obras diz estar fazendo ajustes no imóvel, a partir de uma concessão de uso dada pelo governo federal.

A central irá contar com uma base de dados usada para identificar desaparecidos e foragidos importadas do Ministério da Justiça e Segurança Pública e da Secretaria da Segurança Pública de São Paulo.

"A pessoa que se evadiu do sistema carcerário estará na base de dados. A plataforma tem alguns critérios, com nível de confiança de semelhança da imagem de, no mínimo, 90%. O agente, então, dispara um alerta para os servidores da segurança", disse Fagotti.

Outro exemplo citado pelo secretário-adjunto é o de um carro que, após registro de furto, terá sua placa e características inseridas em uma base de dados. Cada câmera que tiver flagrado esse veículo irá gerar um alerta às forças de segurança.

O consórcio vencedor da licitação, formado pelas empresas CLD Construtora, Laços Detentores e Eletrônica LTDA, Flama Serviços LTDA, Camerite Sistemas e PK9 Tecnologia e Serviços LTDA, propôs investir R$ 9,8 milhões para operar o serviço.

O consórcio deve fazer um investimento inicial de R$ 120 milhões para adquirir as 20 mil câmeras, que serão distribuídas pela cidade ao longo de 18 meses.

O edital chegou a ser suspenso após sete representações questionarem pontos como o modelo da licitação e as violações da Lei Geral de Proteção de Dados e dos direitos de minorias.

"A discussão só ajudou a melhorar o edital, tem dois cadernos com mais de 100 páginas sobre proteção de dados e ética da informação. A gente debateu bastante com o Tribunal de Contas do Município, o que foi muito positivo", afirmou Fagotti.

A primeira versão do documento continha termos racistas. Dizia, por exemplo, que cor da pele e casos de "vadiagem" seriam usados como critérios para identificar suspeitos nas imagens. Na ocasião, a gestão afirmou que a inclusão de tais termos aconteceu por erro de tradução do manual das câmeras.

Uma das críticas ao Smart Sampa é que o uso de reconhecimento facial na segurança pública mira de maneira desproporcional a população negra e pode levar a prisões injustas. Outra crítica é que faltou a participação de representantes de grupos potencialmente afetados pelo projeto na estruturação e operação do programa.

"É um programa que gera paixões, tem muita coisa que foi dita e não é verdade. Óbvio que a plataforma não é racista e não tem nenhum viés, mas temos todos os cuidados para não cometer nenhum tipo de injustiça", defende o secretário.

A prefeitura anunciou, no início deste mês, que faria mudanças no comitê municipal de governança de dados, criado por decreto em 2021 para permitir a participação de organizações da sociedade civil e de caráter científico, tecnológico e de inovação com atuação comprovada no tema.

O comitê não é exclusivo para o Smart Sampa e lida com todas as questões que envolvem proteção de dados na cidade. Em nota enviada nesta sexta, a prefeitura afirmou que o órgão ainda não foi alterado.

A avaliação rotineira da operação do programa será feita, segundo a gestão Nunes na assinatura do contrato, pelos entes públicos que participarão do projeto, com a publicação de análises periódicas dos resultados.

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