Suspeito apontado como líder de milícia do Rio é solto por engano após falha de comunicação

Seap diz não ter sido notificada pela Justiça, e Peterson de Almeida, que seria ligado ao miliciano Zinho, foi solto no domingo (29); defesa nega acusações

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Rio de Janeiro

Um homem acusado de fazer parte de uma milícia foi solto no Rio de Janeiro após um suposto erro de comunicação entre o TJ-RJ (Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro) e a Seap (Secretaria de Administração Penitenciária). Peterson Luiz de Almeida, conhecido como Pet, deixou no domingo (29) o presídio José Frederico Marques, em Benfica, na zona norte da cidade.

Almeida estava preso temporariamente desde o final de agosto, suspeito de integrar a milícia e comercializar armas de fogo ilegalmente. Ele é apontado como uma das lideranças do maior grupo miliciano do Rio, chefiado por Luís Antônio da Silva Braga, o Zinho.

A prisão temporária de Almeida chegou a ser prorrogada por mais 30 dias, em setembro, mas expirou no último fim de semana, o que fez com que ele fosse solto.

A defesa do suspeito nega as acusações contra ele e disse que não foi notificada, até o momento, sobre a conversão da prisão em preventiva.

Foto de identificação de Peterson Almeida. Ele é um homem negro e jovem, por volta dos 30 anos.
Apontado como um dos líderes da milícia no Rio, Peterson Luiz de Almeida foi solto após suposto erro de comunicação entre o Tribunal de Justiça e a Secretaria de Administração Penitenciária - Reprodução

Em nota, o TJ-RJ disse que não teve responsabilidade no caso, já que "as normas foram seguidas e o mandado de prisão preventiva inserido adequadamente no Banco Nacional de Mandados de Prisão (BNMP)".

A Seap, por sua vez, afirmou não ter sido informada por meios oficiais da conversão da prisão temporária em preventiva, o que impediria a soltura de Almeida. Sem a notificação da Justiça, o suspeito foi solto.

O governo do estado foi procurado para que se manifeste a respeito da soltura, mas não respondeu até a publicação deste texto.

A Seap afirma que, na noite desta segunda (30), o TJ-RJ entrou em contato e disse ter enviado o pedido de mudança para um email da Seap, que, segundo a pasta, está desativado há cinco anos.

Já o tribunal disse que usa o email como cautela, isto é, meio adicional para passar a ordem de mudança do tipo da prisão.

Com o fim do prazo da prisão temporária de Almeida, a Seap recebeu no domingo um comunicado da Polícia Civil afirmando que já não havia mandado de prisão contra o suspeito —nem pendente, nem em cumprimento—, o que significaria a mudança do tipo de pena. Assim, o homem foi solto pela Seap.

Documento do BNMP mostra que até as 19h49 desta segunda não havia mandado de prisão contra Almeida, afirma a Seap. O TJ-RJ, que é o responsável pela inclusão do mandado de prisão no banco nacional, não informou quando incluiu o documento contra Almeida no sistema.

Documento do BNMP diz: "Não foram encontrados mandados de prisão ou de internação pendentes de cumprimento para: NOME: PETERSON LUIZ DE ALMEIDA. Pesquisa realizada em 30/10/2023 às 19h49min".
BNMP (Banco Nacional de Monitoramento de Prisões) indica que até a noite de 30 de outubro não havia mandado de prisão contra Peterson Luiz de Almeida - Reprodução

Na manhã desta terça (31) já há um mandado de prisão em aberto contra o miliciano. A data de expedição que aparece no sistema é 26 de outubro —nesse dia, o Ministério Público do Rio noticiou que havia conseguido na Justiça a conversão da prisão temporária em preventiva.

No processo, o juiz responsável pelo caso, Richard Robert Fairclough, deu um prazo de 48 horas para que a Seap prestar esclarecimento sobre o caso.

Em nota, a Seap afirma que mantinha contato frequente com o TJ-RJ pelo e-mail ativo da pasta. Diz, ainda, que no final de setembro chegou a alertar sobre o fim do prazo da prisão temporária de Almeida no dia 28 daquele mês.

"Ao identificar a iminência do término do prazo da prisão temporária do citado, enviou pelo endereço de e-mail de uso regular entre os órgãos, no dia 25 de setembro, um alerta à Justiça sobre a situação", diz a nota.

No e-mail enviado, a Seap questiona se a prisão de Almeida seria revogada ou convertida em preventiva. Após a troca de mensagem entre os dois órgãos, a prisão temporária do suspeito foi prorrogada por mais 30 dias. "Ocorre que o prazo [da prisão temporária de Almeida] termina em 28 de setembro. Assim, questionamos sua revogação ou a decretação da prisão preventiva", diz o e-mail enviado pela Seap ao TJ-RJ ao qual a Folha teve acesso.

E-mail da Secretaria de Administração Penitenciária do Rio enviado ao Tribunal de Justiça questionando se prisão de Peterson de Almeida seria revogada ou transformada em preventiva.
E-mail enviado pela Seap ao TJ-RJ questionando se prisão de Peterson de Almeida seria revogada ou transformada em preventiva - Reprodução

Crise de segurança

A soltura de Almeida acontece em meio à crise de segurança no Rio de Janeiro, que se intensificou na semana passada. No dia 23, um trem e 35 ônibus foram incendiados na zona oeste da cidade em ação em represália à morte de um miliciano ligado a Zinho.

De acordo com o Ministério Público, Almeida, aliado de Zinho, negociava armas e planejava execuções de integrantes de grupos rivais. Ele é apontado como uma das lideranças da milícia e atua principalmente nos bairros de Sepetiba e Nova Sepetiba, na zona oeste.

Almeida foi preso pelo Gaeco (Grupo de Atuação Especializada de Combate ao Crime Organizado) em ação conjunta com a Polícia Federal, no final de agosto.

Presos soltos por engano

Almeida não é o primeiro criminoso a ficar de fora do banco nacional de mandados de prisão. No início do mês, a Folha revelou que o nome de Wilton Quintanilha estava fora do BNMP apesar de ele ser considerado foragido pela Justiça fluminense.

Conhecido como Abelha, Quintanilha é considerado um dos principais líderes do Comando Vermelho e era um dos alvos da operação que durou seis dias no Complexo da Maré, no início do mês.

O traficante, que já havia sido preso, também deixou a prisão após uma falha de comunicação entre a Justiça e a Seap. Quintanilha saiu pela porta da frente do Complexo Penitenciário de Bangu, na zona oeste do Rio, em 2021, mesmo com mandado de prisão ativo. Ainda restavam 18 anos de prisão pelo crime de homicídio; ele já havia cumprido 19 anos preso, incluindo uma passagem por presídio federal.

A Seap afirmou, na ocasião da sua saída, que houve falha de comunicação entre o Judiciário e o complexo penal. Assim que passou pela porta da frente do presídio, Abelha recebeu um aperto de mão do então secretário de Administração Penitenciária, Raphael Montenegro, cena gravada pelas câmeras do presídio.

Tanto Abelha como Zinho são apontados pelo governador Cláudio Castro como os principais alvos das ações policiais do Rio.

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