Passageiros brigam para pegar ônibus durante greve em São Paulo

Trabalhadores temem represálias de patrões e descontos no salário

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São Paulo

A calmaria nos acessos fechados à estação Jabaquara do metrô de São Paulo, às 5h desta terça-feira (28), precedia a tormenta instaurada uma hora depois nos pontos de ônibus próximos, em que passageiros formavam um amontoado atrasado para o trabalho. Brigas pipocavam por espaço nos veículos em meio à greve do transporte por trilhos na capital.

Eleni Barreto, 43, se viu envolvida em uma das confusões. Tentava embarcar rumo à Barra Funda, na zona oeste da capital, quando foi empurrada e reclamou da atitude. Em seguida, foi ofendida.

Um fiscal acompanhava a situação a poucos metros, mas nada fez. A cada novo coletivo, surgia ocorrência similar. Algumas pessoas cogitaram chamar a polícia.

Passageiros se espremem para entrar em ônibus lotado na região da estação Jabaquara - Danilo Verpa/Folhapress

Técnica em enfermagem, Barreto tinha ciência da paralisação desta terça. Os motivos, porém, não importam para ela, que diz só lamentar os transtornos causados à população. "Meu trajeto costuma durar 40 minutos, no máximo. Hoje, eu nem sei. É um terror."

Um colega de trabalho a acompanhava. Paulo César, 36, estava temeroso. Em período de experiência, temia sofrer represália pelo atraso. O sentimento foi agravado por uma ligação da chefe, que anunciou desconto no salário em razão das horas perdidas.

César e Barreto deveriam entrar na empresa às 7h. Vinte minutos antes disso, ainda tentavam embarcar.

Iracema Lima, 50, estava mais tranquila. Cantarolava enquanto outros gritavam. Ela saíra de sua casa, em Diadema, na Grande São Paulo, às 4h30. Deveria estar no escritório em que trabalha, na Consolação, centro da capital, às 6h. Sabendo ser impossível cumprir o cronograma, resignou-se. "O jeito é sorrir, vou me estressar por isso? Nunca, dá rugas", diz. "Olha esse povo brigando, parecem animais."

Enquanto aguardava, Lima observava constantemente o preço de um carro por aplicativo. Às 6h30, pagaria R$ 40 pela viagem. Às 6h50, R$ 60. Às 7h10, R$ 80. Desistiu.

"Apoio a luta desse povo contra o governo, mas tem que valer muito a pena. Estamos sofrendo, viu?", declara.

Na zona leste da capital, os passageiros encontraram acessos fechados em parte das estações de trens e metrô na madrugada desta terça. Por volta das 4h20, quem tentava embarcar na estação Corinthians-Itaquera (que faz a integração da linha 3-vermelha e da 11-coral), não conseguia subir as escadas que levam às catracas. Às 4h30, somente o acesso para os trens abriu. A circulação na linha 11-coral estava limitada ao trecho entre Guaianases e Luz.

Em meio à greve, os trens da CPTM foram operados por maquinistas ou supervisores que não aderiram à paralisação. Já no metrô, a condução esteve a cargo dos supervisores de tráfego, segundo a companhia.

Para Tiago Silva, 31, o debate vai além de privatizar ou não os serviços de transporte. Ele mora em Guaianases e trabalha na região da Barra Funda. "Não é só transporte. Você tem a zona leste que atravessa a cidade para trabalhar porque não tem uma estrutura de emprego", afirmou. "Se não tem uma opção de trampo a 30 minutos de casa, a pessoa enfrenta 2h de locomoção."

Silva entende que a greve é um direito constitucional, mas acha que faltam outras reivindicações. "Temos obras atrasadas de metrô, estamos em 2023 e elas estavam previstas para 2020. Não vejo a mesma mobilização para cobrar". Ele aguardava um colega de trabalho para dividir um carro de aplicativo custeado pela empresa.

O pedreiro Genivaldo Ribeiro, 52, estava também na estação Itaquera na dúvida sobre como chegar a Osasco. Normalmente, vai de trem até o Brás para chegar à Barra Funda e, de lá, ir até Osasco, para chegar às 5h40 no trabalho.

"Eu estava sabendo da greve, mas a gente precisa vir para mostrar ao patrão que tentou", disse. Após avaliar que não seria possível chegar no horário, Genivaldo desistiu.

No fim da tarde, a volta para casa dos paulistanos foi tranquila. Funcionários do metrô e da CPTM ouvidos pela reportagem na estação da Luz relataram movimento menor de passageiros do que em dias normais.

Em frente à estação, foram disponibilizadas linhas de ônibus que seguiram o trajeto até o Tucuruvi, na zona norte. Os coletivos partiram vazios. Um dos usuários foi o auxiliar Carlos Eduardo Almeida, 51, que trabalha no centro e costuma voltar para casa de metrô. "Se for para o bem do transporte público, tem que parar mesmo", disse, em apoio à greve.

No terminal Pinheiros, o fim da tarde também foi tranquilo, não foram relatadas filas nem confusão para os passageiros entrarem nos ônibus.

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