Descrição de chapéu trânsito

Taxa de mortes no trânsito em cidades do interior de SP supera a da capital

Prefeituras líderes de ranking inédito reclamam que acidentes em rodovias inflam estatísticas locais; DER e concessionárias dizem investir em segurança viária

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São Paulo

As taxas de mortalidade no trânsito de cidades do interior paulista superam as da capital do estado e de cidades da região metropolitana de São Paulo.

Os dados fazem parte da nova versão do Infosiga (sistema do governo estadual de monitoramento da letalidade do trânsito), lançada no mês passado, que passou a rankear os municípios mais letais, entre os com população acima de 300 mil habitantes.

Enquanto em Sorocaba —líder da classificação— essa taxa é de 15 mortes por 100 mil habitantes, na cidade de São Paulo —21ª na lista—, ela está em 8,57.

Em todo o estado, o indicador é de 13,13. A meta do governo é reduzir para 5,68 até 2030.

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Roupas, placas, capacetes e outros pertences do grupo de motociclistas ficaram espalhados depois de acidente com três mortes em rodovia na região de Campinas (SP) - Reprodução - 23.jul.23/EPTV Campinas

Segundo o Detran-SP (Departamento de Trânsito de São Paulo), responsável pela estatística, os dados são de maio de 2023 a abril de 2024, com base em projeção de população fornecida pela Fundação Seade (Sistema Estadual de Análise de Dados).

Entre os cinco primeiros colocados, quatro são municípios do interior e um —Praia Grande— fica na Baixada Santista.

A Folha questionou as prefeituras destas cinco cidades sobre os indicadores. É justificativa comum de quatro delas o fato de serem municípios cortados por rodovias, muitas com velocidades superiores a 100 km/h, e mortes ocorridas em acidentes fora do perímetro urbano acabam entrando na estatística local. Especialistas ouvidos pela reportagem concordam.

O DER (Departamento de Estradas e Rodagens), responsável por 13 mil dos 22 mil km da malha viária paulista, e a Artesp (Agência de Transporte do Estado de São Paulo), que regula e fiscaliza rodovias sob concessão, dizem que há investimentos em estrutura e programas de diminuição de acidentes.

A Semob (Secretaria de Mobilidade) de Sorocaba afirma que das 110 mortes catalogadas no período analisado, 74 foram em vias municipais. As demais, diz, ocorreram em rodovias administradas sob gestão do estado, concedidas à iniciativa privada, sem jurisdição ou de atuação direta da esfera municipal.

Com base nesses números, afirma a pasta, a taxa de óbitos, exclusivamente dentro da área urbana, cai para 9,81 por 100 mil habitantes.

Mesmo assim, o índice é mais alto que o da capital paulista, que em apenas vias urbanas registra taxa de 7,2 óbitos por 100 mil habitantes (do total de 979 mortes entre maio e abril do ano passado, 823 foram em ruas e avenidas da cidade e o restante, em estradas que cortam o município ou não há confirmação do local).

"Quando a taxa é muito alta, é preciso investigar o problema. De repente há a necessidade de um trabalho na área de engenharia ou de fiscalização e sinalização", afirma o engenheiro Antonio Clóvis Pinto Ferraz, o Coca Ferraz, professor e coordenador do Núcleo de Segurança no Trânsito da USP de São Carlos e especialista em estatística viária.

A Emdec (Empresa Municipal de Desenvolvimento de Campinas) diz que o aumento dos óbitos em rodovias, de 2022 para 2023, foi de 7% (de 75 para 80), enquanto o crescimento dos casos nas vias urbanas foi de 4% (de 76 para 79).

O município é cortado por cinco rodovias principais utilizadas não só pela população local, mas por moradores de municípios vizinhos que acessam a cidade.

Em Campinas, das 165 mortes registradas no período analisado, 92 foram em estradas. Três delas ocorreram na madrugada de 22 de julho do ano passado, quando um grupo de aproximadamente 200 motociclistas decidiu trocar as ruas e avenidas campineiras pela rodovia Santos Dumont (SP-075). O "rolê", com diversas infrações de trânsito, terminou em um engavetamento, que também deixou 27 feridos.

"O município não possui meios de intervir em ações de educação ou fiscalização para o trânsito", diz a UGMT (Unidade de Gestão de Mobilidade e Transporte) de Jundiaí, quarta colocada no ranking, sobre as rodovias do entorno —70% das mortes nos últimos 12 meses ocorreram fora do perímetro urbano da cidade, conforme o Infosiga.

Em Praia Grande, a Setran (Secretaria de Trânsito) lembra o fato de a cidade turística ter população flutuante (com aumento da frota nas ruas) aos finais de semana, feriados e temporadas de férias, além do fato de a cidade ser cortada por estradas que se transformam em barreiras físicas e que frequentemente lotam de veículos de turistas.

Sem citar rodovias, a Prefeitura de Taubaté afirma que os números refletem o aumento da imprudência de motoristas e, principalmente, de motociclistas, que representam mais de 30% do total dos óbitos.

Para Diogo Lemos, coordenador-executivo da Iniciativa Bloomberg para Segurança Viária Global, o fato de a região metropolitana de São Paulo contar com transporte público de massa também pode influenciar em letalidade menor de trânsito.

"Segundo a pesquisa Origem e Destino, do Metrô [a última edição foi em 2017 e a próxima começa a ser realizada em agosto], aproximadamente um terço das pessoas se deslocam por transporte coletivo, um terço com veículos individuais e um terço, a pé", afirma.

Para os especialistas, há ainda o congestionamento paulistano, que bate recordes e forçosamente diminui a velocidade dos veículos, como outro diferencial entre capital e interior.

"Se um motorista não consegue desenvolver grandes velocidade, por consequência, a probabilidade de um sinistro ser fatal é menor", diz Mariana Novaski, coordenadora de dados e vigilância, também da Iniciativa Bloomberg, que ainda cita a geografia de cidades com ruas sinuosas e estreitas, como outro limitador.

As prefeituras procuradas pela reportagem afirmam ter ações diversas de segurança no trânsito. Na comparação anual desde 2015 (dado mais antigo disponível no Infosiga), todas reduziram a taxa de mortalidade.

Para Novaski, a criação de um ranking pode alertar governantes a investir em segurança viária, inclusive, pelo constrangimento de ver a cidade entre as primeiras da lista. "Os municípios conseguem saber, de forma comparativa, como está a sua situação em relação aos outros."

AÇÕES PARA DIMINUIR NÚMERO DE MORTES

Campinas

  • O município, que afirma ter intensificado fiscalizações e ações educativas, lançou no início deste ano o Plano de Segurança Viária, com meta de salvar mais de 900 vidas até 2032, com várias propostas, de gestão de trânsito a socorro de vítimas. " Entre janeiro e maio de 2024, já foram realizadas mais de 100 ações educativas, que mobilizaram quase 36 mil pessoas"

Sorocaba

  • A Secretaria de Mobilidade diz atuar com engenharia de tráfego, fiscalização e educação para o trânsito. A pasta conta fazer monitoramento permanente do sistema viário urbano, seja por câmeras ou por ação de agentes de trânsito. "São mais de 2.500 câmeras interligadas ao Centro de Controle Operacional Integrado, por meio de fibra ótica"

Praia Grande

  • A Secretaria de Trânsito explica que desde 2023 foram realizadas 56 campanhas educativas atendendo 22.008 pessoas. A cidade passou a contar também com mais três semáforos de botoeira auxiliando os pedestres na travessia, além da instalação de três lombadas eletrônicas

Jundiaí

  • A Unidade de Mobilidade e Transporte afirma fazer campanhas em escolas e empresas, além de blitze educativas realizadas por agentes de trânsito. A pasta destaca o Jardim da Mobilidade, inaugurado em dezembro de 2023, para ensinar regras de trânsito de forma lúdica a crianças

Taubaté

  • A Secretaria de Mobilidade Urbana diz investir em engenharia de tráfego e ações de educação por meio da Escola Pública de Trânsito, instalada no 5º Batalhão de Polícia Militar, além de fiscalização. O município também firmou contrato para aumento no número de radares e de talonários eletrônicos

DER

  • Entre medidas estruturantes, o órgão estadual destaca edital em andamento para aquisição de 649 radares que serão instalados até o fim do ano em estradas paulistas, com custo de R$ 202 milhões
  • Em maio passado houve o relançamento do Anuário de Acidentes em Rodovias, após um período de de oito anos, e foi formalizada a parceria com a iRAP (International Road Assessment Programme), para aplicação de metodologia usada por 126 países que mapeará e classificará as rodovias conforme o grau de segurança

Artesp

  • Sobre cidades citadas na reportagem, a agência diz que os trabalhos nas rodovias concedidas nas regiões de Sorocaba e Campinas contemplam a duplicação da Raposo Tavares, implantação de radares e ações realizadas com pedestres, andarilhos e motociclistas
  • Na Praia Grande, diz, há a adequação de sinalização vertical e de dispositivos auxiliares na SP-055, implantação de faixa adicional e alargamento da "Curva do S", ações de apoio à fiscalização de velocidade e campanhas educativas
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