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É necessário que façamos um pacto pela educação

Valorização docente e adequação da escola a um modelo sintonizado com nosso tempo são chave para combater quadro agravado pela pandemia

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Débora Garofalo

Mestra em educação, é professora na rede pública de São Paulo; em 2019, foi a primeira sul-americana a disputar o Global Teacher Prize, sendo considerada uma das dez melhores professoras do mundo

A pandemia tem trazido graves consequências ao Brasil, tanto no âmbito econômico e social quanto no da saúde e educacional, que torna mais clara a crise na aprendizagem e as desigualdades na educação.

Antes da pandemia, já vivíamos uma profunda desigualdade educacional; o Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes) coloca o Brasil como o segundo país mais desigual entre os 79 participantes do exame.

Estudo realizado pela Varkey Foundation demostra que o Brasil lidera o ranking quando o assunto é a desvalorização docente. A pesquisa foi realizada em 35 países, e o resultado do Brasil torna-se ainda mais alarmante se comparado ao cenário global.

Os dados não param por aqui; estudos realizados pela Fundação Getúlio Vargas apontam que 55% das crianças do 3º ano do ensino fundamental não se alfabetizaram.

Estudo amostral inédito realizado pelo Caed/UFJF (Centro de Políticas Públicas e Avaliação da Educação da Universidade Federal de Juiz de Fora) em estudantes do 5º e o 9º anos do ensino fundamental e da 3º série do ensino médio da rede estadual de São Paulo, no início do ano letivo 2021, demonstrou que, no cenário da pandemia, crianças e jovens regrediram em seus estudos.

Em relação aos resultados alcançados no Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica) em 2019, as maiores diferenças na escala de proficiência foram verificadas no 5º ano do fundamental, em matemática (em que os estudantes apresentaram 46 pontos, uma queda de 19% na aprendizagem) e língua portuguesa (29 pontos a menos, queda de 13%).

Para o 9º ano do fundamental e o 3º do médio, a defasagem foi menor, embora com perdas no aprendizado.

O estado de São Paulo teve uma resposta rápida à pandemia ao implementar o Centro de Mídias de São Paulo, com aulas mediadas por tecnologia, e mesmo assim as perdas foram grandes; precisaremos de anos para recuperar o processo de aprendizagem.

Muito do que vivenciamos é herança de um modelo educacional marcado por uma educação do início do século 20, com um desenho que não corresponde às necessidades e interesses deste século.

Não conseguiremos ter bons resultados na educação se temos uma educação que não prioriza a interpretação, a reflexão, e a valorização docente, diante de um mundo totalmente digital em que crianças e jovens têm acesso a inúmeras informações e as escolas ainda estão inseridas em um contexto analógico, com a predominância do modelo monodimensional, agravado pelo cenário da pandemia.

Os desafios são enormes. Apenas 9,1% dos estudantes que estão concluindo o ensino médio têm o conhecimento desejável em matemática. E a parte de infraestrutura deixa a desejar, já que 28% das escolas brasileiras não possuem saneamento básico, nem quadras poliesportivas cobertas, se faltam conectividade e espaços de inovação, entre outros elementos que beneficiam a aprendizagem.

No entanto nem tudo é estagnação. Tivemos avanços, como a aprovação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) que definiu um norte para a educação brasileira e instituiu o trabalho a partir de habilidades, com uso das tecnologias como competência de ensino e o desenvolvimento das habilidades socioemocionais.

A passos lentos, temos avançado nos anos iniciais e finais, o que se comprova nas últimas cinco edições do Sabe, e no ensino médio, em 2019, tivemos um pequeno salto, uma vitória que merece ser reconhecida e celebrada, mas que pode ser perdida pela pandemia.

A pandemia torna mais evidente a crise de aprendizagem e desigualdades educacionais e, com o passar do tempo, o que era grande vai se tornar maior, agravado por uma guerra ideológica promovida pelo governo federal ao vetar o PL da Conectividade, que beneficiaria milhares de estudantes, e promover políticas de educação especial que excluem, acompanhadas de negacionismo e da rejeição do conhecimento.

É necessário promover um pacto pela educação, em vez de fazer guerra ideológica; promover políticas públicas que resolvam problemas e apoiem efetivamente o processo de ensino e aprendizagem —já que as causam são sabidas, sendo necessárias combatê-las com uma transformação profunda da educação, olhando para urgências de aprendizagem no Brasil.

Erramos: o texto foi alterado

Estudo do Caed/UFJF (Centro de Políticas Públicas e Avaliação da Educação da Universidade Federal de Juiz de Fora)​ avaliou estudantes de São Paulo, e não de Minas Gerais. O texto foi corrigido.

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