Descrição de chapéu enem

Enem tem questões com a música 'Admirável Gado Novo' e indígenas

Pelo terceiro ano seguido a prova não trouxe questões sobre a ditadura militar

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

Após temor de ingerência, o primeiro dia de provas do Enem 2021 neste domingo (21) teve questões que abordaram minorias e direitos humanos. Uma das perguntas trouxe a música "Admirável Gado Novo", do cantor Zé Ramalho, para tratar da passividade social.

A análise de professores é de que a prova não veio com a "cara do governo", como disse Jair Bolsonaro (sem partido), e abordou assuntos que incomodam a base conservadora do presidente. As perguntas discutiram desigualdade de gênero, o conceito de minorias, racismo, população carcerária e exploração de terras indígenas.

Questão do Enem com letra da música 'Admirável Gado Novo', de Zé Ramalho
Questão do Enem com letra da música 'Admirável Gado Novo', de Zé Ramalho - Divulgação

Mesmo com a presença de temas atacados por Bolsonaro, os professores destacam mais uma vez a ausência de questões sobre a ditadura militar (1964-1985) no país. Desde que o presidente assumiu, o período, que faz parte do conteúdo obrigatório do ensino médio, não foi mais cobrado no Enem.

A Folha mostrou que o presidente pediu ao ministro da Educação, pastor Milton Ribeiro, para que houvesse questões que tratassem o golpe militar de 1964 como uma revolução, o que não aconteceu na edição deste ano.

"Surpreendentemente, diante de todas as denúncias que cercaram o Enem nos últimos dias, a prova foi muito equilibrada e manteve o padrão, sendo extremamente social. Ainda que a ditadura militar não tenha sido abordada, outros períodos e temas importantes estiveram presentes, diz o professor de história, Guilherme Freitas, da escola Seb Lafaiete.

​Às vésperas do início do Enem, servidores do Inep, órgão responsável pela elaboração da prova, fizeram uma série de denúncias sobre assédio moral que sofreram para suprimir perguntas com temas considerados inadequados pela gestão do órgão.

As equipes envolvidas na elaboração detalharam pressão para alterar ao menos 20 questões de uma primeira versão da prova deste ano. Parte delas voltou à prova para manter a calibração de dificuldade do exame. Os servidores relatam ter conseguido resistir à ingerência ao justificar a necessidade de manter o atendimento à matriz de conteúdos do Enem e a coerência estatística do exame.

"O pedagógico prevaleceu ao político e os estudantes receberam uma boa prova, como em anos anteriores. Ainda que se destaque a ausência de questões sobre a ditadura, é louvável a presença de itens sobre a questão indígena", diz Fernando Santos, do cursinho Poliedro.

Candidatos chegam para o 1º dia de provas do Enem em São Paulo
Candidatos chegam para o 1º dia de provas do Enem em São Paulo - Eduardo Anizelli/ Folhapress

Ao menos duas questões abordaram a situação dos indígenas no Brasil. Uma delas tratava da ameaça de mineradoras às áreas de reserva indígena.

Os professores também destacaram a pertinência das músicas selecionadas como texto de apoio para as perguntas. A questão com a música de Ramalho pedia ao candidato que relacionasse um trecho da letra da canção à passividade social.

A música "Comportamento Geral", de Gonzaguinha, para tratar de questões sociais. Até mesmo Chico Buarque, cantor alvo de diversos ataques de Bolsonaro, teve sua música "Sinhá" citada em uma questão sobre escravidão e racismo.

"Apesar das polêmicas recentes, alguns temas resistiram e foram abordados na prova. Não houve nenhuma menção ao grupo LGBTQIA+, mas as questões falaram sobre indígenas, quilombolas, discriminação às mulheres, racismo. É muito importante ver que esses temas permanecem no exame", diz Gabryel Real, gerente de processos avaliativos da SAS Plataforma de Educação.

Também trouxe questões sobre a desigualdade de gênero. Um dos itens, por exemplo, falou sobre as dificuldades de mulheres cientistas no século 19 diante da exclusão que sofriam com a sociedade patriarcal.

Outro item falou sobre a erotização de corpos femininos e outro trouxe uma charge do Henfil para tratar do impacto social na vida da mulher após a maternidade.

Uma das questões trouxe um texto do filósofo Deleuze para debater o conceito de minorias. Um trecho de um texto de Friedrich Engels, coautor do Manifesto Comunista com Karl Marx, também foi levado à prova.

"O Enem não apresentou polêmicas, mas dialogou com temas importantes da atualidade e manteve o padrão de dificuldade, com questões bem equilibradas", diz Daniel Perry, diretor do Curso Anglo.

O tema da redação também surpreendeu os educadores por ter mantido o padrão de anos anteriores ao abordar assunto relacionado aos direitos humanos. Os candidatos tiveram que fazer uma dissertação sobre a "Invisibilidade e registro civil: garantia de acesso à cidadania no Brasil'.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.