1 em cada 4 crianças brasileiras tem atraso no desenvolvimento

Pesquisa inédita do Ministério da Saúde avaliou habilidades e comportamentos esperados até os 5 anos de idade

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Brasília

Nas capitais brasileiras, quase 1 em cada 4 crianças tem atraso no desenvolvimento até os cinco anos de idade, mostra pesquisa do Ministério da Saúde.

São crianças que não desenvolveram as habilidades ou não apresentaram os comportamentos esperados para a faixa etária. A incidência de atraso é ainda maior entre aquelas que estão em vulnerabilidade social e situação de pobreza e onde há registro de insegurança alimentar.

Os resultados mostram que 10,1% das crianças tinham atraso no desenvolvimento esperados até os 3 anos. Outras 12,8% tinham atraso entre 3 e 5 anos de idade.

As duas faixas etárias somam 22,9% de crianças com atrasos no período que as pesquisas apontam como a "principal janela" de oportunidades para o aprendizado global. Nesses primeiros anos de vida, o cérebro se desenvolve mais rapidamente e está mais sensível aos cuidados e estímulos ambientais.

Criança almoça em creche na cidade de Serrinha, no sertão baiano - Raul Spinassé - 22.nov.2019/Folhapress

Os dados são de uma pesquisa do projeto Pipa (Primeira Infância para Adultos Saudáveis), desenvolvido pelo ministério e Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, e foram divulgados na manhã desta quarta (25) no Simpósio Internacional de Desenvolvimento da Primeira Infância, em Brasília.

As informações foram coletadas em 2022 em 13 capitais do país. O estudo avaliou as condições de desenvolvimento de 13.435 crianças de 0 a 5 anos.

O desenvolvimento infantil envolve quatro domínios relacionados a habilidades motoras, cognitivas, de linguagem e socioemocionais.

Diversos estudos apontam que crianças com desenvolvimento saudável e em boas condições têm maior facilidade de adquirir conhecimento, o que contribui para que posteriormente obtenham um bom desempenho escolar, alcancem realização pessoal, vocacional e econômica e se tornem cidadãos responsáveis.

A pesquisa do Ministério da Saúde também revela como as desigualdades sociais afetam o desenvolvimento infantil. A incidência de atraso é maior entre as crianças cujas famílias mencionaram participar de programas sociais como o Bolsa Família, o que indica maior vulnerabilidade social.

Das crianças de famílias beneficiárias, na média geral, 15% tiveram atraso no desenvolvimento infantil esperado até os 5 anos. Entre as que não participavam de nenhum programa social a incidência de atraso foi de 9%.

No grupo com condição socioeconômica mais vulnerável, a frequência de atraso é ainda maior, afetando 17% das crianças de até 5 anos com famílias beneficiárias.

"Os resultados são importantes para alertar sobre o impacto das desigualdades e para que tenhamos políticas para priorizar essas crianças", destacou Sônia Venâncio, coordenadora de Atenção à Saúde da Criança do ministério

Entre as habilidades consideradas adequadas para cada faixa etária estão, por exemplo, que bebês de até 6 meses sorriam e reajam a estímulos físicos ou consigam levantar a cabeça sozinhos.

"A ideia da pesquisa é identificar os grupos que não estão conseguindo atingir os marcos importantes de desenvolvimento para cada faixa etária. Com essas informações, podemos pensar em formas de orientar e dar o suporte que as famílias precisam para o melhor desenvolvimento das crianças", explicou Sônia.

A pesquisa coletou ainda uma série de informações sobre a saúde, alimentação, cuidados e estímulos ofertados às crianças. O estudo mostra que 57,8% das crianças avaliadas seguiram com o aleitamento materno exclusivo até os 6 primeiros meses de idade - ou seja, mais de 40% não tiveram a oportunidade de ser alimentadas no início da vida da forma como é recomendado por médicos e evidências científicas.

Também aponta que apenas 59,2% das crianças de até 5 anos tem garantida uma diversidade mínima na dieta, ou seja, que consomem ao menos seis grupos alimentares por dia (grãos, raízes, leguminosas, leite não materno e derivados, carnes e ovos, hortaliças e frutas).

Sobre os cuidado, a pesquisa também coletou de forma inédita dados sobre o uso de disciplinas punitivas para crianças nos primeiros 5 anos de vida. Os resultados identificaram que 35% dos cuidadores revelaram dar palmadas como medida educativa e 33% admitiram gritar com as crianças.

"É um percentual muito alto e preocupante de cuidadores que consideram a palmada como normal. Nós precisamos atuar e alertar essas famílias para que elas entendam os efeitos dessa violência no desenvolvimento da criança", diz Sônia.

"Uma criança, que vive com receio de apanhar, com medo da reação dos adultos, está vivendo sob um estresse tóxico que a longo prazo têm efeitos negativos para o desenvolvimento do cérebro. Nós precisamos sensibilizar os profissionais da saúde e educação para que orientem os cuidadores sobre os efeitos da palmada", completa.

O estudo também identificou que, em média, um quarto dos pais disseram não ter feito atividades de desenvolvimento com as crianças, como conversar, brincar, cantar ou contar histórias, nos dias anteriores aos que foram questionados.

Além disso, 25% das crianças não tinham nenhum livro infantil em casa. Entre as crianças mais pobres, o índice das que não tinham livro chega a 41%.

O simpósio é realizado pelo Núcleo Ciência Pela Infância, uma coalizão que reúne Fundação Bernard van Leer, David Rockefeller Center for Latin American Studies da Universidade de Harvard, Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, Insper e Porticus.

A jornalista viajou a convite da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal

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