Movimento de mães defende que crianças e adolescentes não tenham celular antes de 14 anos

Com base em pesquisas sobre os malefícios causados pelo uso do aparelho, famílias pedem que smartphones seja proibido nas escolas

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São Paulo

Um grupo de mães de escolas particulares de São Paulo lançou um movimento que defende que o ambiente escolar seja livre de celulares. Além disso, propõe que as famílias façam um acordo para que os filhos só sejam presenteados com um smartphone depois dos 14 anos e tenham acesso a redes sociais apenas após os 16.

O Movimento Desconecta tem como base pesquisas que citam uma série de prejuízos causados pelo uso dos celulares na infância e na adolescência, como ansiedade, depressão e dificuldades de concentração, de aprendizagem e de socialização.

Está em sintonia com mobilizações semelhantes em outros países, como o Wait Until 8th ("espere até o 8º ano" para dar o celular, a série escolar dos 14 anos de idade), grupo dos Estados Unidos com mais de 50 mil famílias, e o Smartphone Free Childhood ("infância livre de celular"), organização da Inglaterra com mais de 60 mil pais e mães.

Os movimentos citam como fonte, especialmente, o psicólogo norte-americano Jonathan Haidt, autor do best-seller "A Geração Ansiosa", que trata do colapso da saúde mental entre crianças e jovens no mundo —no Brasil, um levantamento da Folha mostrou que, pela primeira vez, os registros de ansiedade na infância e na adolescência superaram os de adultos.

Crianças olham fixamente para telas de celular, que cobrem seus rostos
Uso de celular em escolas começa a ser banido tanto nas aulas quanto nos recreios, para evitar danos ao aprendizado, às habilidade sociemocionais e à saúde mental de crianças e jovens - Seventyfour

O livro mostra como crianças e adolescentes não têm maturidade neurológica e emocional para lidar com o universo digital dos smartphones e acabam envolvidos em situações graves como assédio sexual, cyberbullying, golpes financeiros e desafios (tarefas disseminadas em redes sociais) que podem provocar mutilações e até mortes.

Haidt defende quatro mudanças urgentes na sociedade: 1) Smartphones só depois dos 14 anos (se necessário, a família pode dar um celular daqueles antigos, sem internet, para se comunicar com a criança); 2) Redes sociais apenas após os 16; 3) Todas as escolas livres de celulares, do ensino fundamental ao médio; 4) A volta da brincadeira livre na infância e na adolescência, não programada e controlada por adultos.

Outra fonte central do Movimento Desconecta é o pediatra brasileiro Daniel Becker, influente nas redes sociais, que está engajado no banimento do uso do celular nas escolas, não apenas nas salas de aulas, mas também nos recreios e intervalos.

Ele chama a campanha de Celular Zero nas Escolas. "Na sala de aula, o celular obviamente perturba o aprendizado. A simples presença do celular perto da criança já fragmenta a atenção dela", diz ele, nas redes sociais. "E o recreio é um momento fundamental, é o lugar de brincar, de se movimentar, de se conhecer, desenvolver inúmeras habilidades fundamentais, como a comunicação."

O Movimento Desconecta cita também a queda acentuada das notas escolares registradas pelo Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Alunos, realizado em mais de 80 países) desde 2012, quando os smartphones começaram a se disseminar.

A campanha começou com um pequeno grupo de mães de escolas privadas e, em menos de duas semanas, atingiu mais de 15 mil seguidores no Instagram. A ideia das fundadoras é que, enquanto a regulação do uso do celular não vier por meio de lei, as famílias devem fazer um acordo entre si. Quanto mais amigos sem celular, defende o movimento, menor será a pressão social para que a criança tenha um aparelho.

"Nós não conseguimos, de forma direta e rápida, mudar as leis ou as regras das escolas, então, o que está no nosso controle é combinar, entre as famílias, de não dar celular para as crianças", afirma Camila Bruzzi, uma das fundadoras do movimento.

Fernanda Cytrynowicz, que também está no comitê do Movimento Desconecta, lembra que projetos de lei para regular o uso do celular e as redes sociais enfrentam o lobby pesado das big techs, então as famílias precisam se antecipar e buscar soluções.

"A gente não nega a tecnologia e sua importância, mas sim os excessos", diz. "Muitas famílias não querem dar um smartphone para a criança, mas acabam dando por pura pressão, porque percebem que ela se sente excluída, por exemplo, se não sabe a dancinha do TikTok."

Dessa forma, um acordo entre as famílias é tido como um caminho de solução. "Os convites para festa de aniversário, por exemplo, são todos pelo WhatsApp. E se ninguém tiver smartphone? Certamente o aniversariante vai convidar de outra forma."

Mariana Uchôa, também fundadora do movimento, diz que há muitas famílias querendo que os celulares sejam proibidos nas escolas. "Essa é uma discussão que precisa ser feita, mas temos também que pensar o que fazer nas nossas casas."

O grupo faz analogias com o tempo em que a sociedade aceitava que crianças e jovens fumassem e ingerissem bebidas alcoólicas. "As pessoas achavam normal, tinha até cigarrinho de chocolate para criança, e hoje isso é um absurdo completo", diz Camila. "Daqui a alguns anos, vamos achar a mesma coisa sobre os celulares. Hoje nos sentimos reféns dessa situação, precisamos ser protagonistas da solução."

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