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Os efeitos da solidão no cérebro de idosos

Quando se prolonga por muito tempo, a solidão pode se tornar crônica, passando a ser uma importante ameaça à saúde

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María Antonia Parra Rizo
The Conversation * | BBC News Brasil

A solidão afeta cerca de uma a cada 12 pessoas em todo o mundo, sem distinção de fronteiras, nem diferenças culturais.

Segundo a pesquisa mais recente realizada na Europa, até 13% dos entrevistados afirmaram que se sentiram sozinhos a maior parte do tempo durante as quatro semanas anteriores à realização da pesquisa.

Foto destaca olhos de uma mulher idosa
Na Espanha, 44,1% das mulheres com mais de 85 anos vivem sozinhas - Getty Images/via BBC News Brasil

Se nos concentrarmos no contexto específico da Espanha, por exemplo, dados do Instituto Nacional de Estatística do país (INE) revelam que mais de 2 milhões de pessoas com mais de 65 anos vivem atualmente sem companhia.

E os números também destacam uma disparidade de gênero significativa: 44,1% das mulheres com mais de 85 anos vivem sozinhas, contra 24,2% dos homens.

Essa circunstância não só prejudica o bem-estar emocional das pessoas, mas também adquire características de um problema de saúde pública, aumentando o risco de doenças mentais e cardiovasculares.

É preciso abordar dois fenômenos distintos. De um lado, está a solidão temporária, que é uma experiência comum com impactos limitados à saúde e ao bem-estar das pessoas, considerando sua natureza efêmera.

Mas, quando a situação se prolonga por muito tempo, a solidão pode se tornar crônica, passando a ser uma importante ameaça à saúde.

O segundo ponto é que a solidão pode prejudicar as funções mentais das pessoas idosas. A complexidade inerente a este problema reside na profunda conexão entre a sensação contínua de isolamento e as transformações causadas às funções mentais.

Cadeia de efeitos negativos

Para entender melhor essa relação, é preciso se aprofundar nas últimas descobertas da neurociência e da psicologia.

Estudos recentes revelaram aumento da ativação do sistema nervoso simpático e redução da regulação do sistema nervoso parassimpático (responsável pelo repouso e pela recuperação) entre as pessoas idosas que vivem sozinhas. E essas mudanças podem criar obstáculos para a capacidade de adaptação cerebral e a geração de novas células do cérebro.

Outras pesquisas também encontraram alterações tangíveis da estrutura física do cérebro que predispõem as pessoas a sofrerem de doenças neurodegenerativas, como o Alzheimer, Parkinson e outros tipos de demência. Por outro lado, estudos anteriores indicam maior risco de deterioração cognitiva leve e desenvolvimento de demência nas etapas avançadas da vida.

E, como se não fosse suficiente, a falta de interações sociais pode prejudicar diversas capacidades cognitivas, como a memória episódica, a memória de trabalho, a atenção prolongada e a flexibilidade cognitiva, além de aumentar o risco de depressão, ansiedade e estresse crônico.

Este conjunto de desafios agrava os efeitos cognitivos e funcionais habitualmente associados ao processo de envelhecimento.

Traços de epidemia nos países desenvolvidos

Embora muitas causas possam levar à solidão, foram identificados diversos fatores de risco, como a depressão e/ou doenças crônicas e a idade avançada. Quanto maior a idade, maior a possibilidade de isolamento social.

Por isso, tudo indica que o impacto da solidão irá aumentar cada vez mais, especialmente nos países desenvolvidos, com o envelhecimento da população. E este motivo faz com que seja cada vez mais frequente classificar a solidão como uma epidemia, que precisa ser combatida com políticas de saúde pública.

Foto destaca mão de idoso apoiada em suas coxas
Os efeitos da solidão no cérebro de idosos preocupam especialistas - Getty Images/via BBC News Brasil

A preocupação cada vez maior com este panorama incentivou o desenvolvimento de programas comunitários, destinados a incentivar a interação social e fornecer apoio emocional.

Intervenções concretas já demonstraram sua eficácia, sustentando não apenas a necessidade de reduzir os efeitos da solidão, mas também de fortalecer o tecido social das comunidades. É assim que se promove o envelhecimento ativo e saudável.

Qualidade de vida

Em resumo, a solidão entre as pessoas idosas representa um desafio que engloba numerosos aspectos e exige respostas em nível individual, comunitário e político.

Compreender os mecanismos neurobiológicos subjacentes e os efeitos inter-relacionados da solidão sobre a saúde cerebral e emocional é fundamental para orientar o desenvolvimento de estratégias para reduzir seus impactos negativos.

Ao priorizar a solidão como tema importante de saúde pública, podemos melhorar a qualidade de vida das pessoas idosas em todo o mundo. Este compromisso global é fundamental para fomentar a conexão e o enriquecimento pessoal ao longo da melhor idade da vida.

* Este artigo foi publicado originalmente no site de notícias acadêmicas The Conversation e republicado na BBC News Brasil sob licença Creative Commons. Leia aqui a versão original em espanhol.

María Antonia Parra Rizo é doutora em psicologia da saúde da Universidade Miguel Hernández, na Espanha.

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