Atletismo tem regras mais rígidas do que o COI para atletas transgênero

Levantamento mostra que só 13 federações internacionais seguem regras do comitê olímpico

Jogadora transexual Tifanny Abreu, 33, defende o Bauru na Superliga feminina de vôlei
Jogadora transexual Tifanny Abreu, 33, defende o Bauru na Superliga feminina de vôlei - Guilherme Rodrigues - 02.fev.2018/Futura Press/Folhapress
Edoardo Ghirotto
São Paulo

A IAAF (Associação Internacional de Federações de Atletismo) é a entidade esportiva internacional com regras mais rígidas para permitir a participação de atletas transgênero em provas femininas.

Entre as 33 entidades encarregadas dos esportes que serão disputados na Olimpíada de Tóquio-2020, 13 disseram à Folha que seguem diretrizes estabelecidas pelo COI (Comitê Olímpico Internacional) em novembro de 2015.

O COI determinou que as atletas que transitaram do sexo masculino para o feminino deverão apresentar no máximo 10 nanomol de testosterona por litro de sangue em um período de ao menos 12 meses anteriores à disputa de uma competição. A cirurgia de redesignação sexual não é uma condição obrigatória.

Foi com base nesta regra que a CBV (Confederação Brasileira de Vôlei) deu autorização para a jogadora Tifanny Abreu, 33, defender o Bauru na atual temporada da Superliga feminina de vôlei. Ela iniciou a transição em 2012.

Já os homens transgênero podem participar de provas masculinas sem restrições.

A aplicação da cartilha do COI não é obrigatória fora dos Jogos Olímpicos. A entidade diz que as federações são responsáveis pelas regras para uma transgênero ser elegível nos torneios que organizam.

Entre as ouvidas, a associação de atletismo foi a que apresentou condições mais severas. A atleta precisa informar a IAAF sobre a identidade de gênero três meses antes do torneio que pretende disputar e fornecer informações sobre o procedimento e os tratamentos pelos quais passou.

Uma comissão independente é constituída para analisar o caso da atleta, que precisa passar por exames de urina e de sangue. Se os níveis hormonais estiverem de acordo com os padrões da IAAF, a questão será enviada a outro painel de médicos.

Entre os fatores a serem considerados pela comissão estão a idade, se a redesignação sexual foi feita antes ou depois da puberdade, se o procedimento foi cirúrgico, o período de tempo desde que ela completou a transição e os resultados de tratamentos feitos após a sua conclusão.

Finalizada essa etapa da avaliação, o parecer será encaminhado ao chefe da divisão médica da IAAF, que decidirá se aprova ou não a participação da atleta. Uma apelação contra o veredicto só poderá ser feita na CAS (Corte Arbitral do Esporte). 

A Folha procurou um especialista independente para avaliar as regras da IAAF. Para o médico Devin O’Brien Coon, diretor do centro de saúde transgênero do hospital Johns Hopkins, nos Estados Unidos, a idade da atleta deveria ser levada em conta apenas se a redesignação sexual foi feita recentemente.

“A idade em que foi feita a transição é um assunto mais complicado”, disse o médico. 

“O crescimento muscular motivado pela testosterona é reversível na maioria das vezes em que foi interrompido por um longo período de tempo, mas pode deixar alguém com mais músculos do que uma pessoa nunca exposta aos efeitos da testosterona.”

O’Brien Coon afirmou que a IAAF e o COI acertam ao eliminar a obrigatoriedade da cirurgia de redesignação sexual. “Uma cirurgia só deve ser feita se for beneficiar o estado mental da paciente.”

O médico Stéphane Bermon, que trabalha como consultor médico e científico da IAAF, disse que a questão da puberdade é importante devido ao tempo que os andrógenos —hormônios masculinos— têm para impactar o desenvolvimento do corpo.

“Isso influencia em quanto tempo a atleta pode ser declarada elegível”, afirmou. 

Segundo Bermon, os médicos podem estipular um período que varia de meses a até um ano para atletas serem liberadas para competir. “A duração depende de quando o tratamento foi iniciado e de quanto tempo o nível de testosterona foi mantido próximo às medições normais do sexo feminino”, disse.

“Para ser autorizada a competir em qualquer caso, seja cirúrgico ou não, ela terá de provar que manteve os níveis de testosterona baixos”, acrescentou Bermon.

A IAAF diz não seguir as recomendações do COI porque aprovou as diretrizes em 2011, quatro anos antes de a entidade ter publicado as próprias regras. Bermon é um dos especialistas que assinam a regulamentação do comitê.

Segundo o COI, uma atualização será publicada neste ano e incluirá um apêndice para ajudar as federações a definirem regras próprias.

Até o momento, a IAAF diz que nenhuma atleta de alto nível entrou com um pedido de redesignação sexual.

SEGUEM DIRETRIZES DO COI

Modalidade

- Ciclismo

- Escalada

- Golfe

- Halterofilismo

- Handebol

- Hóquei na grama

- Judô

- Pentatlo moderno

- Remo

- Rúgbi

- Tênis

- Tiro

- Tiro com arco

Regras

Atletas que transitaram do sexo masculino para o feminino: devem apresentar no máximo 10 nanomol de testosterona por litro de sangue em um período de ao menos 12 meses anteriores à disputa de uma competição. Cirurgia de redesignação sexual não é obrigatória.

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