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The New York Times Futebol americano

O eterno Tom Brady prova que é capaz de vencer em qualquer lugar

Vitória no Super Bowl foi a mais difícil, mais doce e mais estranha das que ele já obteve

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Ben Shpigel
The New York Times

Todo experimento principia buscando provar uma hipótese, e Tom Brady formulou uma hipótese absurda, em março do ano passado, quando escolheu deixar o império que ajudou a construir na Nova Inglaterra e assinar com o Tampa Bay Buccaneers.

Trocando um time pelo qual conquistou seis títulos por um time que venceu um total de seis jogos de playoff em sua história, Brady acreditava que, aos 43 anos, pudesse aprender a jogar em um novo esquema ofensivo, se aclimar a um novo time e conquistar uma nova conferência, tudo isso enquanto a pandemia do coronavírus limitava as atividades presenciais.

A mais preciosa das bijuterias da NFL é o anel do Super Bowl, e cada um dos conquistados por Brady –sete, o último dos quais na noite de domingo (7)– confirma uma verdade irrebatível: quando ele tem algo a provar, é praticamente impossível derrotá-lo.

Despachando sem dificuldade as aspirações do Kansas City Chiefs a estabelecer uma dinastia, e o quarterback que representa a ameaça mais plausível de um dia equiparar seu legado, Brady comandou o Buccaneers em uma tranquila vitória por 31 a 9 que recalibrou o padrão que ele mesmo estabeleceu para a grandeza.

Ao conquistar seu sétimo título –um total superior ao de qualquer franquia da NFL, e um número que supera o total de títulos combinados de seu herói de infância, Joe Montana, e de John Elway, e o número de títulos de Michael Jordan na NBA—, Brady, com a ajuda de uma defesa feroz que subjugou Patrick Mahomes, o quarterback dos Chiefs, acertou três passes para touchdown e deu aos Buccaneers o segundo título de sua história, jogando diante de sua torcida, no Raymond James Stadium, em Tampa, Flórida.

Essa vitória no Super Bowl foi, sem dúvida, a mais difícil, mais doce e mais estranha das que Brady já obteve, capturada ao final da temporada mais improvável e incrível da história da NFL.

A pandemia do coronavírus prejudicou os calendários, levou ao adiamento de jogos e resultou no contágio de mais de 700 jogadores, membros de comissões técnicas e funcionários de clubes –os pais de Brady, Tom Sr. e Galynn também foram contagiados– e moderou o espetáculo que cerca o evento esportivo mais assistido dos Estados Unidos.

Para que essa temporada confusa conseguisse chegar ao seu coroamento, no domingo, a sensação foi a de que a NFL realizou uma espécie de barganha cósmica: em troca de realizar uma agenda completa de 256 partidas de temporada regular –e sem criar um ambiente fechado onde realizar os jogos—, a liga conseguiu o duelo mais esperado entre quarterbacks na era do Super Bowl, Brady versus Mahomes, o melhor de todos os tempos contra o melhor de seu tempo.

Tom Brady comemora seu sétimo sétimo título de Super Bowl
Tom Brady comemora seu sétimo sétimo título de Super Bowl - Mike Ehrmann - 7.fev.21/AFP

Nunca havia acontecido que os vencedores dos dois Super Bowls precedentes se enfrentassem em uma nova disputa de título, e em alguns círculos o jogo foi destilado de modo bastante cru, e impreciso, como um referendo sobre os legados dos dois –como se o de Brady pudesse ser maculado por uma derrota, ou como se a gloriosa carreira de Mahomes, depois de quatro temporadas, pudesse de alguma forma ter seu destino vinculado ao resultado.

Mahomes venceu 16 dos 17 jogos que começou como titular na temporada, mas ele e seu time desabaram em meio a um dilúvio de faltas, de recepções não completadas e de pressão dos Buccaneers, que, aproveitando os desfalques na linha ofensiva do Chiefs, exploraram a oportunidade com gosto, criando problemas para o adversário.

No intervalo, Mahomes só havia completado 67 jardas em passes, e o Chiefs estavam 15 pontos atrás no placar, uma desvantagem que Mahomes só havia enfrentando uma outra vez em sua carreira.

A única outra ocasião em que o time de Mahomes esteve tão atrás do adversário, nas três últimas temporadas, aconteceu em outubro de 2018, em uma derrota diante do New England Patriots de Brady. O quarterback jogou duas décadas lá, onde ele e Bill Bellichick eram os dois objetos inamovíveis ao final de cada temporada, como a mais famosa combinação entre quarterback e treinador em sua geração.

Imagine o que Bellichick deve ter pensado no domingo à noite ao ver Brady completar três passes de touchdown para ex-colegas do Patriots –dois para Rob Gronkowski, que voltou da aposentadoria para jogar de novo com seu velho amigo, e um, pouco antes do intervalo, para Antonio Brown.

O período de Brady na Nova Inglaterra será para sempre parte dele, mas agora ele ostenta um crânio e tíbias cruzadas no capacete, pode usar calções para treinar mesmo no inverno, e se reporta a Bruce Arians, 68, um treinador que também saiu da aposentadoria para comandar os Buccaneers e representa um estilo que é a antítese de Bellichick.

Quando perguntado, recentemente, sobre seus motivos para buscar Brady como quarterback depois do final da temporada passada, Arians respondeu com uma pergunta retórica: “Você vive trancado no armário para tentar ficar seguro ou prefere sair e se divertir?”.

A chegada de Brady a Tampa refletiu uma convergência harmônica, uma confluência entre previsão, audácia e acaso que raramente beneficiam os Buccaneers, cuja última vitória em um jogo de playoff havia acontecido quando o time conquistou o título na temporada de 2002.

A busca do time pelo quarterback recebeu o apelido “Operation Shoeless Joe Jackson”, uma menção à profecia do filme “Campo dos Sonhos”: “Construa e eles virão”. Brady apreciou os esforços do diretor de esporte do time, Jason Licht, para montar uma equipe que resolvesse problemas ao seu redor, em vez de pedir que o quarterback os resolvesse.

Os Buccaneers contrataram recebedores capazes de fazer jogadas, linebackers com excelente capacidade de cobertura e defensores agressivos que amadureceram à medida que a temporada avançava.

Antes de seu início, o treinador dos cornerbacks, Kevin Ross, escreveu o nome de todos os quarterbacks que o time enfrentaria em uma lousa –Matt Ryan, Drew Brees, Aaron Rodgers e Mahomes, que destruiu o Tampa Bay na semana 12, com 462 jardas em passes e três touchdowns.

Mas a derrota provou ser o ponto de inflexão para os Buccaneers, que durante os três primeiros meses de jogos havia apresentado um desempenho incerto, com sete vitórias e cinco derrotas, parecendo andar para frente e para trás ao mesmo tempo.

O time fechou a temporada com quatro vitórias consecutivas, e em seguida derrotou três campeões de divisão nos playoffs –e dois dos quarterbacks de elite da liga, Brees e Rodgers–, jogando fora de casa, para chegar ao seu primeiro Super Bowl desde 2002, quando o time derrotou o Oakland Raiders.

Aquele time, como o atual, tinha muito talento na defesa e precisou da chegada de alguém novo, o treinador Jon Gruden, para sintetizar esse talento em um título. Brady conferiu esperanças, credibilidade e possibilidades aos Buccaneers.

Para medir a excelência de Brady, considere que ele agora é não só o quarterback que conquistou o último bicampeonato da NFL, com os Patriots nas temporadas 2003 e 2004, como o quarterback que impediu dois times de conquistarem seus bicampeonatos.

Se foi uma jogada de defesa clássica que liquidou o Seattle Seahawks na decisão do Super Bowl da temporada 2014, no caso dos Chiefs a derrota do adversário foi um esforço coletivo; os Buccaneers forçaram o adversário a entregar a bola duas vezes e impediram o Kansas City de marcar um touchdown.

Brady eliminou três quarterbacks ganhadores de Super Bowl, em sua corrida para o título, mas, ao contrário de Brees e Rodgers, Mahomes, 25, ainda tem muitas temporadas em que exibir seu talento excepcional.

A liga agora pertence a Mahomes e, com a comissão técnica inventiva do Chiefs e seu núcleo generoso de talentos jovens, é muito provável que ele volte a ter oportunidades de vitória.

Mas o título pertence a Brady, que depois de 10 Super Bowls, já começou a planejar seu objetivo para o período entre temporadas: ele quer se tornar mais rápido.

Brady disse sorrindo, um dia desses, que queria acompanhar a geração de quarterbacks mais jovens. Mas a verdade é que são eles que tentarão acompanhá-lo, sempre e para sempre.

Tradução de Paulo Migliacci

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