Cinco aspectos para entender a paixão da Argentina pelo futebol

Essa paixão vem de berço e se agiganta com as crianças; é um sentimento compartilhado, às vezes inexplicável

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Liliana Samuel Daniel Merolla
Buenos Aires | AFP

A Argentina prende a respiração e vive com o coração batendo forte a final da Copa do Mundo de 2022, com a Alviceleste enfrentando a França pelo terceiro título mundial.

A paixão dos argentinos pelo futebol vem de berço e se agiganta com as crianças. É um sentimento compartilhado, às vezes inexplicável. Aqui estão cinco aspectos para entendê-lo.

Prédio com a pintura de Lionel Messi em Rosario, a cidade-natal do craque argentino que está a uma vitória de conquistar o título da Copa do Qatar
Prédio com a pintura de Lionel Messi em Rosario, a cidade-natal do craque argentino que está a uma vitória de conquistar o título da Copa do Qatar - Agustin Marcarian/Reuters

1 - No começo era o futebol

A gênese do futebol na Argentina remonta a meados do século 19, quando o esporte foi introduzido por marinheiros ingleses no porto de Buenos Aires. Os crioulos, surpresos, chamavam aqueles que corriam atrás de uma bola de "os ingleses malucos". Ingleses, galeses, escoceses e irlandeses fundaram clubes próximos às estações ferroviárias que eles mesmos construíram.

A Associação de Futebol Argentina (AFA) foi a primeira federação criada na América do Sul, em 1893, e a oitava no mundo.

Os crioulos dominaram o futebol. Eles trocaram a predominância da força física por uma marca baseada na habilidade, sagacidade, magia, malícia, astúcia e drible. Assim se forjou uma identidade que é vista até hoje em Lionel Messi, Rodrigo de Paul, Julián Álvarez e Ángel Di María.

"Na Argentina, o futebol foi construído como parte de uma sociabilidade possível com território (o bairro), através dos clubes. Essa é a sua magnitude. Existe uma memória coletiva e pessoal que é compartilhada e opera atualmente", disse à AFP o pesquisador e doutor em comunicação Juan Branz.

2 - Vários ídolos e um deus

Em seguida, o povo se identificou com ídolos que representavam esse futebol diferente. Assim foram criadas lendas com Vicente Zito, Natalio Perinetti, Francisco Varallo e Luis Monti, que liderou uma lista de argentinos naturalizados italianos que deram à Itália seu primeiro título mundial, em 1934. Aqueles grandes jogadores deslumbraram o célebre cantor e compositor de tangos Carlos Gardel, que os acompanhava de perto nos campos.

Outras figuras de destaque ao longo dos tempos foram Ángel Labruna, José Manuel Moreno, Tucho Méndez, Amadeo Carrizo, Ubaldo Fillol, Daniel Passarella, Mario Kempes, René Housemann, Gabriel Batistuta e Román Riquelme. No Olimpo das lendas só tinha chegado o símbolo histórico da Alviceleste: Diego Maradona. Agora, Lionel Messi se junta a ele.

"Messi entrou com Diego no coração dos torcedores. Demonstrou ter qualidades de um líder com seu discurso de vestiário antes da conquista da Copa América em 2021. Além de ser o melhor jogador do mundo, é uma grande pessoa, um cara muito querido. Muita gente está feliz pela Argentina, mas também por Messi. Os que duvidavam, o incorporaram em seu coração", afirmou à AFP o historiador Felipe Pigna.

3 - Torcedores apaixonados

As torcidas geraram uma mística de arquibancada que se expandiu a todo o mundo. Os hits argentinos se tornaram famosos nas Copas. "Muchachos", com a música da banda de ska e rock La Mosca, para o Mundial de 2022, é cantado por 40 mil torcedores nos estádios do Qatar e por milhões em praças, bares e parques na Argentina.

A identificação com um clube costuma vir de berço, e dessa escolha praticamente ninguém se arrepende.

O escritor, professor e jornalista Ariel Scher definiu assim: "Podemos citar o escritor Roberto Fontanarrosa, a quem ouvi dizer que uma das razões pelas quais o futebol nos fascina é porque quando o camisa 4 do seu time cobra um lateral, é impossível que você esteja pensando que não pagou a conta de luz. O futebol é um jogo e é uma identidade, e quando acontece, você não pensa em outra coisa".

Mas também há grupos violentos, uma questão pendente, apesar das medidas que foram tomadas, que incluem a proibição da torcida visitante nos estádios desde 2013. Para esta Copa do Mundo, as autoridades elaboraram uma lista de 6.500 argentinos que foram proibidos de entrar no Qatar.

Maradona beija a Copa do Mundo conquistada em 1986 no México; foi a segunda taça da Argentina
Maradona beija a Copa do Mundo conquistada em 1986 no México; foi a segunda taça da Argentina - Dominique Faget - 28.jun.86/AFP

4 - Duas Copas

A Alviceleste conquistou sua primeira Copa do Mundo jogando em casa, em 1978, ao vencer a Holanda na final (3 a 1), no auge de Mario Kempes. A segunda veio no México, em 1986, derrotando a Alemanha (3 a 2), a glória de Maradona.

Perdeu as finais de 1930 para o anfitrião Uruguai (4 a 2), e para a Alemanha em 1990 (1 a 0) e 2014 (1 a 0). Além disso, são 15 títulos de Copa América, a maior campeã ao lado do Uruguai.

Torcedores argentinos comemoram no Obelisco, em Buenos Aires, a vitória da Argentina sobre a Polônia na Copa do Qatar, classificando a seleção para as oitavas de final
Torcedores argentinos comemoram no Obelisco, em Buenos Aires, a vitória da Argentina sobre a Polônia na Copa do Qatar, classificando a seleção para as oitavas de final - Marlene Bergamo - 30.nov.22/Folhapress

5 - Obelisco, bandeira e festa

O Obelisco, no meio da avenida 9 de Julho, é um emblema de Buenos Aires e, desde 1978, o ponto de encontro para as comemorações futebolísticas.

Com 140 metros de largura, a avenida inaugurada em 1937 e inspirada na Champs-Élysées de Paris é um convite para a concentração de pessoas. Mas o escritor Matías Bauxo explicou que o local se transformou em destino natural para os torcedores durante o Mundial de 1978, em plena ditadura, quando os jogos eram transmitidos a cores nos cinemas da perpendicular rua Corrientes.

Em Rosario, cidade de Messi e Di María, as vitórias da Argentina são comemoradas ao redor do Monumento à Bandeira, erguido às margens do rio Paraná, onde o general Manuel Belgrano a içou pela primeira vez em 1812.

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