Publicidade
Publicidade
15/08/2001
-
03h49
ROBERTO COSSO
LEILA SUWWAN
da Folha de S. Paulo, em Brasília
O novo Código Civil, que começou a ser votado ontem na Câmara dos Deputados, vai acabar com o direito do homem de devolver a mulher, até dez dias depois do casamento, se descobrir que ela não era mais virgem.
O Código Civil em vigor, que foi aprovado em janeiro de 1916, considera "erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge" e, portanto, causa para anulação do casamento, "o defloramento da mulher, ignorado pelo marido".
A lei dispõe que, nesses casos, a ação tem de ser proposta até dez dias após o casamento. A limitação ocorre para que a perícia possa verificar se a mulher era virgem ou não quando se casou.
Após o marido ingressar com a ação, caso queira se defender, a mulher tem de se submeter a exames ginecológicos feitos por peritos judiciais para tentar provar que se casou virgem.
De 12 a 15 dias
O hímen -membrana da vagina- demora de 12 a 15 dias para cicatrizar depois de rompido. Se os peritos concluírem que o hímen já estava cicatrizado, o casamento é anulado e os dois cônjuges voltam a ser solteiros, segundo as regras ainda em vigor.
Apesar de a Constituição de 1988 ter igualado homens e mulheres perante a lei e de não ser possível verificar se um homem é ou não virgem quando se casa, a maioria dos grandes especialistas do direito civil brasileiro acredita que o dispositivo do Código Civil de 1916 ainda vale.
"Quando for possível comprovar que o homem não se casou virgem, a mulher poderá pedir a anulação do casamento", afirma a professora de direito civil Maria Alice Lotufo, da PUC-SP.
Os maiores doutrinadores de direito civil -como Washington de Barros Monteiro, Sílvio Rodrigues e Maria Helena Diniz- não fazem ressalva sobre a regra do Código Civil em seus livros.
Casamento anulado
Em 1998, o Tribunal de Justiça do Espírito Santo confirmou uma sentença proferida no município de Alegre (ES) que anulava um casamento porque a mulher supostamente não era virgem.
"Comprovado nos autos, através do laudo de exame de conjunção carnal, o defloramento da mulher, o que era ignorado pelo marido, acertada a decisão que anula o casamento (...) por erro essencial sobre a pessoa do cônjuge, já que a ação foi proposta antes de dez dias da celebração do enlace", escreveu o desembargador José Eduardo Grandi Ribeiro.
Esse entendimento, contudo, não é unânime entre os juízes. Em outro caso, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais considerou "pedido juridicamente impossível" a anulação de casamento por falta de virgindade da mulher, por causa da Constituição.
Ao longo de seus 85 anos de vigência, o Código Civil de 1916 permitiu a anulação de inúmeros casamentos. Não existem estatísticas precisas, mas os livros de jurisprudência -que transcrevem apenas os casos mais relevantes- publicaram algumas centenas de casos.
O procedimento normalmente adotado pela mulher que sofre a ação de anulação de casamento por erro essencial quanto à pessoa é não apresentar defesa. Geralmente a ação corre à revelia e o casamento acaba anulado.
Em 1968, o pernambucano M.O. ingressou com ação contra sua mulher, C.S.O., afirmando que ela não era virgem quando se casou. O marido levou duas testemunhas que teriam ouvido a "confissão" da mulher. A mulher não se defendeu.
O juiz de primeira instância anulou o casamento, mas o Tribunal de Justiça de Pernambuco considerou que a prova testemunhal não bastava e modificou a decisão. Os arquivos judiciais não relatam se M.O. e C.S.O. voltaram a morar juntos.
Na década de 1960, um paulista ingressou com ação de anulação de casamento, e sua mulher apresentou defesa. Depois de ela se submeter a sete perícias, o casamento foi anulado. Por quatro votos a três os peritos concluíram que a noiva não se casou virgem.
Criticada por seu conteúdo moral, a norma que prevê a anulação de casamento por falta de virgindade é também atacada pela classe médica. De acordo com eles, o hímen não é garantia de virgindade e que sua falta não prova a existência de relações sexuais anteriores.
Nova redação
De acordo com o texto do novo Código Civil, a ausência de virgindade não é mais causa para anulação do casamento.
Da mesma forma, o texto acaba com o dispositivo que permite ao pai utilizar a "desonestidade da filha" que vive em sua casa como motivo para deserdá-la.
A futura legislação estabelecerá também que o marido vai poder adotar o sobrenome da mulher e criará um novo regime de bens no casamento.
Depois de aprovado, o texto vai para sanção do presidente Fernando Henrique Cardoso. Pela forma como está hoje, o novo Código entraria em vigor um ano após sua aprovação.
A Folha apurou, contudo, que o relator do projeto de lei do Código Civil, deputado Ricardo Fiúza (PPB-PE), negocia a ampliação desse prazo para dois anos, de modo a permitir a correção de eventuais falhas do texto.
Leia também:
Prazo para posse por usucapião será reduzido
Marido pode usar sobrenome da mulher
Muda conceito de parente para herança
Virgindade deixa de anular casamento
Publicidade
LEILA SUWWAN
da Folha de S. Paulo, em Brasília
O novo Código Civil, que começou a ser votado ontem na Câmara dos Deputados, vai acabar com o direito do homem de devolver a mulher, até dez dias depois do casamento, se descobrir que ela não era mais virgem.
O Código Civil em vigor, que foi aprovado em janeiro de 1916, considera "erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge" e, portanto, causa para anulação do casamento, "o defloramento da mulher, ignorado pelo marido".
A lei dispõe que, nesses casos, a ação tem de ser proposta até dez dias após o casamento. A limitação ocorre para que a perícia possa verificar se a mulher era virgem ou não quando se casou.
Após o marido ingressar com a ação, caso queira se defender, a mulher tem de se submeter a exames ginecológicos feitos por peritos judiciais para tentar provar que se casou virgem.
De 12 a 15 dias
O hímen -membrana da vagina- demora de 12 a 15 dias para cicatrizar depois de rompido. Se os peritos concluírem que o hímen já estava cicatrizado, o casamento é anulado e os dois cônjuges voltam a ser solteiros, segundo as regras ainda em vigor.
Apesar de a Constituição de 1988 ter igualado homens e mulheres perante a lei e de não ser possível verificar se um homem é ou não virgem quando se casa, a maioria dos grandes especialistas do direito civil brasileiro acredita que o dispositivo do Código Civil de 1916 ainda vale.
"Quando for possível comprovar que o homem não se casou virgem, a mulher poderá pedir a anulação do casamento", afirma a professora de direito civil Maria Alice Lotufo, da PUC-SP.
Os maiores doutrinadores de direito civil -como Washington de Barros Monteiro, Sílvio Rodrigues e Maria Helena Diniz- não fazem ressalva sobre a regra do Código Civil em seus livros.
Casamento anulado
Em 1998, o Tribunal de Justiça do Espírito Santo confirmou uma sentença proferida no município de Alegre (ES) que anulava um casamento porque a mulher supostamente não era virgem.
"Comprovado nos autos, através do laudo de exame de conjunção carnal, o defloramento da mulher, o que era ignorado pelo marido, acertada a decisão que anula o casamento (...) por erro essencial sobre a pessoa do cônjuge, já que a ação foi proposta antes de dez dias da celebração do enlace", escreveu o desembargador José Eduardo Grandi Ribeiro.
Esse entendimento, contudo, não é unânime entre os juízes. Em outro caso, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais considerou "pedido juridicamente impossível" a anulação de casamento por falta de virgindade da mulher, por causa da Constituição.
Ao longo de seus 85 anos de vigência, o Código Civil de 1916 permitiu a anulação de inúmeros casamentos. Não existem estatísticas precisas, mas os livros de jurisprudência -que transcrevem apenas os casos mais relevantes- publicaram algumas centenas de casos.
O procedimento normalmente adotado pela mulher que sofre a ação de anulação de casamento por erro essencial quanto à pessoa é não apresentar defesa. Geralmente a ação corre à revelia e o casamento acaba anulado.
Em 1968, o pernambucano M.O. ingressou com ação contra sua mulher, C.S.O., afirmando que ela não era virgem quando se casou. O marido levou duas testemunhas que teriam ouvido a "confissão" da mulher. A mulher não se defendeu.
O juiz de primeira instância anulou o casamento, mas o Tribunal de Justiça de Pernambuco considerou que a prova testemunhal não bastava e modificou a decisão. Os arquivos judiciais não relatam se M.O. e C.S.O. voltaram a morar juntos.
Na década de 1960, um paulista ingressou com ação de anulação de casamento, e sua mulher apresentou defesa. Depois de ela se submeter a sete perícias, o casamento foi anulado. Por quatro votos a três os peritos concluíram que a noiva não se casou virgem.
Criticada por seu conteúdo moral, a norma que prevê a anulação de casamento por falta de virgindade é também atacada pela classe médica. De acordo com eles, o hímen não é garantia de virgindade e que sua falta não prova a existência de relações sexuais anteriores.
Nova redação
De acordo com o texto do novo Código Civil, a ausência de virgindade não é mais causa para anulação do casamento.
Da mesma forma, o texto acaba com o dispositivo que permite ao pai utilizar a "desonestidade da filha" que vive em sua casa como motivo para deserdá-la.
A futura legislação estabelecerá também que o marido vai poder adotar o sobrenome da mulher e criará um novo regime de bens no casamento.
Depois de aprovado, o texto vai para sanção do presidente Fernando Henrique Cardoso. Pela forma como está hoje, o novo Código entraria em vigor um ano após sua aprovação.
A Folha apurou, contudo, que o relator do projeto de lei do Código Civil, deputado Ricardo Fiúza (PPB-PE), negocia a ampliação desse prazo para dois anos, de modo a permitir a correção de eventuais falhas do texto.
Leia também:
Publicidade
As Últimas que Você não Leu
Publicidade
+ LidasÍndice
- Sem PM nas ruas, poucos comércios e ônibus voltam a funcionar em Vitória
- Sem-teto pede almoço, faz elogios e dá conselhos a Doria no centro de SP
- Ato contra aumento de tarifas termina em quebradeira e confusão no Paraná
- Doria madruga em fila de ônibus para avaliar linha e ouve reclamações
- Vídeos de moradores mostram violência em ruas do ES; veja imagens
+ Comentadas
- Alessandra Orofino: Uma coluna para Bolsonaro
- Abstinência não é a única solução, diz enfermeira que enfrentou cracolândia
+ EnviadasÍndice