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Filme registra obra sonora de Cildo Meireles

'Ouvir o Rio' documenta bastidores da gravação de um vinil do artista com sons das bacias hidrográficas do país

Projeto do artista começou como trabalho abstrato e se tornou manifesto contra a degradação ambiental

SILAS MARTÍ DE SÃO PAULO

Quando Cildo Meireles pensou em gravar sons dos rios Brasil afora, imaginou que a obra seria só um disco de vinil. De um lado, sons do gotejar de uma nascente aumentando até a explosão da pororoca e, do outro, risos e gargalhadas de seus amigos.

Isso porque "Rio Oir", o nome do disco, de 2011, é um palíndromo que junta a imagem de um rio, o verbo rir e a palavra espanhola para ouvir, numa espécie de roteiro sonoro de ida e volta entre esses termos.

É curioso, então, que a cineasta Marcela Lordy tenha decidido criar um filme sobre a construção de uma obra que nunca pretendeu ser visual. Tanto que Meireles diz que ela "tirou leite de pedra".

De fato, Lordy testou os limites da fotografia ao retratar rios, lagos, nascentes, cachoeiras e até piscinas para compor as sequências de "Ouvir o Rio". Ela acompanhou a viagem de Meireles e sua equipe aos quatro cantos do país, onde gravaram sons das bacias hidrográficas e até de torneiras e descargas.

Sem dúvida, parece entediante. Em muitos momentos, chega a dar sono. Mas o trunfo desse bom filme é retratar não as belas paisagens percorridas pelo artista, mas um momento decisivo de mudança de curso na construção da obra, como se flagrasse por que Meireles é um artista político muitas vezes sem querer ter sido político.

Um dos maiores nomes das artes visuais do país, Meireles se consagrou com obras que sabotavam o sistema para circular mensagens contra a ditadura nos anos 1970, como as cédulas de dinheiro e garrafas de Coca-Cola que perguntavam quem matara o jornalista Vladimir Herzog.

No caso dos rios, Meireles confessa que buscava criar só uma obra abstrata, ancorada na brincadeira verbal de rir e ouvir os rios. Mas, viajando ao longo do São Francisco, ficou chocado com a degradação ambiental do rio e mudou a ordem dos sons no disco, começando com a pororoca para terminar só com gotas.

"Tudo começou com a ideia desse palíndromo e virou um documentário sobre essa tragédia hídrica", diz Meireles. "Não decidi fazer um trabalho político, mas ao longo dessa caminhada eu fui atropelado pela realidade."

De um lado do disco está então o que ele chama de "catástrofe permanente" da rarefação dos cursos d'água e do outro as gargalhadas. "O riso histérico acaba virando um comentário sobre os sons no outro lado desse disco."


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