Lista de textos do jornal de hoje Navegue por editoria
Crítica drama
Enquanto 'Boy Meets Girl' mantém vigor intacto, 'Sangue Ruim' já ficou datado
CÁSSIO STARLING CARLOS CRÍTICO DA FOLHAO tardio lançamento comercial de "Boy Meets Girl" e "Sangue Ruim" valida a crença de que só o tempo justifica ou refuta os entusiasmos de outrora. Quando o nome do cineasta francês Leos Carax apareceu, há três décadas, veio acompanhado de uma consagração imediata.
Dois anos depois, seu segundo longa foi saudado, por crítica e público cinéfilo, como a confirmação de que ele seria a versão atualizada do que Godard, Truffaut e os asseclas da nouvelle vague representaram nos anos 1960.
O culto, porém, esfacelou-se quando a produção catastrófica de "Os Amantes da Ponte Neuf" (1991) converteu o gênio de primeira hora em artista financeiramente maldito. Sua carreira entrou em parafuso, e ele só se reabilitou em 2012 com o impacto temporão de "Holy Motors".
"Boy Meets Girl" (1984) manteve seu vigor de estreia, em parte por ser aquele tipo de primeiro trabalho em que o artista brinca com as influências e ao mesmo tempo impõe uma abordagem única.
O filme ironiza todas as histórias de amor, como se duvidasse da possibilidade de voltar a um tema tão batido. Em vez da linearidade que culmina no final feliz, Carax encena fragmentos românticos, promessas que ficam incompletas, dores que sempre duram mais que os amores.
A fotografia em preto e branco, além de objetos como telefones em carros, fliperamas e discos de vinil projetam o filme num passado intemporal. Esses anacronismos, por fim, reafirmam a representação do amor romântico, um ideal ao mesmo tempo eterno e ultrapassado.
Já o efeito contrário torna "Sangue Ruim" um filme bastante datado. A mescla de uma obscura trama policial com o tema do amor impossível sofre com o excesso de preocupação com a imagem.
A opção pelo decorativismo fez Carax ser incluído na turma de Luc Besson e Jean-Jacques Beineix, diretores adeptos de um cinema hiperestilizado. Hoje, tal escolha deixa o filme com a aparência de um catálogo de efeitos, algo como uma revista de moda de coleções ultrapassadas.