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Jornalista vê manias da sociedade em romance

Chuck Klosterman inspira-se em H.G. Wells em "O Homem Visível"

Autor de ensaios, escritor americano trata de voyeurismo e exibicionismo em seu 1º livro lançado aqui

RAQUEL COZER COLUNISTA DA FOLHA

Uma mulher de quase 30 anos chega em casa do trabalho, põe um short e um top, sai para uma hora de corrida, volta, acende um baseado, devora um pote de creme de amendoim e uma pizza, fuma de novo, come metade de outra pizza e começa a fazer abdominais até dormir.

Ela não conta a ninguém que repete isso toda noite. Os únicos que poderiam conhecer esse pouco auspicioso ritual diário de prazer e sofrimento, portanto, seriam: 1) um narrador onisciente; ou 2) um homem invisível.

O norte-americano Chuck Klosterman, 41, escolheu a segunda alternativa para desenvolver a narrativa do romance "O Homem Visível", lançado pela Bertrand Brasil.

É o primeiro livro do autor a sair por aqui -nos EUA, ele é conhecido por ensaios como "Sex, Drugs and Cocoa Puffs" (Scribner, 2003), um "manifesto sobre a baixa cultura", e livros sobre música.

O personagem-título de "O Homem Visível" (que não gosta de ser chamado de invisível, já que só é assim para olhos não treinados) é quem invade a intimidade das pessoas (como Valerie, a faminta malhadora maconheira) usando um traje de camuflagem óptica.

Ele diz que é uma "empreitada científica". Quer saber como as pessoas de fato são, despidas dos pudores sociais. Mas entra em crise e busca uma terapeuta, Victoria Vick -ela sim a narradora, nada onisciente, dessa história.

A tentativa de Vick de escrever um livro sobre "Y_", pseudônimo que dá ao paciente invisível, é a base do romance de Klosterman. E é a maneira que ele encontra de tratar de questões como sociedade moderna, tecnologia, voyeurismo e exposição.

"É curioso como as pessoas são quase sociopatas no que diz respeito a seu direito à privacidade, enquanto expõem ativamente cada detalhe de suas vidas na primeira oportunidade", diz o escritor à Folha, por e-mail.

H.G. WELLS

O romance é construído a partir de fragmentos mais ou menos organizados do livro que a terapeuta planeja, com e-mails, transcrições de diálogos e observações.

Vick sabe que sua credibilidade profissional será destruída se o livro sair, mas aceita isso "pelas razões devidas": não é seguro alguém como Y_ andando solto por aí.

Klosterman faz com "O Homem Visível" clara homenagem a H.G. Wells (1866-1946), pioneiro da ficção científica. O jornalista leu "O Homem Invisível" (1897) quando criança, atentando só para a trama central. Ao reler, adulto, abismou-se ao notar como o cientista Griffin, o protagonista, era um perfeito idiota.

"Entendi que qualquer história sobre um homem invisível é, na verdade, um estudo de caráter sobre o tipo de homem que tem esse interesse."

A declarada empreitada científica de Y_ não se mostra tão eficaz: conforme os relatos a Vick revelam, seus conceitos estabelecidos sobre a sociedade não o permitem ir muito além da percepção de que, quando estão sozinhas, as pessoas tendem à inércia pela repetição.

Mas, para o leitor, Y_ oferece descrições saborosas do comportamento humano. Como esta, sobre o que se depreende de um casal em férias espiando-o por dez minutos:

"Se eles quase transam logo depois de entrar no quarto, há uma chance de 95% de transarem mais tarde, à noite; se apenas largam a bagagem e saem para jantar, provavelmente vão passar o fim de semana inteiro sem transar."


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