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Debate político ganha tom cômico em livro

"A Questão Finkler", de Howard Jacobson, aborda paixões da discussão acerca do judaísmo e do antissemitismo

Vencedor do Man Booker Prize 2010 alterna melancolia e humor ao narrar história de três amigos

RAQUEL COZER COLUNISTA DA FOLHA

O escritor britânico e judeu Howard Jacobson, 72, diz às vezes ter a impressão de que seus colegas que vivem em Israel, como A.B. Yehoshua, David Grossman e Amos Oz, o veem como judeu de brincadeirinha.

O tão falado humor judaico, afinal, é algo que quase não se vê na obra desses grandes autores, que testemunham no dia a dia a conturbada vida na Terra Prometida.

"Eles são incríveis, mas nenhum deles é engraçado. Ser judeu em Israel não deixa espaço para isso", diz Jacobson por telefone à Folha, de Londres, onde sempre viveu.

O autor ganhou, em 2010, por "A Questão Finkler", aquilo que foi anunciado como "o primeiro Man Booker Prize para um romance de humor desde 1986", quando a honraria ficou com "The Old Devils", de Kingsley Amis.

Anúncio que viu como ligeiramente injusto: apesar do inegável tom cômico que perpassa as quase 450 páginas, foi o caráter melancólico do livro, até onde o autor soube, o que seduziu os jurados.

"Alguns deles me disseram que o livro os fez chorar. Eu mesmo chorei ao escrever. Não sabia que ia virar algo tão dramático", diz, a sério.

"A Questão Finkler", que acaba de ser lançado pela Bertrand Brasil, narra a história de três amigos emocionalmente ligados ao judaísmo, no bom e no mau sentido.

Há Julian Treslove, um gói (não judeu) obcecado pela improvável chance de ter raízes judaicas. Há também Libor Sevcik, judeu tcheco de quase 90 anos a quem a origem importa menos que a morte de Malkie, sua mulher por mais de meio século.

E há Samuel Finkler, judeu tão avesso a Israel que prefere usar um breve "Sam" na assinatura de seus best-sellers de autoajuda filosófica. Finkler também perdeu a mulher, mas isso afeta mais Treslove do que o viúvo.

RANDÔMICO

Esse trio mantém ao longo do livro discussões randômicas sobre a questão judaica -o que torna cômico um assunto que, para o autor, não poderia ser mais sério.

"Não há razão para se amar Israel politicamente, é natural criticar [o premiê israelense Benjamin] Netanyahu, mas me preocupo quando noto, na vida intelectual inglesa, uma crítica que beira o antissemitismo", diz Jacobson, que já se envolveu em discussões do gênero no jornal "Independent", para o qual colabora.

No romance, para ilustrar esse ponto, cita um certo "carismático diretor de cinema" para quem "o antissemitismo é perfeitamente compreensível" dada a postura do governo israelense -uma referência a Ken Loach, que se manifestou assim em 2009.

"Fico desconfiado ao ver um europeu criticando o sionismo sem considerar sua origem, já que foram os europeus que trataram de garantir que judeus não estivessem à vista. Não significa, é claro, que o sionismo não seja problema para árabes e palestinos."

Mas, se o texto de Jacobson cai na melancolia, especialmente nas situações relacionadas ao viúvo Libor, nada da discussão política soa pesado em "A Questão Finkler".

É nela, acima de tudo, que aparece o humor. Que não é bem o humor judaico tal como o conhecemos entre americanos, esclarece o autor.

"Nos EUA, os judeus ajudaram a construir a cultura, lá eles são milhões. Na Inglaterra somos só 250 mil e não fazemos muito barulho", avalia.

O humor resultante disso acaba sendo "sui generis": tem muito da sutileza do humor britânico, mas com essa capacidade de rir da tragédia que, para os ingleses, é absolutamente estrangeira.


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