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Entrevista - João Sayad

Câmbio, e não juros, é melhor remédio contra a inflação

Ex-ministro defende fim do regime de metas, critica ortodoxos e heterodoxos e diz que hoje se define mais como "espírito de porco"

ELEONORA DE LUCENA DE SÃO PAULO

Medidas de arrocho devem ser descartadas em 2015, independentemente do resultado eleitoral. As mudanças necessárias não são macroeconômicas, mas de regulação. O crescimento será lento. O regime de metas precisa de ajustes, e combustíveis deveriam ser reajustados.

A análise é do economista João Sayad, 68. Ministro do governo José Sarney no Plano Cruzado, secretário na gestão Marta Suplicy em São Paulo e na administração estadual tucana, ele se define hoje como um crítico de ortodoxos e heterodoxos. "Sou espírito de porco", afirma.

Em entrevista à Folha, ele classifica os juros brasileiros como uma anomalia mundial e afirma que industriais viraram financistas. Vítima de assalto na capital paulista, Sayad declara ter medo e avalia que a segurança é o problema número um do país.

Folha - Por que o Brasil cresce pouco?
João Sayad - Não tem uma solução óbvia no curto prazo. O remédio tradicional --corte de gastos, aperto da política monetária-- não parece ser a solução. Colocar todas as fichas contra a inflação seria diminuir ainda mais o crescimento. A inflação está desagradável, mas não como gente da minha idade experimentou. Será difícil para Dilma ou qualquer candidato cumprir uma promessa de recuperação rápida.

Muitos dizem que, independentemente do resultado da eleição, o ano que vem será de arrocho, cortes. É inevitável?
Não é óbvio. Uma política de juros muito mais elevados vai sobrevalorizar o câmbio, com uma entrada de dinheiro que não acaba mais. Na inflação, sou um crítico sem solução para o regime de metas. O regime de metas liga o juro à inflação e o câmbio ao balanço de pagamentos. Só que o que influencia mais a inflação é o câmbio. E os juros influenciam mais o balanço de pagamentos. Deveriam se inverter os remédios.
Essa mudança não é pacífica nem tem resultado garantido. Vejo na condução da política macroeconômica um problema mítico, religioso. Defendo o regime de metas, mas com correções.

É otimista quanto ao futuro?
Tenho uma visão positiva, mas não vai ter taxa de crescimento elevada. Independentemente de quem seja eleito, o crescimento será lento. As mudanças necessárias não são macroeconômicas, são de regulação, regras de administração pública. Necessitamos de obras de infraestrutura, ser mais favoráveis a concessões. Emprego não é uma preocupação hoje. Inflação, câmbio e juros são. Uma grande recessão não seria uma solução. Não há espaço político, e trazer a inflação de 6,5% para 4,5% não compensa. Mas precisa fazer ajustes.

Qual seria o passo além?
Não sei o que daria resultado no curto prazo. Um grande erro é o preço da gasolina, que está 30% defasado. A Petrobras fatura US$ 400 bilhões por ano. Se corrigisse em 30%, seriam mais US$ 120 bilhões. Essa solução seria meio mágica. Repartir esse dinheiro com municípios para financiar transporte público, corredor, metrô.

E qual seria o impacto dessa alta na inflação?
Esse é o grande problema. Perguntaram para o ministro do Planejamento da Índia, do partido que perdeu a eleição, qual foi o maior erro do governo. Ele disse: corrigir o preço da gasolina. Não é uma solução óbvia, mas é tentadora.

E mexer no câmbio?
É o que a indústria fala e o que a agricultura gostaria, mas gera inflação. A política do novo mandato tem que, sem anunciar, fazer uma trajetória para a política cambial que seja compatível com a inflação. O câmbio é a verdadeira âncora da inflação brasileira. Não acredito que [a queda nos juros] seja a causa da elevação da inflação. Não temos inflação de demanda, mas, sim, de custos.

Por que houve recuo?
Porque a inflação subiu. Os juros no Brasil eram e continuam sendo uma anomalia. Reduzir os juros era e é uma proposta razoável, mas, no momento, não há demanda para isso. O momento é de repensar a política de metas. Basta, para horror dos ortodoxos mais jovens, manipular o câmbio de forma a que tenha um comportamento compatível com a inflação. Anunciar mudança no regime de metas de inflação seria um desastre.

Desindustrialização é um problema?
É, e é complicado. Mas eles viraram financistas, deixaram de ser industriais. Primeiro, porque são terceira ou quarta geração dos que trouxeram a indústria. Segundo, porque se adaptaram.

Houve melhoria na distribuição de renda?
A remuneração do capital cresce. A distribuição de renda que houve ocorreu dentro do grupo dos trabalhadores, o que é ótimo. Mas precisa ver o que acontece com o capital. Olhando para as lojas de luxo, barcos, helicópteros, é capaz que tenha aumentado [a concentração].

Além de dar aulas, o que o sr. tem feito?
Escrevi um livro sobre dinheiro e finanças. É mais sobre o debate a respeito da política macroeconômica e monetária. Sempre haverá dois lados: o conservador e o keynesiano. Não estou em nenhum dos dois. Não sou ortodoxo de jeito nenhum, mas também não sou hoje um desenvolvimentista. Eu sou espírito de porco, crítico de ortodoxos e não ortodoxos.

Quando o sr. estava na administração do PSDB-SP, escreveu um artigo na Folha tratando de corrupção. Por quê?
Quando há corrupção, a administração se perde. Minha experiência recente com a Justiça é aterradora. Se fosse presidente, as prioridades seriam Justiça e segurança.

Como atacar o problema da segurança?
Com crescimento, melhorias das condições sociais, presença do Estado na periferia, CEUs, fábricas de cultura. Mas a periferia é imensa. E tem o lado de polícia. Eu andava muito por aqui [na zona oeste de São Paulo], mas ando com medo. Fui assaltado há uns seis meses, no carro. Ele me pôs a faca [no pescoço] e disse: "O celular ou eu te mato". É horrível. Ando de vidro fechado, com medo. [Segurança] é o problema número um do Brasil.

Leia a íntegra folha.com/no1483360


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