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Clóvis Rossi

O texto abaixo contém um Erramos, clique aqui para conferir a correção na versão eletrônica da Folha de S.Paulo.

Itália, democracia sem voto

Renzi será o terceiro premiê consecutivo a chegar ao poder sem passar pela legitimação das urnas

A Itália prepara-se para entronizar seu 69º governo dos últimos 70 anos, provavelmente um recorde mundial que nem a velha Bolívia seria capaz de igualar.

Consequência inescapável: o país está falido, certo? Errado, profundamente errado. A Itália está, sim, em crise, mas a qualidade de vida continua invejável.

Pena que já não seja tão invejável como até o fim do século passado. Prova-o o fato de que sua economia é, hoje, menor do que era há dez anos. Ou seja, a crise não é apenas resultado da crise global de 2008/09. A Itália já não crescia antes dela e continuou não crescendo depois dela, tanto que só no último trimestre de 2013 saiu da recessão, assim mesmo com um crescimento magérrimo (0,1% sobre o trimestre anterior).

Com esse número, 2013 fechou com mais uma retração (1,9%).

É esse país estressado que está inventando a democracia sem voto popular. Matteo Renzi, o jovem prefeito de Florença (39 anos), ontem designado para a presidência do Conselho de Ministros, será o terceiro premiê seguido a chegar ao poder sem passar pelo voto popular.

Antes dele, o tecnocrata Mario Monti e um esquerdista moderado como Enrico Letta haviam sido incumbidos de formar o governo, em razão de manobras do presidente Giorgio Napolitano, que fez o diabo para driblar eleições, por saber que elas apenas conduziriam a um beco sem saída.

Afinal, a legislação eleitoral italiana, obra do inoxidável Silvio Berlusconi, é chamada pelos próprios autores de "porcellum" (ou "porcaria"), porque inibe a construção de uma maioria sólida.

Tanto inibe que Napolitano acabou por inventar um condomínio improvável --e impraticável-- entre direita e esquerda, com apoio da pequena facção centrista liderada por Monti. Foi assim que o próprio Monti tentou governar, Letta fez idêntico ensaio e Renzi está condenado a repeti-lo, a menos que queira ser fiel à promessa de não chegar ao poder a não ser por meio de eleições.

Já violou a promessa ao aceitar ontem a incumbência de formar governo, movido pelo que ele próprio chama de "ambição desmesurada".

Mas, se não conseguir fazer as reformas a que ontem mesmo se comprometeu (eleitoral, fiscal, do mercado de trabalho, da administração pública), será obrigado a recorrer ao velho e bom instrumento das urnas para tentar obter um mandato legítimo que lhe confira maioria suficiente para desesclerosar o país.

Antes e acima de tudo, Renzi terá que dar horizonte aos jovens de entre 15 e 24 anos, 41% dos quais desempregados, quando a taxa geral de desemprego, já alta, é de 13%.

O jovem político tem bala para tanto? Difícil saber de antemão, como é óbvio. Sua experiência administrativa restringe-se a Florença, cidade pequena.

Que a Itália precisa de reformas, não há a menor dúvida. Mas um país que saiu completamente arruinado da Segunda Guerra Mundial (1939/45) para se tornar a sexta potência do mundo, com qualidade de vida invejável, resiste bravamente a que mexam nos usos e costumes dos bons velhos tempos.


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