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Análise - Política externa

Brasil arrisca imagem diplomática na África

Presença baseada em negócios de petróleo e minerais aproxima o país de práticas neocoloniais no continente

O SILÊNCIO BRASILEIRO NAS QUESTÕES SOBRE DIREITOS HUMANOS NA ÁFRICA TEM QUE SER QUEBRADO

MATHIAS DE ALENCASTRO ESPECIAL PARA A FOLHA

Até agora, debates sobre a presença diplomática e empresarial brasileira na África têm sido abordados isoladamente. Pouca atenção é dada ao fato de que ambos os agentes estão ligados e às implicações desta interconexão para a imagem do Brasil naquele continente. Na realidade, ambos constituem dois lados de um mesmo processo.

Nos governos Lula, o Estado brasileiro abordou a relação com a África sob o prisma de um ideal de solidariedade que enfatizava as raízes históricas e culturais entre os povos e os benefícios de maior integração econômica entre países do hemisfério Sul.

Esse ideal político desenhado pelo Itamaraty e encarnado pelo presidente dependia em grande parte da expansão das multinacionais brasileiras, lançadas no resto do mundo pelas medidas de privatização e internacionalização implementadas nos governos Fernando Henrique Cardoso.

Mas a narrativa de um Brasil apresentado como país fundador de relações mais equilibradas e igualitárias com a África perdeu força depois do governo Lula.

A ausência de um líder carismático deixou a nu a falta de recursos do Itamaraty para atingir as metas definidas pelo próprio governo. Por conseguinte, o setor privado assumiu o comando das relações com países africanos.

Desde então, a ponte da solidariedade erguida pelo Estado passou a ser atravessada em grande parte por multinacionais.

Hoje, a presença brasileira na África é essencialmente extrativa. Segundo um relatório do organismo britânico Chatham House de 2012, 80% do comércio Brasil-África consistia em negócios de petróleo e minerais.

Isso expõe o Brasil ao risco de ser visto pelos seus parceiros africanos como mais um dos países com práticas neocoloniais, envolvido na reprodução de hierarquias econômicas globais. Outras potências, em particular a China, também atravessam um momento semelhante.

Mas, enquanto análises sobre os erros da China na África levaram o governo de Pequim a reconsiderar sua estratégia africana, no Brasil,o véu ideológico da solidariedade paralisa o debate.

Os críticos da política africana brasileira são geralmente tidos como suspeitos de oporem-se à presença do Brasil no continente africano.

Inicialmente proposta como uma ideologia de emancipação, a solidariedade está se transformando numa forma de neo-lusotropicalismo, o conceito elaborado por Gilberto Freyre que o regime salazarista utilizou como verniz para colorir realidade colonial portuguesa.

O próximo governo brasileiro terá que articular o tripé financiamento público, investimento privado e cooperação entre agências estatais para romper com essa lógica.

Isso passa pela outorga à diplomacia brasileira de meios equivalentes aos dos corpos diplomáticos de outros países: um organismo de alocação de ajuda externa.

A Agência Brasileira de Cooperação deveria fazer com as diferentes iniciativas ministeriais o que o Programa Bolsa Família fez com os vários programas sociais precedentes: centralizar, sistematizar e monitorar as atividades.

Ainda mais importante, todos os empréstimos do BNDES deveriam ser submetidos a um parecer da Secretaria dos Direitos Humanos da Presidência da República.

O silêncio brasileiro nas questões que dizem respeito aos direitos humanos na África tem que ser quebrado. Só passando das palavras aos atos o Brasil poderá corresponder às expectativas que muitos africanos nutrem para com a cultura e o desenvolvimento brasileiro.


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