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New York Times

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A difícil missão de retratar o rei do funk

Talento e conflito no palco e na vida de James Brown

Por NELSON GEORGE

Mostrar James Brown nas telas de cinema sempre foi uma ideia sedutora. Como um dos maiores artistas da cena musical do século 20, ele inspira documentaristas, dramaturgos, atores e outros artistas que reconhecem a dimensão de sua grandeza. No entanto, captar seu lado humano é algo bastante complexo.

"Get On Up", o novo filme biográfico dirigido por Tate Taylor a partir de um bom roteiro dos irmãos Jez e John-Henry Butterworth, tenta mostrar um artista determinado cuja carreira durou seis décadas e cuja personalidade pública ofuscou sua vida pessoal. Sua identidade fluida se refletia em muitos de seus apelidos artísticos, como Senhor Dinamite, o homem que trabalhava mais duro no show business, Padrinho do Soul e Inventor da Disco Music.

Todos os astros pop duradouros têm a capacidade de acompanhar as mudanças culturais, mas as guinadas de Brown -de integracionista ferrenho a protonacionalista negro e vice-versa, de defensor dos direitos civis a espancador de esposas- sugerem um conflito interno que contrasta com sua aparente autoconfiança.

Brown, que morreu no Natal de 2006, iniciou a carreira nos anos 1950 sob a influência de Little Richard e acabou sendo uma grande inspiração para cantores-dançarinos atuais como Usher e Chris Brown. Obviamente, Michael Jackson e Prince o idolatravam.

Transitando entre o gospel, o blues e o jazz, Brown foi uma figura dominante no soul dos anos 1960, criou o funk, inspirou a disco music e, com suas batidas, estabeleceu a base do hip-hop.

Tão importantes quanto os discos de Brown, suas apresentações ao vivo e sua personalidade são lendárias. Ele inclinava o microfone para a frente e, antes que caísse no palco, o puxava de volta pelo cabo. Ele se atirava no chão, abria as pernas e se levantava com um salto. Fingia estar exausto, saía para colocar um manto régio nos ombros e voltava para cantar.

Brown, que foi abandonado pelos pais na infância, se fez sozinho e desenvolveu um ego imenso para mascarar suas inseguranças. Durante o movimento pelos direitos civis, ele surgiu como um líder capaz de impedir um tumulto em Boston após o assassinato de Martin Luther King Jr. Ele deixou de alisar o cabelo e assumiu um penteado afro durante a época do "Black Is Beautiful", depois retomando o estilo retrô porque adorava ter cabelo liso.

O produtor Brian Grazer disse que obteve os direitos para filmar a história do astro há 13 anos. Quando Brown morreu, "tornou-se impossível fazer o filme", comentou Grazer. "Todos os relacionamentos que havíamos cultivado se desfizeram." Brigas ligadas ao espólio obrigaram Grazer e os demais envolvidos no projeto do filme a se afastarem.

"Então, cerca de um ano após a morte de Brown, Mick Jagger me telefonou", relatou Grazer. "Ele havia liberado todos os direitos principais e lido o roteiro, e queria participar do projeto."

Jagger se empenhou na realização de "Get On Up" e está produzindo um documentário sobre Brown com direção de Alex Gibney, que ganhou um Oscar.

"James me influenciou inicialmente de várias maneiras", disse Jagger. "Ele me mostrou como interagir com a plateia e que sempre é preciso dar toda a sua energia em todos os shows."

Embora não fossem amigos íntimos, Brown e Jagger interagiram muito nos anos 1960. Ambos se apresentaram no "The T.A.M.I. Show" com vários artistas, filmado em 1964, o qual aparece no filme biográfico.

Brown é interpretado por Chadwick Boseman, que também fez o papel de Jackie Robinson em "42".

Retratar Brown é complicado devido ao próprio cantor, que às vezes parecia uma caricatura das emoções da soul music, assim como sua expressão mais rematada. Isso se acentuou ainda mais em suas últimas décadas de vida. No filme "Os Irmãos Cara de Pau" e em aparições na TV, por exemplo, ele parecia representar versões caricaturais de si mesmo.

Embora "Get On Up" não explore muito o processo criativo de Brown, há uma cena forte na qual Brown intimida sua banda fazendo cada músico, desde o guitarrista ao trompetista, confirmar a ideia de que todos estão tocando "um tambor".

No final do filme, um texto explica o quanto as batidas de Brown têm sido sampleadas. Não há, porém, cenas da irritação inicial de Brown pelo fato de suas músicas serem retrabalhadas. Samples de hip-hop mantêm Brown mais relevante entre jovens ouvintes do que a maioria de seus pares na cena soul da década de 1960.

Brown tinha ideias visionárias sobre o controle de sua carreira. Antes de ter problemas com o Fisco em meados dos anos 1970, comprou algumas emissoras de rádio, restaurantes de fast food, selos fonográficos e um avião privado quando isso não era comum para astros de rock.

Em uma sequência em "Get On Up", seu empresário e agente Ben Bart o presenteia com um Cadillac, um mimo usual de figuras poderosas brancas para astros negros. Brown não fica impressionado. Posteriormente, ele cria um novo sistema de turnês, assumindo um papel central para agendar seus shows.

Indubitavelmente, Brown era exagerado. No entanto, o jovem James Brown também foi um pensador precoce que prosperaria no atual cenário musical, no qual os artistas são independentes e se apoiam em seu talento, inovações e ousadia.


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