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Minha história - Justin Skeesuck, 39

Deixa que eu te empurro

Americano que perdeu movimentos das pernas e dos braços fez em 34 dias o Caminho de Santiago de Compostela, levado por seu melhor amigo

DIOGO BERCITO EM MADRI

RESUMO

Justin Skeesuck, 39, acaba de concluir o desafiante Caminho de Santiago de Compostela. Foram quase 800 km em 34 dias de trilha no norte da Espanha, entre lama e caminhos pedregosos --em uma cadeira de rodas, empurrado pelo melhor amigo, Patrick Gray. Skeesuck não move as pernas nem os braços, devido a uma doença pouco conhecida, a axonopatia motora multifocal adquirida. A aventura, que ele narra à Folha, deve virar um documentário no ano que vem. A lição, diz, é de que todos precisam de um empurrãozinho, ainda que metafórico.

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Um acidente de carro, quando eu tinha 16 aos, ativou uma doença autoimune dormente em mim. Meu sistema imune passou a atacar os meus nervos. Sinto tudo no corpo, se você me beliscar, mas os meus músculos aos poucos pararam de reagir.

Sempre fui otimista. Quando perdi o movimento das pernas, pensei que seria difícil, mas que eu conseguiria. Só que perder o movimento dos braços foi outra coisa.

Você passa a depender dos outros para viver. Abre mão de muita coisa: comer, ir ao banheiro, escovar os dentes, abraçar sua mulher, segurar a mão do seu filho.

Passei a questionar as coisas e perguntar se a vida valia a pena. Eu pude ver como as pessoas podem cair nesse buraco escuro diante delas, como vivem em depressão. Era assustador estar ali, mas decidi ir em outra direção.

Em 2012, assisti na televisão a um programa sobre o Caminho de Santiago. Alguma coisa dentro de mim ficou presa àquela ideia. No começo, era um desafio pessoal --fazer uma coisa tão difícil que eu sabia que não iria conseguir fazer sozinho.

Perguntei ao meu melhor amigo, Patrick Gray, o que ele pensava sobre isso. Ele disse: "Está bem, eu empurro a sua cadeira de rodas".

Nós nos conhecemos a vida toda. Nascemos com menos de um dia de diferença. Crescemos juntos, no Oregon (EUA). Temos uma relação profunda. Sabia que, se ele dissesse "Sim", iria comigo.

Demorei dois anos para me preparar. Precisava de uma cadeira de rodas especial. Pesquisei entre as opções para trilhas. Escolhi um modelo feito de alumínio, com três rodas, breque, luz. Sabia que seria o suficiente. Levou cinco meses para ela ficar pronta, já que é feita sob medida. Custou cerca de R$ 20 mil, que nós arrecadamos com patrocinadores particulares.

Patrick começou a malhar, a preparar o seu corpo, desde o início. Ele tinha de empurrar meus 90 quilos, além da cadeira, também pesada.

Muita gente disse que a gente não conseguiria. Mas não ouvimos. Eu sei do que sou capaz. Mesmo no dia da partida, as pessoas diziam que seria impossível. Nós mostramos que elas estavam erradas; foi como um combustível para nós.

Enfrentamos ruas pavimentadas, caminhos rochosos. Às vezes era tão rochoso que era difícil mesmo andar a pé. Lama, água. Tudo pelo que você pode passar.

Encontramos diferentes reações, durante o caminho. Às vezes eram olhares de confusão. "O que vocês estão fazendo?". Eles nunca tinham visto aquilo antes.

Mas, na maior parte do tempo, as pessoas apoiavam. Sabíamos que estávamos em boas mãos. Nos ajudavam a cruzar rios, em trechos de subida. Percebi que, se eu for humilde e deixar que me ajudem, isso me fará feliz.

Foi incrível ver essas pessoas desconhecidas interagindo. Você precisa que as pessoas empurrem você na vida, metaforicamente.

Foram 34 dias de trilha. Vamos transformar em um documentário chamado "Eu Vou Lhe Empurrar", em 2015.


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