Descrição de chapéu

'O Processo' apresenta versão desapaixonada do impeachment

Documentário de Maria Augusta Ramos sobre a deposição de Dilma estreia nesta quinta (17)

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Cena do filme o Processo.
Cena de 'O Processo', na qual estão acampados na Esplanada grupos a favor de Dilma (à esq.) e contrário a ela   - Divulgação

O Processo

  • Quando Em cartaz a partir desta quinta (17)
  • Produção Brasil, 2018
  • Direção Maria Augusta Ramos

Veja salas e horários de exibição

Quando depuseram o presidente João Goulart, em 1964, os militares deram o nome de revolução ao seu movimento. O declínio do regime possibilitou que a palavra mais verdadeira, golpe, se fixasse.

O impeachment de Dilma Rousseff se tornou objeto, como se sabe, de disputa análoga. É significativo que Maria Augusta Ramos tenha decidido chamar de "O Processo", e não de "O Golpe" seu documentário sobre os dias mais agudos da crise política.

O título do filme pretende enfatizar o que houve de kafkiano, de absurdo nas acusações contra a presidente.

Mas também expressa os limites objetivos dos fatos relatados. Tudo se restringe ao período que vai de 17/4/16, quando a Câmara aprovou o início do processo de impeachment, a 31/8/16, quando o Senado cassou o mandato de Dilma.

Não há maior contextualização —o que levaria, sem dúvida, a uma tomada de posições mais enfática pela cineasta.

Seria possível, numa versão petista, mostrar os ganhos sociais do governo Lula e o inconformismo da direita com isso. Ou, numa versão pró-impeachment, mostrar o descontentamento com a corrupção do governo e os dados calamitosos da economia depois da reeleição de Dilma.

Embora acompanhe mais de perto os bastidores da resistência dilmista —com Gleisi Hoffmann, Lindbergh Farias e José Eduardo Cardozo nos papéis principais—, a abordagem de "O Processo" é bem desapaixonada.

Ramos segue uma escola de documentarismo que —ao contrário de um Michael Moore, por exemplo— reduz ao mínimo as intervenções do diretor. Não há narração; os letreiros situando a ação são breves e neutros.

Seria possível, sem pesar muito a mão, mostrar as cenas comprometedoras de desequilíbrio ou de ridículo dos defensores do impeachment. A advogada Janaína Paschoal, que protagonizou algumas, é tratada com respeito no filme.

O espectador pode simpatizar, por exemplo, com seu embaraço ao conversar com fãs evangélicos, ainda que, no embate entre acusação e defesa, seja José Eduardo Cardozo, o advogado de Dilma, quem se mostre mais lógico e sereno.

Ele tentou, em sua sustentação oral, sintetizar a tese de que as pedaladas fiscais e os empréstimos sem autorização do Congresso não constituíram crime de responsabilidade por parte de Dilma.

Talvez o ponto não fique suficientemente claro para o espectador de "O Processo"; todo o assunto é daqueles que, em geral, a gente só entende se desenharem. Dada a preferência da diretora por deixar personagens e fatos falarem por si, é o aspecto incompreensível que mais se destaca.

O filme se areja bastante quando se distancia da discussão parlamentar.

A bela fotografia de Alan Schvarsberg mostra os céus de Brasília e o vazio de seus palácios, alternando-os com a floresta de tripés fotográficos e o embolo de repórteres à espera da decisão. Há silêncios e mais silêncios: no close desalentado de um militante, no olhar de uma deputada, no trabalho de um assessor.

 

O maior silêncio é o da própria direção do filme, que parece confiar demais no julgamento do espectador. Flerta, contudo, com ao menos duas interpretações questionáveis a respeito de toda a crise.

A primeira, expressa pela defesa de Dilma, foi a de que o processo visava a parar a Lava Jato —como se o PT morresse de amores por Sergio Moro.

A segunda, que se deixa intuir pelas nuvens negras que terminam o filme, é a de que as reformas conservadoras de Michel Temer abririam uma fase de grande revolta popular e repressão policial.

A sugestão, como tudo no filme, é seca, quase gélida. Não parece convincente. Mas o julgamento histórico ainda está, por certo, em curso.


Onde estão os petistas ligados ao processo

Dilma Rousseff

Primeira mulher a ocupar a Presidência da República, Dilma foi denunciada por Janot sob acusação de integrar o 'quadrilhão do PT' para desviar verba da Petrobras. Ela nega. A petista deve disputar uma vaga no Senado por MG.

Gleisi Hoffmann

Ministra do governo Dilma, a senadora se tornou ré no STF, no âmbito da Lava Jato, sob acusação de ter recebido propina --ela nega a suspeita. Foi eleita presidente do PT em 2017 para um mandato de dois anos.

Lindbergh Farias

O senador, que perdeu a disputa pelo comando do PT para Gleisi, é o líder da bancada da sigla no Senado. É investigado em inquérito no STF, em processo sigiloso. Uma segunda apuração foi arquivada.

José Eduardo Cardozo

Ex-ministro da Justiça e advogado-geral da União do governo Dilma, desde que deixou o poder tem viajado pelo exterior para falar sobre o impeachment. Quando está no Brasil, atua como criminalista.

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