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Clássico, 'A Experiência do Cinema' é o mesmo livro da edição de 1983

Obra sustenta-se como conjunto representativo de reflexões propiciadas pelo 1º século de cinema

O organizador de 'A Experiência do Cinema', Ismail Xavier - Bruno Poletti/Folhapress

A Experiência do Cinema

  • Preço R$ 64,90 (392 págs.)
  • Editora Paz & Terra
  • Organizador Ismail Xavier

Desde que saiu pela primeira vez, em 1983, "A Experiência do Cinema" foi reeditado quatro vezes pela Graal, a última em 2008, e tornou-se referência obrigatória dos estudos cinematográficos no Brasil.

Ali, Ismail Xavier reuniu textos de alguns dos principais teóricos no século 20, de modo a dar conta dos variados entendimentos que esta arte suscitou desde o seu surgimento.

A nova edição, da Paz e Terra, toma a antologia como clássico, e tem toda razão, e não apresenta nenhuma mudança em relação às edições anteriores: o que temos é o mesmo livro de 1983; nada é suprimido e pouco é acrescido.

Dividido em três partes, "A Experiência do Cinema" introduz o leitor a reflexões sobre a arte do cinema desde seus primeiros desbravadores. E ninguém representaria melhor essa fase que Hugo Munsterberg, que já coloca questões como percepção e natureza dos movimentos.

Ele morre em 1916. Daí até Bela Balazs, a teoria confunde-se com a realização. E vem sobretudo da Rússia de Eisenstein, Pudovkin e Vertov, mas ainda do francês Jean Epstein.

Pode-se voltar à introdução, na qual Xavier aponta a principal angústia do organizador: o que incluir e excluir numa antologia dessa natureza?

Alguns ficam de fora por excessivamente célebres (Walter Benjamin), outros por tocarem um terreno em parte coberto por Munsterberg (Rudolf Arnheim).

No terreno do cinema moderno, a figura central é, obviamente, André Bazin: ainda hoje a principal influência teórica sobre a realização cinematográfica. Ao seu realismo vem se opor o surrealismo, do cinema como exploração profunda do imaginário, tendo por centro o sonho —o que postula aqui o poeta Robert Desnos.

Está aí posta a chave da confrontação mais célebre entre revistas cinematográficas em todos os tempos: os Cahiers du Cinéma, do católico Bazin, de um lado, contra Positif, influenciada pelos surrealistas.

A terceira parte do livro pertence ao momento em que o cinema é posto em questão pela produção teórica, sob influência sobretudo de uma nova ciência, a semiologia (mesclada ao marxismo e à psicanálise). É o momento da crítica da representação clássica.

É inegável que aqui interferiram fartamente os ecos de Maio de 68, com acento talvez excessivo na noção de ideologia. Embora tenham imposto aos estudos do ramo conceito até hoje importantes (como diegese ou voz over)

Mas esses textos, produzidos na maioria nos anos 1970, representam os mais recentes gritos do pensamento cinematográfico à época da edição original. Logo, é importante questionar uma nova edição sem revisão ou ampliação.

Nada entrou que, de Gilles Deleuze a David Bordwell, por exemplo, traga visões mais próximas de nós (com exceções, como o texto de Laura Mulvey sobre a prevalência do olhar masculino no filme clássico) do que se tem pensado sobre o universo das imagens num momento, aliás, de transformações vertiginosas.

Parece-me que qualquer mudança na ordenação inicial quebraria a unidade da obra.

Xavier comenta a dificuldade da necessidade de ater-se ao limite do volume. Com efeito, "A Experiência do Cinema" sustenta-se como um conjunto representativo de reflexões propiciadas pelo primeiro século do cinema.

Essas reflexões, em seus pontos mais ou menos fortes constituem-se em objetos legíveis até hoje, isto é, que continuam a propiciar novas visões, novas abordagens e críticas. É em linhas gerais a função de um clássico: ser o mesmo, porém aberto a novas leituras.

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