Descrição de chapéu Moda

Empresário de visão, Ermenegildo Zegna originou império da moda masculina

Sinônimo de luxo artesanal, grife ampliou domínios a partir de tecelagem no norte da Itália

Francesca Angiolillo
Milão e Trivero

A cabeça do grupo Ermenegildo Zegna fica num edifício envidraçado em Milão. Seu âmago, porém, está nas montanhas de Biella, no vizinho Piemonte.

Foi ali, na pequena Trivero, que em 1910 Ermenegildo, filho do relojoeiro Michelangelo Zegna, decidiu que, do lanifício iniciado pelo pai no fim do século 19 sairiam os tecidos mais bonitos do mundo. 

 
 

Anna Zegna, neta de Ermenegildo, responde pela Fondazione Zegna, braço social do grupo —os negócios propriamente ditos ficam a cargo de Ermenegildo, ou Gildo, seu irmão, e Paolo, seu primo.

Formada em ciências políticas, Anna ingressou na firma após três anos trabalhando no marketing de Gianni Versace —até hoje, um membro da família que deseje entrar para a empresa deve ter ao menos cinco anos de experiência profissional fora.

Hoje, diria dias mais tarde uma das funcionárias da fábrica em Trivero, é Anna quem mais encarna o espírito de Ermenegildo —o de “um empreendedor que pensava na comunidade”, nas palavras da neta em entrevista à Folha.

A comunidade de que cuida Anna vai além do vilarejo em torno do qual a família estendeu seus domínios e o avô plantou mais de meio milhão de árvores, formando a reserva batizada de Oasi Zegna. 

Bem além, dado o caráter mundial do grupo, cuja internacionalização começou em 1938, com a ida de Ermenegildo aos Estados Unidos para apresentar a marca a costureiros italianos ali radicados. Em 1945, os tecidos Zegna eram exportados a 40 países. 

Hoje há rebanhos da marca na Nova Zelândia, na Austrália e na África do Sul; tosquiadores treinados extraem de vicunhas peruanas o mais leve dos fios de lã —pouco afeitos ao trato humano, esses camelídeos se assustam e podem morrer do coração se a aproximação não for delicada.

Mas tudo começa nas montanhas de Trivero e, garante Anna, assim continuará. Questão de “genius loci”, diz. 

Em português, o espírito do local poderia se traduzir por água, simplesmente. Ali, ela é doce, em oposição à calcária, que predomina na península. 

Essa característica faz a diferença na lavagem dos fios, no início do processo. Na outra ponta, o “enobrecimento”— que abarca diversas formas de cardar, pentear e condicionar a lã, segundo o efeito desejado— conclui o fabrico que distingue os têxteis Zegna.

Em 1932, Trivero já tinha, graças à fábrica, sala de convenções, biblioteca, centro esportivo, cinema, teatro e uma piscina pública, aos quais viriam se somar um centro médico e uma escola maternal.

“Os jovens que vêm trabalhar aqui entendem que fazem parte de algo maior e são respeitosos de nossos valores.”

Um desses jovens tornou-se  o diretor artístico da grife.​ Alessandro Sartori traduz em roupas e na fala o espírito da família: respeito à tradição, à qualidade da manufatura, aos elementos naturais.

Nascido em 1966 em Biella, ali estudou engenharia têxtil e, depois, já em Milão, moda. Trabalhou por 14 anos no grupo e, em 2016, após cinco anos e meio na Berluti, do conglomerado LVMH, voltou no topo da cadeia criativa dos Zegna.

Em janeiro, quando a Folha visitou o grupo, ele mostrou a coleção de inverno 2018-2019 da Ermenegildo Zegna num prédio de feições brutalistas da universidade Bocconi.

A passarela se cobriu de neve artificial para exibir peças criadas numa cartela de cores que remete à paisagem de Trivero. “A coleção se inspira em algo muito nosso, que é o Oasi Zegna. Fala-se muito de sustentabilidade, de natureza, e nós temos uma história verdadeira sobre isso, que gosto de contar”, diz Sartori.

 
Em seu discurso como estilista, a chave é a renovação da gramática clássica. “Reproduzir uma estética com um ar vintage não me interessa. A ideia modernizada, revista, repensada e reproposta me interessa. Assim se atraem também as novas gerações”, diz.

Sartori rejeita a hipermoda —seus ternos “glam” de tecido adamascado e gola estranha, ilustra— como caminho necessário para renovar a moda masculina. “Há áreas de criatividade pouco exploradas. O território que vai do clássico até a hipermoda é enorme e feito de produtos estilísticos interessantes, um dos quais muda o aspecto da peça.”

“É artesanal; mas é o que faz a alta costura feminina, um exercício de trabalhar com o modelo, com os detalhes.”

É nesses pormenores, diz, que mora o estilo. Como nos cintos dos sobretudos da nova coleção, correndo no interior da peça, através de fendas na cintura, e não em passantes.

Sartori sabe, claro, que o território da Zegna —a cujo ateliê no centro de Milão acorreriam clientes interessados em reproduzir, sob medida, as peças do desfile da noite anterior— não é a chão que pisa a maioria das grifes. 

“Do tecido à confecção, são no mínimo seis meses”, diz, recordando o exercício de modelagem exaustivo. 
Contabilizando ainda as fases anteriores, seriam necessárias 500 mãos para colocar num manequim um terno Zegna —desde os tosquiadores até o costureiro que corta e faz casas de botão à mão, passando pelas mulheres que, na tecelagem, controlam e reparam, também à mão, eventuais imperfeições.

Para outras grifes, diz Sartori, há outras realidades.

“Quando certos fenômenos se tornam fenômenos de marketing, presto muita atenção. ‘See now, buy now’ e ‘genderless’ são fenômenos corretos. Mas depende do contexto da marca e do cliente”, diz.
“Se uma marca faz um produto ‘genderless’ e aquela estética é correta para ela, tudo bem. Se uma casa como Ermenegildo Zegna, que é o máximo da masculinidade e do máximo do luxo para o homem for fazer ‘genderless’, está fora do rumo.”

A jornalista viajou a convite da Ermenegildo Zegna

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