Novo clipe da underground Teto Preto ataca religiosos e conservadores

As músicas da banda entrelaçam contracultura, ativismo, cinema novo e vanguarda paulista

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Danila Moura
São Paulo

Mergulhar numa semana árdua de gravações foi o jeito escolhido pela banda ativista Teto Preto​ para lidar com o resultado das eleições presidenciais.

“Queríamos incomodar, mostrar que estamos presentes. É um recado: a arte está viva, nossa arma é nosso corpo” declara Loïc Koutana, performer franco-congolês integrante do grupo que lança nesta quinta (22) o clipe de “Pedra Preta”, faixa que batiza o disco lançado no selo Mambarec. 

Cena do clipe 'Pedra Preta', da banda Teto Preto - Divulgação

Com artistas transexuais, o vídeo começa com imagens do incêndio no Museu Nacional. A partir daí, a trupe encabeçada pela vocalista Angela Carneosso ateia fogo nos valores tradicionais da família ao mostrar uma noiva em fuga de um casamento.  

Apoiada pelas madrinhas, ela ainda estica uma “cinta-pênis” de 15 metros, cujo ápice é uma castração em meio a uma suposta igreja neopentecostal. Voam tresloucadas animações penianas.

Na trama novelesca ainda há espaço para um aborto da mocinha, em referência ao episódio da grávida de Taubaté, em que o país acreditou na história de falsos quadrigêmeos.

Toda essa epifania é para uma música que fala sobre “romper amarrações de amor”. O local do casório é a Casa do Povo, espaço cultural no bairro paulistano do Bom Retiro.

O vídeo é resultado de parceria com a produtora Planalto e foi gravado na semana seguinte à vitória do presidente eleito Jair Bolsonaro. De acordo com a declaração da banda sobre a composição de “Pedra Preta”, feita por Carneosso e André Sztutman, trata-se de  um grito, um aborto verde-amarelo, um ritual de celebração do que vivemos e acreditamos”.

Cena do clipe 'Pedra Preta', da banda Teto Preto - Divulgação

Surgido nas festas underground do coletivo Mamba Negra, em espaços abandonados da cidade, o Teto Preto começou de maneira improvisada com performances “jam session” em meados de 2015, quando contava com o músico L_cio na formação.

Carneosso é o codinome da ruidosa vocalista Laura Diaz, atriz com passagem pelo Teatro Oficina, formada em audiovisual na Universidade de São Paulo —ela chegou a ser presa durante a ocupação da reitoria da instituição em 2007. Além de Koutana, complementam a escalação o instrumentista Zopelar (sintetizadores e bateria eletrônica), Savio de Queiroz (sintetizadores e bateria eletrônica) e William Bica (percussão e trombone).

Sem anestésicos, as letras da banda são tapas no conservadorismo, entrelaçadas por referências à contracultura e à Boca do Lixo, transitando do cinema novo à vanguarda paulistana.

As performances são um incentivo à desordem, atestado no hit do EP “Gasolina” (2016), que fez a banda sair dos galpões e chegar aos principais festivais, como Recbeat, Bananada, Dekmantel, DGTL e ainda uma transmissão histórica no programa britânico de streaming Boiler Room.

No palco, Laura Diaz canta com a vulva exposta, munida de figurinos sufocantes da estilista Fábia Bercsek, que mostram o corpo de forma perturbadora.

Em 2017, o grupo conquistou o prêmio de melhor direção nacional do Music Video Festival com o clipe de "Gasolina", além de participações da faixa no filme "Corpo Elétrico" (2017), de Marcelo Caetano, na peça "Quando Quebra, Queima!", da Coletiva Ocupação e na música "Mãe Gentil", do novo disco da cantora Marina Lima, que virou uma espécie de madrinha da banda no mundinho mais tradicional da MPB.

O lançamento das oito faixas de “Pedra Preta” revela o amadurecimento do Teto Preto, que evoluiu para a atual formação de banda mais afeita ao rock e noise, flertando pesado com industrial, dub, disco e new wave. Mas não deixa de surpreender ao misturar elementos do techno ao jazz, apimentados por brasilidades.

A temática feminista de “Pedra Preta” é uma evolução do lançamento anterior, o clipe de outra faixa do disco, a “Bate Mais”, sobre a impunidade dos assassinatos da vereadora Marielle Franco e da artista Matheusa.    

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