Descrição de chapéu The New York Times

Economia da China despenca e ameaça o mundo

Covid zero cobra seu preço e vai custar caro aos demais países, que dependem de fábricas e consumidores chineses

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Daisuke Wakabayashi
Seul | The New York Times

Quando países de todo o mundo vacilaram diante dos ventos contrários da pandemia, a China muitas vezes se destacou, aparentemente impermeável às pressões financeiras que prejudicavam o crescimento.

Mas agora, prejudicada por seu esforço para conter a disseminação da Covid-19 com bloqueios generalizados e quarentenas em massa, a China sofreu um de seus piores trimestres em anos, ameaçando uma economia global que depende fortemente de fábricas e consumidores chineses.

Para o Partido Comunista que governa o país, a desaceleração pode aumentar a pressão sobre Pequim num momento delicado. A China está programada para realizar seu congresso do partido ainda este ano. Uma economia próspera e uma riqueza crescente faziam parte do plano que os cidadãos chineses aceitaram em troca de viver sob um regime autoritário.

Consumidora chinesa faz compras em supermercado
Consumidora chinesa faz compras em supermercado - Wang Chun - 5.mar.22/Xinhua


Mas os bloqueios, um elemento básico da política "Covid zero" de Pequim, aumentaram o risco de instabilidade, tanto social quanto econômica.

O Departamento Nacional de Estatísticas da China disse nesta sexta-feira (15) que a economia cresceu 0,4% em relação ao ano anterior no segundo trimestre –pior que as expectativas de alguns economistas. Foi a menor taxa de crescimento desde o primeiro trimestre de 2020, quando o país efetivamente se fechou para combater os estágios iniciais da pandemia, e sua economia encolheu pela primeira vez em 28 anos.

A desaceleração de 2020 foi de curta duração, com a economia chinesa se recuperando quase imediatamente. Mas o panorama atual não é tão promissor. O desemprego está próximo dos níveis mais altos já registrados. O mercado imobiliário continua caótico e as pequenas empresas arcam com o peso da fraqueza dos gastos do consumidor.

"A China é o grande imprevisto na economia global", disse Kenneth Rogoff, professor de economia na Universidade Harvard e ex-economista-chefe do Fundo Monetário Internacional. "A China não está em posição de ser o motor global de crescimento neste momento, e os fundamentos de longo prazo apontam para um crescimento muito mais lento na próxima década."

Esta é uma complicação indesejada em um ano em que a China tenta projetar força e estabilidade inabaláveis. No congresso do partido, Xi Jinping, o líder do país, deverá conseguir mais um mandato de cinco anos, consolidando ainda mais seu controle do poder.

Em maio, Li Keqiang, primeiro-ministro da China, convocou uma reunião de emergência e tocou o alarme sobre a necessidade de reforçar o crescimento econômico para mais de 100 mil autoridades de empresas e governos locais. O forte alerta lançou dúvidas sobre a capacidade da China de atingir sua meta anterior de crescimento de 5,5% neste ano.

A desaceleração do crescimento chinês complica uma economia global já frágil. A alta da inflação aumentou o risco de recessão nos Estados Unidos, enquanto a invasão da Ucrânia pela Rússia elevou os preços da energia e interrompeu as cadeias de suprimentos em toda a Europa. Em momentos anteriores de crise econômica, a China aliviou as pressões financeiras com acesso à manufatura barata e um mercado amplamente inexplorado de consumidores ansiosos para gastar.

Mas a China não está mais crescendo em saltos. As restrições da Covid-19 se combinaram com políticas implementadas nos últimos anos –como reprimir a especulação imobiliária e restringir o poder dos gigantes da tecnologia da China– para exacerbar a desaceleração. Até agora este ano, Starbucks, Nike e Hilton alertaram que os gastos fracos na China derrubaram as vendas.

Enquanto grande parte do mundo aprendeu a conviver com o coronavírus, a China adotou uma política de "Covid zero" para fazer o que for necessário para prevenir a infecção. Sob essa política, os moradores de um prédio inteiro de apartamentos podem ficar confinados em suas casas durante semanas se um único inquilino for infectado. Alguns casos positivos podem causar o bloqueio de um bairro inteiro de uma cidade.

Mesmo que o preço dessas políticas tenha se tornado aparente, Xi não vacilou. Ele disse que está disposto a suportar um sofrimento econômico passageiro para manter os cidadãos livres da Covid.

O mal-estar econômico mais recente ocorreu em abril e maio, quando Xangai, a maior cidade da China, entrou em confinamento por quase dois meses e o impacto se espalhou pela economia. Os prédios de escritórios foram fechados e os trabalhadores, obrigados a permanecer em casa. Em toda a China, centenas de milhões de consumidores foram isolados, deixando lojas, restaurantes e prestadores de serviços sem clientes.

As vendas no varejo, um indicador de quanto os consumidores estão gastando, caíram 4,6% de abril a junho em relação ao ano anterior, segundo o governo. E mesmo com a economia melhorando em junho a ameaça de mais quarentenas em massa pode atrapalhar essa recuperação nascente.

A empresa de valores mobiliários japonesa Nomura estimou que, na segunda-feira, 247 milhões de pessoas em 31 cidades estavam sob algum tipo de bloqueio na China, cobrindo cerca de um quinto da população nacional e representando o equivalente a cerca de US$ 4,3 trilhões em Produto Interno Bruto anual. O número de cidades afetadas quase triplicou em relação à semana anterior.

Pequim pediu às autoridades locais que intensifiquem as medidas para garantir a estabilidade no emprego durante os bloqueios. No entanto, com tantas pequenas e médias empresas sofrendo problemas financeiros, o governo tem lutado para controlar o aumento do desemprego.

Em junho, o desemprego estava em 5,5%, uma melhora em relação a abril e maio, mas perto do nível mais alto desde que a China começou a divulgar os números em 2018. Para os jovens de 16 a 24 anos que procuram emprego, que incluem os recém-formados em faculdades, a taxa de desemprego foi mais que o triplo, 19,3%.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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