Empresas buscam consultorias para escolher suas causas sociais

Desafio inicial é conscientizar o consumidor sobre a importância da causa defendida

Carolina Muniz
São Paulo

Abraçar uma causa faz bem, sobretudo para os negócios. Segundo um estudo global feito neste ano pela agência Edelman, 69% dos brasileiros levam em conta o posicionamento das marcas sobre questões políticas e sociais antes de comprar — um aumento de 13% em relação a 2017.

“As empresas que não mostrarem que acreditam em alguma coisa correm o risco de perder relevância”, diz Martin Montoya, diretor-executivo da Edelman no Brasil.

Mas se uma marca abraçar uma causa qualquer, sem ter envolvimento com ela, pode ser vista como oportunista —uma companhia que defende o uso de bicicletas, mas faz entregas de moto, por exemplo.

Por isso, já existem consultorias especializadas em ajudar empresas a descobrir qual causa apoiar e como fazer isso de forma autêntica.

Há cinco anos nesse mercado, a Cause atende organizações que, por boa vontade ou pressão dos consumidores, decidem ter uma causa. “A gente não cria, a gente identifica uma causa”, afirma a diretora-executiva da consultoria, Francine Lemos.

O trabalho consiste em avaliar o funcionamento e os valores da empresa e cruzá-los com as demandas da sociedade. “A investigação busca achar um ângulo que faça sentido para os dois lados”, diz ela.

Para Montoya, o aumento do uso de redes sociais e a queda de confiança no governo explicam por que os consumidores esperam que as empresas se posicionem. “A expectativa é que seja possível confiar em entidades que de fato estejam fazendo o bem”, diz.

“Hoje, o consumidor quer se apaixonar por uma marca e se sentir representado por ela”, diz Alex Seibel, fundador da Positiva, que, vende produtos de limpeza sustentáveis.

Para ele, conscientizar os consumidores sobre a importância da causa defendida pela empresa é o desafio inicial.

Alex Seibel, fundador da Positiva, na sede da empresa, na Lapa, zona oeste de São Paulo
Alex Seibel, fundador da Positiva, na sede da empresa, na Lapa, zona oeste de São Paulo - Gabriel Cabral/Folhapress

Depois que o cliente se identifica com a causa, ele cria uma relação com a marca e, dificilmente, vai substituí-la por outra que não se paute pelos mesmos valores, diz.

Seibel não revela o faturamento da empresa, mas diz que a Positiva cresceu neste ano em torno de 300% em comparação com 2017.

Posicionar-se também pode trazer riscos, principalmente quando envolve posições polêmicas, que talvez desagradem parte da clientela.

“Uma pequena empresa deve ter mais cuidado. Se ela pegar um viés equivocado, pode sofrer um baque na imagem que talvez não consiga suportar”, afirma o antropólogo e sociólogo Fred Lucio, professor da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing).

Muitas vezes, vale a pena arriscar perder clientes para fortalecer a relação com outros, que se tornam mais fiéis à marca. “Se posicionar tem a ver com entender a identidade da empresa e fazer escolhas”, diz Benjamin Rosenthal, especialista em cultura do consumo e professor da FGV (Fundação Getulio Vargas).

Desde quando abriu, em 2016, a hamburgueria Castro Burger, na Vila Mariana (zona sul de São Paulo) levanta a bandeira da diversidade, principalmente sexual.

Durante as eleições deste ano, o restaurante aderiu ao movimento “Ele Não”, que se opunha à candidatura do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL). Os dizeres da campanha foram colocados na entrada da hamburgueria e postados em suas redes sociais.

Alguns reclamaram, e um casal deixou o restaurante ao perceber a posição política da casa. Mas o proprietário Luiz Felipe Granata, 32, conhecido como Biro, não se arrepende. 

“Eu já sabia que algumas pessoas não iriam gostar, mas essa é nossa ideia, não faria sentido ser diferente. E isso repercutiu mais do lado positivo que do negativo”, afirma.

Especialistas não aconselham que as companhias se manifestem a favor ou contra um partido político. 

Ao posicionar-se sobre um tema sensível, é importante que a empresa esteja preparada para lidar com as reações, diz Rosenthal, da FGV. Isso significa tentar prever como a empresa pode ser atacada e já planejar respostas para várias possibilidades.

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