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Por que Xi Jinping está construindo estoques secretos de commodities na China

Vastos novos estoques de grãos, gás natural e petróleo sugerem problemas futuros

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Londres | The Economist

Nas últimas duas décadas, a China devorou enormes volumes de matérias-primas. Sua população cresceu mais e ficou mais rica, exigindo mais laticínios, grãos e carne. Suas gigantescas indústrias têm sido vorazes por energia e metais.

Nos últimos anos, no entanto, a economia tem sofrido com má gestão política e uma crise imobiliária. Autoridades chinesas afirmam categoricamente que desejam se afastar de indústrias intensivas em recursos. A lógica indica que o apetite do país por commodities deveria estar diminuindo rapidamente.

A imagem mostra um homem visto da linha do peito para cima no canto inferior direito da imagem em um ambiente formal, com um fundo de escadas vermelhas. Ele está vestindo um terno escuro e uma gravata vermelha, com uma expressão séria.
Xi Jinping, atual líder da China, durante uma sessão de fechamento da Assembleia Popular Nacional chinesa em Pequim - Tingshu Wang - 11.mar.2024/Reuters

Na realidade, o oposto está acontecendo. Em 2023, as importações da China de muitos recursos básicos bateram recordes, e as compras de todos os tipos de commodities aumentaram 16% em termos de volume. Elas continuam subindo, com alta de 6% nos primeiros cinco meses deste ano.

Dados os problemas econômicos do país, o cenário não reflete um aumento no consumo. Em vez disso, a China parece estar estocando materiais em um ritmo acelerado —e em um momento em que as commodities estão caras. Os formuladores de políticas em Pequim parecem estar preocupados com novas ameaças geopolíticas, especialmente a de um novo presidente norte-americano mais radical, que poderia tentar sufocar rotas de abastecimento cruciais para os chineses.

O medo é justificado, pois a China depende de recursos estrangeiros. Embora seja o centro de refino mundial para muitos metais, ela importa grande parte da matéria-prima que utiliza, variando de 70% da bauxita até 97% do cobalto. A China mantém as luzes acesas apenas com energia importada. O país tem muito carvão, mas seus depósitos de outros combustíveis não correspondem às suas necessidades, obrigando-o a importar 40% de seu gás natural e 70% de seu petróleo bruto.

A dependência da China é mais aguda para alimentos. Em 2000, quase tudo o que os cidadãos comiam era produzido internamente; hoje, o país produz menos de dois terços do que é consumido. O país importa 85% das 125 milhões de toneladas de soja que utiliza para alimentar seus 400 milhões de porcos. Sua dependência de agricultores estrangeiros é quase total para café, óleo de palma e alguns produtos lácteos.

Ciente dessa vulnerabilidade, a China começou a construir estoques "estratégicos" de grãos e minerais relacionados à defesa no final da Guerra Fria, aos quais acrescentou, no auge de seu boom econômico, petróleo e metais industriais.

Três eventos recentes provocaram mais estocagem. Em 2018, o presidente Donald Trump impôs tarifas às exportações chinesas no valor de US$ 60 bilhões por ano, forçando a China a retaliar impondo tarifas sobre soja americana. Em seguida veio a pandemia de Covid-19, que interrompeu as cadeias de abastecimento e aumentou o custo dos materiais. A guerra da Ucrânia inflacionou os preços e mostrou a vontade dos EUA de usar embargos.

Agora, Trump, que não esconde seu desejo de prejudicar a China, tem uma boa chance de retornar ao poder. Em um confronto, os EUA poderiam restringir suas próprias exportações de alimentos para a China, que se recuperaram desde que uma espécie de trégua foi alcançada, e pressionar outros grandes fornecedores, como Argentina e Brasil, a fazer o mesmo.

O país também poderia tentar influenciar nações que vendem metais para a China, incluindo Austrália e Chile. Além disso, a maioria das importações de commodities da China é feita por meio de estreitos e canais que os norte-americanos poderiam tentar bloquear para navios chineses, por exemplo, enviando navios militares.

A China parece estar se preparando para um ambiente mais hostil, começando com a ampliação da infraestrutura de armazenamento. Ao contrário dos Estados Unidos, onde as reservas estratégicas são controladas pelo estado, na China elas também assumem a forma de tanques privados, silos e armazéns, aos quais as autoridades em Pequim têm acesso em tempos de crise.

Desde 2020, a capacidade de armazenamento de petróleo da China aumentou de 1,7 bilhão para 2 bilhões de barris. A localização de muitos desses locais é secreta, mas imagens de satélite sugerem que, aqueles que tem o paradeiro conhecido, cresceram rapidamente desde 2022, diz Emma Li, da Vortexa, uma empresa de dados.

Da mesma forma, a capacidade de cavernas subterrâneas de gás cresceu seis vezes entre 2010 e 2020, atingindo 15 bmc (bilhões de metros cúbicos). A meta é atingir 55 bmc até o próximo ano. A China também está construindo cerca de uma dúzia de tanques para armazenar gás liquefeito ao longo de sua costa. O banco JPMorgan Chase prevê que a capacidade total de armazenamento de gás atingirá 85 bmc até 2030.

A China está agora preenchendo essas instalações. Em outro sinal de cautela crescente, estatísticos estatais pararam de divulgar dados sobre estoques de muitas commodities. No entanto, há maneiras de avaliar o grau de preocupação. O Usda (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos) prevê que, até o final da atual temporada de cultivo, os estoques de trigo e milho da China representarão, respectivamente, 51% e 67% do estoque do mundo, um aumento de cinco a dez pontos percentuais desde 2018.

Estima-se que esses números sejam suficientes para cobrir pelo menos um ano de demanda. Os estoques de soja, a maior importação agrícola da China, dobraram desde 2018 para 39 milhões de toneladas, e devem atingir 42 milhões de toneladas até o final da temporada.

Ainda mais marcante também tem sido o esforço da China para estocar metais e combustível. Comparando o fornecimento com a estimativa de cobre, níquel e outros metais que o país poderia ter consumido, Tom Price, do banco Panmure Liberum, avalia que os estoques do país desde 2018 tem sido suficientes para cobrir de 35% a 133% de sua demanda anual, dependendo da commodity. Até o final da primavera, a China também tinha 25 bcm de gás em estoque, o suficiente para atender 23 dias de consumo, acima dos 15 dias de cinco anos atrás. Parsley Ong, do JPMorgan, espera que essa cobertura alcance 28 dias até 2030.

Enquanto isso, os estoques de petróleo aumentaram em 900 mil barris por dia desde o início do ano, estima a consultoria Rapidan Energy. Com 1,5 milhão de barris diários, a taxa de enchimento foi a mais rápida em junho, sugerindo que está acelerando.

Isso ajudou os estoques de petróleo da China a atingirem cerca de 1,3 bilhão de barris, o suficiente para cobrir 115 dias de importações (os EUA possuem 800 milhões de barris). Além disso, a China pediu às empresas de petróleo para adicionar 60 milhões aos estoques até o final de março. A Rapidan acredita que as reservas crescerão ainda mais rápido, com a China adicionando até 700 milhões de barris até o final de 2025.

Esse armazenamento está preocupando os norte-americanos, não apenas porque poderia alimentar a inflação ao elevar os preços das commodities, mas também porque os suprimentos procurados pela China são aqueles necessários para sobreviver a um conflito, talvez durante um bloqueio de Taiwan.

"Quando você coloca isso em contraste com o aumento militar da China, começa a ser muito preocupante", diz Gabriel Collins, ex-analista do departamento de defesa dos Estados Unidos.

Por enquanto, as evidências sugerem que o estoque é, mais provavelmente, uma medida defensiva, uma vez que ainda não está em uma escala grande o suficiente para resistir a um conflito quente. Os funcionários americanos devem observar de perto o momento em que isso começar a mudar.

Texto do The Economist, traduzido por Pedro Teixeira, publicado sob licença. O artigo original, em inglês, pode ser encontrado em www.economist.com

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