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20/11/2012 - 18h28

Vítimas da tempestade Sandy sofrem de doenças decorrentes de danos

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DO "NEW YORK TIMES"

Vítimas do furacão Sandy vêm chegando, dia e noite, a salas de emergência improvisadas e centros de assistência emergencial como uma que foi montada num campo de atletismo em Long Beach, Nova York, ou numa tenda aquecida do tamanho de um ginásio escolar pequeno em Rockaways, também em Nova York.

As pessoas se queixam de erupções cutâneas, asma e tosse. Precisam de injeções antitetânicas porque --ansiosas por consertar suas casas e dotadas de instintos de sobrevivência-- vêm arrancando tábuas encharcadas e sendo feridas por pregos enferrujados.

As pessoas que chegam com dores de costas depois de vasculhar escombros recebem relaxantes musculares; as que apresentam dores no peito, depois de fazerem esforço excessivo, ganham monitores cardíacos. "Ando tossindo muito", revelou Gabriel McAuley, 46 anos. Desde a passagem do furacão Sandy ele vem trabalhando 16 horas por dia retirando escombros de casas em Rockaways. "Nunca antes tive uma tosse como esta. Ela vem lá do fundo."

É impossível dizer quantas pessoas já adoeceram em função do que o furacão Sandy deixou para trás: mofo em paredes de gesso que ficaram molhadas; vazamentos de tanques de óleo; águas residuais (devido às enchentes e à impossibilidade de usar a descarga de privadas), toneladas e mais toneladas de escombros e pó.

Mas entrevistas feitas na última semana com vítimas do furacão, pessoas que trabalham nos esforços de recuperação, autoridades de saúde e especialistas médicos revelam que algumas das doenças cujo surgimento eles temiam, com base nas substâncias tóxicas liberadas pelo furacão e na experiência vivida em desastres passados, especialmente o furacão Katrina, já começaram a se manifestar.

As salas de emergência e os centros de controle toxicológico já relataram casos de exposição a monóxido de carbono, devido ao uso equivocado de geradores elétricos e fogões para fornecer calor. Várias mortes em Nova Jersey foram atribuídas a isso.

Em Livingston, Nova Jersey, o Centro de Queimaduras do Centro Médico St. Barnabas recebeu 16 casos de queimaduras em seis dias, três vezes o número normal. Eram pessoas que tinham tentado driblar o frio e o escuro com água fervente, gasolina, velas e fluido de isqueiro.

Esgoto não tratado penetrou em casas em Baldwin e East Rockaway, em Nassau County, Nova York, quando uma usina de tratamento de esgoto foi fechada devido à inundação, e o sistema não conseguiu lidar com o excesso de esgoto recebido. A mesma coisa aconteceu com uma usina enorme de esgoto em Newark, Nova Jersey.

"Tentamos limitar nossa presença na casa, porque o fedor era horrível", falou Jennifer Ayres, 34, de Baldwin, que está ficando temporariamente em West Hempstead. Ela contou que se sentiu mal por vários dias, que seu filho está com a garganta irritada e que sua mãe, que vive com eles, teve dificuldade em respirar. Ayres atribuiu os problemas aos dois dias que eles passaram fazendo faxina na casa, na semana passada. "Tive problemas gástricos. Senti coceira terrível no rosto."

A tosse é um sintoma comum que autoridades de saúde disseram que poderia ser decorrente do mofo ou da nuvem de pó e areia levantada pelo furacão e as demolições. O ar em Rockaways está tão carregado de partículas que os policiais do trânsito vêm usando máscaras. Mas muitas pessoas trabalhando na recuperação não as usam, e isso preocupa pessoas que se recordam das consequências inesperadas de outra catástrofe.

"É como o 11 de Setembro", falou Kathy Smilardi, sentada diante do esqueleto de sua casa destruída em Broad Channel. Na tarde fria, sua respiração é visível quando ela fala, e ela está envolta num casaco branco. "Todo o mundo vem correndo fazer a limpeza, sem usar máscaras. Será que vamos esperar 20 anos para entender que há gente morrendo?"

Especialistas e autoridades de saúde dizem que os riscos são reais, mas pedem que se evite a histeria. Um pouco de tosse pode ser devida ao tempo frio e úmido. Para eles, para que mofo, poeira e outros problemas ambientais exerçam efeitos duradouros sobre a saúde, geralmente é necessária uma exposição contínua e de longo prazo a eles. E os efeitos de curto prazo podem ser mitigados com precauções como o uso de máscaras, luvas e botas e a remoção de paredes de gesto emboloradas.

"Limpar sujeira grossa, esgoto não tratado, vazamentos, remover paredes e escombros, reconstruir e dar cabo dos resíduos, tudo isso de fato traz motivos de preocupação", disse na sexta-feira Daniel Kass, o vice-comissário de saúde ambiental de Nova York. "Esses problemas são vastos e incontroláveis? Não. Mas dependem de as pessoas trabalharem corretamente e tomarem as precauções básicas."

KATRINA

Um problema semelhante após a passagem do furacão Katrina, que ficou conhecido como a tosse do Katrina, foi temporário, falou Roy J. Rando, professor da Escola de Saúde Pública e Medicina Tropical de Tulane. Felicia Rabito, epidemiologista na escola, falou que crianças saudáveis expostas a bolor após o Katrina não apresentaram sintomas respiratórios duradouros quando se mudaram para casas novas ou reformadas.

Imediatamente após o Katrina, o nível de chumbo no solo de Nova Orleans caiu, porque as camadas superiores de terra, em que chumbo de tinta e da gasolina podem se acumular, foram levadas embora. Mas nos dois anos seguintes, exames revelaram níveis muito altos de chumbo, que Rabito atribuiu aos trabalhos de renovação de casas velhas. "Que isso sirva de lição", disse ela. O chumbo no solo pode entrar nas casas e ser um perigo à saúde de crianças que brincam dentro ou fora de casa.

Embora pelo menos um surto de norovírus, um vírus gastrointestinal contagioso, tenha ocorrido numa escola do Brooklyn que foi usada como abrigo temporário, as autoridades de saúde de Nova York e Nova Jersey relataram não ter visto um aumento importante nas doenças respiratórias ou gastrointestinais relacionado ao furacão.

Em Broad Channel, a maioria das casas na Noel Road, onde vive Smilardi, têm tanques de óleo externos que o furacão derrubou. Toda a parte interna de muitas casas, construída na época em que era usado amianto, se encontra espalhada entre ruas maiores e menores.

O torso de Paul Nowinski estava coberto de pintas vermelhas preocupantes. Após a passagem do furacão, Nowinski, que é músico, entrou no porão inundado de sua casa em Rockaways para tentar resgatar discos, livros e instrumentos. Ele ficou com água até o peito e acha que a água talvez estivesse contaminada pelo esgoto. Nowinski disse que não sabe a causa das pintas vermelhas e que ele anda ocupado demais removendo escombros para ter tempo de ir ao médico.

No início da terceira semana após o furacão, Long Beach, alguns quilômetros a leste de Rockaways, tinha a aparência de uma cidade isolada de fronteira. As casas térreas que se alinham nas ruas de frente para o mar todas tinham pilhas de destroços diante delas --móveis inutilizados, paredes, tapetes, material de isolamento térmico.

Desde 5 de novembro, a Equipe federal de Assistência Médica em Desastres já atendeu mais de 500 pacientes em três barracas de alumínio reforçado montadas no campo de atletismo. Agora ela atende até 75 pacientes por dia, o dobro do número normal de pacientes na sala de emergência do vizinho Centro Médico de Long Beach, que foi fechado pelo furacão, segundo o comandante da unidade. Cerca de 10% dos pacientes têm sido crianças, segundo ele, muitas delas com problemas respiratórios. A unidade teve que reabastecer seu estoque de nebulizadores para adultos.

A artista Florence Ondre chegou com um dedo cortado e as costas doendo, depois de limpar sua casa inundada. Ela ainda tinha um farolete amarrado à testa. Disse que o bolor tinha ativado suas alergias. Ela perdeu peso desde a passagem do furacão. A equipe médica serviu sopa quente a ela e seu noivo. "Estamos trabalhando na limpeza todos os dias, do nascer do sol até a noite", disse Ondre. Ela tinha encomendado na Amazon um uniforme de proteção contra perigos ambientais, que tinha acabado de chegar.

David Liberman, 46, chegou queixando-se de dores no peito e estômago. A equipe o colocou num leito de acampamento na barraca, lhe aplicou um teste de estresse e prometeu repor seu estoque de insulina, que, segundo ele, tinha sido jogada fora por engano pela dona da casa quando ela limpou seu porão inundado.

Theo Kojak Soter chegou com arranhões e recebeu uma injeção antitetânica. "Quer um pirulito?" perguntou a enfermeira Bobbi Gearhardt, que veio do Ohio para colaborar. "Graças a Deus que este pessoal está aqui", disse Soter, 57. Ele contou que sua loja de carros modificados em Oceanside ficou debaixo de água e ele perdeu 12 automóveis. "Eram o meu plano de previdência." Ele saiu segurando o pirulito como se fosse sua salvação.

Tradução de CLARA ALLAIN

 

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