Descrição de chapéu The New York Times

Trump não pode cortar comércio com Pyongyang, mas tem opções

PAUL MOZUR
DO "NEW YORK TIMES", EM XANGAI (CHINA)

O presidente Donald Trump disse no domingo (3) que os EUA poderiam avaliar a suspensão de todo o comércio com os países que negociam com a Coreia do Norte, uma medida que poderia representar a catástrofe econômica para o país combativo.

Um problema: isso também representaria um desastre econômico para os EUA.

Apesar de anos de sanções econômicas e condenação internacional, a Coreia do Norte ainda tem um comércio modesto com muitos aliados dos EUA, como Brasil, Alemanha e México.

Mas o maior parceiro do Norte é de longe a China, que representa cerca de quatro quintos de seu comércio exterior e ajuda o país com combustível, alimentos e maquinário. A China também é o maior parceiro comercial dos EUA, um relacionamento que vale quase US$ 650 bilhões por ano em bens e serviços, cobrindo uma série de artigos, como peças de automóveis, suco de maçã e o sempre esperado novo iPhone da Apple.

Isso transforma em absurdo cortar todo o comércio dos EUA com a China, segundo especialistas. Mas o comentário radical de Trump representa bem as duras opções que os políticos americanos enfrentam.

Enquanto os EUA e outros países endureceram as sanções e avançaram para cortar a Coreia do Norte do resto do mundo econômico e financeiro, Pyongyang continua seus esforços para desenvolver armas nucleares e os mísseis para levá-las até seu destino.

Os EUA têm opções limitadas. Poderiam visar de maneira mais ampla as empresas chinesas que negociam com a Coreia do Norte. Mas isso poderia ser ineficaz contra um governo chinês que teme que as limitações comerciais possam agravar as condições no Norte, tornando sua situação ainda mais imprevisível.

"Se isso realmente começasse a fazer a economia cair em parafuso, eles poderiam reagir de maneira mais radical", disse John Delury, professor na Universidade Yonsei, em Seul.

O teste de uma arma nuclear pela Coreia do Norte no domingo levou autoridades da Casa Branca a ameaçar novas sanções contra empresas e países que continuam fazendo negócios com Pyongyang. Isso provocou críticas da China nesta segunda-feira (4), que chamou de "inaceitável" a ideia de medidas comerciais contra ela.

"Isso não é objetivo nem justo", disse em um comunicado à imprensa Geng Shuang, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China.

Em termos de comércio global, a Coreia do Norte é basicamente um erro de cálculo. O comércio chinês com o Norte totalizou apenas cerca de US$ 3 bilhões nos primeiros sete meses de 2017 —aproximadamente o mesmo que no ano passado—, enquanto a China compra menos carvão, roupas e outros bens. (Em comparação, os EUA exportaram US$ 11 bilhões em milho em 2016.)

Mas se a China compra menos está exportando mais. Neste ano, apesar de novas sanções, duras advertências de Trump à China e uma série de armas testadas pela Coreia do Norte, as exportações chinesas para Pyongyang cresceram mais de 22% até julho, comparadas com as do ano anterior, em parte por causa das vendas crescentes de equipamento elétrico e mecânico, segundo dados da firma de pesquisas IHS Markit, Global Trade Atlas.

Alguns analistas americanos pediram novas políticas que pressionem um leque maior de empresas chinesas. Os grandes bancos estatais e companhias chineses deveriam ser incluídos porque são em última instância controlados pelo governo, segundo Daniel Blumenthal, um analista do Instituto Americano de Empresas, um grupo conservador.

"O ponto seria que o próprio Partido Comunista Chinês sentisse a dor de seu relacionamento com Kim", disse Blumenthal, referindo-se ao líder norte-coreano.

Enquanto fábricas têxteis obscuras e empresas comerciais fronteiriças formam grande parte do comércio da China com a Coreia do Norte, várias das maiores marcas chinesas também enviaram ocasionalmente produtos ao Norte nos últimos anos, embora as vendas sejam muito pequenas comparadas com as de outros lugares. Algumas dessas empresas também vendem produtos nos EUA.

Praticamente todos os fabricantes chineses de eletrodomésticos venderam produtos na Coreia do Norte, incluindo TCL e Hisense. As duas venderam um leque de produtos, incluindo refrigeradores, ar-condicionados, televisores e outros eletrônicos.

A Midea, companhia que adquiriu a fabricante de robôs alemã Kuka no ano passado, apesar de objeções na Europa, fez negócios esporádicos com a Coreia do Norte. Mais recentemente, em novembro, ela enviou unidades de refrigeração, ar-condicionados, canos de cobre e outros produtos eletrônicos.

Entre as fabricantes de carros chineses, a Great Wall, a Chery e a Geely venderam peças de carros ou veículos para a Coreia do Norte. Durante um desfile nesta primavera em homenagem ao aniversário de Kim Il-sung, o fundador do país, um jornalista visitante tirou fotos de caminhões feitos por uma empresa chamada Sinotruk puxando mísseis submarinos. A companhia enviou US$ 1,2 milhão em veículos e peças à Coreia do Norte nos últimos anos.

A fabricante de baterias e carros elétricos BYD fez negócios de cerca de US$ 14 milhões com a Coreia do Norte desde 2012, e os carregamentos continuaram até recentemente. Em janeiro, a empresa enviou produtos de borracha ao país, e em dezembro enviou veículos. A BYD é negociada na Bolsa de Hong Kong e é apoiada por Warren Buffett, que possui uma participação de 10% na companhia.

No verão de 2014, a fabricante chinesa de cerveja Tsingtao enviou cerca de US$ 20 mil em cerveja ao país, juntamente com guarda-sóis e copos.

Mas qualquer esforço dos EUA para reduzir o comércio da China com a Coreia do Norte poderia retroagir se criar divisões entre Washington, Pequim e Seul.

"Seria ótimo para eles", disse Delury, da Universidade Yonsei, referindo-se ao governo de Pyongyang. "A Coreia do Norte apenas alimentaria isso. Eles teriam iniciado uma guerra comercial entre a China e os EUA. Seria uma enorme burrice."

Tradução de LUIZ ROBERTO MENDES GONÇALVES

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