Assassinato marca perda da última jogada política do ex-ditador do Iêmen

DE SÃO PAULO

Ditador do Iêmen por 33 anos, Ali Abdullah Saleh fez sua última jogada política nesta segunda-feira (4) e perdeu, encontrando sua morte pelas mãos dos houthis, seus aliados da vez na multifacetada guerra civil iemenita.

Um mestre em forjar alianças e promover seus interesses pessoais na sociedade tribal muito armada e turbulenta do Iêmen, Saleh unificou o país pela força, mas também ajudou a levá-lo ao colapso em sua última guerra.

O ditador uma vez comparou administrar o Iêmen a "dançar sobre as cabeças de cobras", governando o país com doses balanceadas de generosidade e de força.

Saleh parecia inabalável em um dos mais pobres e instáveis países do mundo. Ele conseguiu fazer com que seus inimigos brigassem uns com os outros, enquanto disputas tribais, movimentos separatistas e militantes islâmicos desestabilizavam o Iêmen.

O mandatário se tornou líder do Iêmen do Norte em 1978, quando o Iêmen do Sul era um país comunista separado, e promoveu a unificação dos dois em 1990, após o colapso da União Soviética.

Opositores sempre reclamaram que o Iêmen sob Saleh não conseguiu atender as necessidades básicas do povo, com dois em cada três cidadãos vivendo com menos de US$ 2 por dia.

Ele conseguiu manter potências ocidentais e árabes a seu lado, apresentando-se como um aliado dos EUA em sua guerra contra o terrorismo, e recebeu dezenas de milhares de dólares em ajuda militar americana para unidades comandadas por seus parentes.

Saleh aborreceu seus aliados do Golfo ao se aproximar de Saddam Hussein durante a ocupação iraquiana do Kuait (1990-91), levando à expulsão de 1 milhão de iemenitas da Arábia Saudita.

Mas então ganhou aplausos das potências ocidentais por levar adiante reformas ocidentais desenhadas pelo FMI e pelo Banco Mundial, além de fazer esforços para atrair investimento estrangeiro.

Após o 11 de Setembro, o Iêmen entrou no radar dos EUA como uma fonte de "soldados" para a rede da Al Qaeda de Osama bin Laden —que nasceu na Arábia Saudita, mas cuja família era da região iemenita de Hadramaut.

O ditador cooperou com os EUA, enquanto a CIA aumentou sua campanha de ataques de drones contra alvos da Al Qaeda, o que levou a inúmeras mortes de civis.

Encurralado pelos protestos pró-democracia da Primavera Árabe, Saleh levava um sorriso enigmático quando assinou sua renúncia em uma cerimônia na TV em 2012.

Enquanto outros líderes foram mortos ou depostos pelos levantes, ele se retirou pacificamente para sua casa na capital e planejou seu retorno. Saleh obteve imunidade em acordo e permaneceu um ator político poderoso.

Fez uma aliança com os houthis quando o grupo —que Saleh havia combatido entre 2002 e 2009— tomou a capital, Sanaa, em 2014.

O líder iemenita foi uma figura central na guerra que matou ao menos 10 mil pessoas, deslocou 2 milhões de suas casas, levou milhares à fome e entregou o país a uma epidemia de cólera.

Crédito: Editoria de Arte/Folhapress
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