Sem rivais de peso, Sisi deverá confirmar hoje reeleição no Egito

Governo incentiva ida à urna para legitimar pleito no qual presidente enfrentou desconhecido

Dervixe (místico islâmico) levanta tecido colorido enquanto dança ao lado de cartaz do presidente  do Egito, Abdel Fattah al-Sisi, perto de uma seção eleitoral; ao fundo passam duas mulheres com véu islâmico
Dervixe (místico islâmico) dança ao lado de um pôster do presidente do Egito, Abdel Fattah al-Sisi, que deve ser reeleito, no Cairo - Fethi Belaid/AFP
Diogo Bercito
Madri

As eleições egípcias terminaram sem incidentes nesta quarta (28) após três dias de votação. Para conhecer seu resultado, não será preciso consultar nem mesmo autoridades eleitorais: o atual presidente, Abdel Fattah al-Sisi, será reeleito após seus cinco principais rivais desistirem.

Com os demais presos ou pressionados a deixar a disputa, sobrou apenas o obscuro candidato Moussa Moustafa Moussa, que já fez campanha pelo próprio Sisi.

Resultados preliminares serão divulgados nesta quinta (29), e os números finais, na segunda (2). Se nenhum dos dois superar 51% dos votos, haverá segundo turno.

"Esta não é uma eleição de verdade, e sim um plebiscito. O homem que está concorrendo contra Sisi é um completo desconhecido", disse à Folha o ativista político egípcio George Ishak, membro do Conselho Nacional para os Direitos Humanos. "Por isso, boicotamos o pleito."

A Presidência do Egito é um dos postos mais influentes do Oriente Médio. É o país árabe mais populoso (são 95 milhões de pessoas) e o berço tradicional de correntes políticas. Foi, por exemplo, o palanque do nacionalista Gamal Abdel Nasser nos anos 1950 e 1960.

Com a vitória de Sisi garantida, a dúvida é o índice de participação. Esse foi de 47% em 2014, porcentagem que o governo quer ampliar como instrumento de legitimação.

O jornal governista Al-Akhbar descreveu um fluxo de "milhões de eleitores se regozijando em todas as praças", enquanto correspondentes internacionais notaram, por sua vez, o vazio nas urnas.

A agência de notícias Reuters entrevistou eleitores que disseram ter recebido pagamento em dinheiro e cestas básicas como incentivo para votar —ou ao menos pintar os dedos para fingir tê-lo feito.

O governo egípcio não respondeu às acusações e insistiu em que as eleições transcorreram de maneira livre. O voto é obrigatório no Egito, mas as multas de quase R$ 100 raramente são cobradas.

TEATRO

No final da jornada eleitoral, uma tempestade de areia chegou ao Cairo.

Para incentivar o voto, o chefe da comissão eleitoral, Lasheen Ibrahim, pediu na TV: "Declarem ao mundo que o Egito sempre faz história, pois vocês são os faraós, os responsáveis pela civilização que assombrou o mundo".

Essas foram as terceiras eleições no Egito desde que os protestos de janeiro de 2011 derrubaram Hosni Mubarak após 30 anos no poder.

O primeiro pleito, em 2012, elegeu o islamita Mohamed Mursi, que seria deposto um ano depois. Sisi, que liderou o golpe, venceu a eleição seguinte, em 2014, com 97% dos votos, segundo o governo.

Ministro da Defesa e comandante das Forças Armadas quando participou do golpe que derrubou Mursi, Sisi deixou o Exército para se candidatar em 2014, despindo-se da imagem de militar.

Seus quatro anos de governo foram marcados pelo endurecimento na luta contra o terrorismo —sem impedir, porém, ataques como a queda de um avião no Sinai e repetidas explosões em igrejas.

Ele também enrijeceu a repressão contra a população, detendo a oposição e empurrando a organização islamita Irmandade Muçulmana de volta ao subterrâneo político.

Seu rival nestas eleições era o arquiteto Moussa, pouco conhecido.

Líder do Conselho Egípcio de Tribos Árabes, ele representava o partido centrista liberal al-Ghad.

Sua candidatura foi apresentada uma hora antes do fim do prazo, em janeiro, e os egípcios engasgaram em seguida ao ver que Moussa elogiava Sisi em redes sociais.

Moussa disse a jornalistas ter decidido concorrer depois de ver todos os outros candidatos desistirem, em uma lista que inclui o ex-premiê Ahmed Shafiq, o advogado Khaled Ali e o ex-chefe das Forças Armadas Sami Anan.

O sobrinho do ex-presidente Anwar Sadat (1918-1981), Mohamed, também abandonou a disputa.

Com isso, opositores disseram que a candidatura de Moussa era apenas uma maneira de legitimar uma eleição com vencedor já determinado: Sisi.

 

ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS NO EGITO

 O Egito é o país árabe mais populoso, com 95 milhões de habitantes, sendo 60 milhões de eleitores

 

Presidência do Egito/AFP

Abdel-Fattah al-Sisi Ex-ministro-chefe da Defesa e ex-chefe das Forças Armadas, foi o responsável pelo golpe que tirou o islamita Mohamed Mursi do poder. Ele foi eleito em 2014.

CRONOLOGIA

2011 Protestos levam à derrocada do ditador Hosni Mubarak, após 30 anos no poder

2012 O islamita Mohammed Mursi é eleito representando a Irmandade Muçulmana

2013 Respondendo a manifestações, o Exército depõe Mursi, que é detido

2015 O ex-general Sisi é eleito com 97% dos votos, prometendo a estabilidade do país

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