Consolidação de Erdogan na Presidência distancia Turquia da UE

Avanço da oposição parlamentar nas eleições de domingo pode abrir janelas

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Cartaz da campanha do presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, em Istambul
Cartaz da campanha do presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, em Istambul - Aris Messinis - 18.jun.2018/AFP
Istambul

A Turquia e a União Europeia começaram a negociar em 2005 o que prometia ser uma revolução diplomática: o ingresso do país muçulmano de quase 80 milhões de pessoas em um bloco econômico constituído por alguns de seus inimigos históricos.

Esse processo, no entanto, chega moribundo às eleições turcas deste domingo (24), com a guinada autoritária sob o governo de Recep Tayyip Erdogan, que foi primeiro-ministro turco de 2003 a 2014 e presidente desde então. 

Erdogan, que deve ser reeleito presidente, prefere fortalecer seus laços com a Rússia e o Irã, afastando-se da Europa. No ínterim, ele se projeta militarmente na Síria, seu vizinho em guerra civil desde 2011, em uma tática que beneficia a sua campanha.

A animosidade entre Ancara e os europeus chegou a tal ponto que já não se conta com a ideia de que a Turquia possa fazer parte do bloco. Ambos os lados parecem ter desistido de levar a cabo o projeto.

Em um relatório divulgado em abril deste ano, a Comissão Europeia (o braço executivo do bloco) condenou a Turquia pela repressão iniciada em meados de 2016, após uma tentativa frustrada de golpe de Estado. Mais de 150 mil pessoas foram detidas nos últimos dois anos de purga, incluindo jornalistas, e 110 mil servidores públicos foram exonerados.

Em resposta, a Turquia insiste que é perseguida pela União Europeia e afirma que o bloco é mais leniente com violações cometidas por seus membros. O governo turco se ressente de ter implementado uma série de reformas sem ter visto reflexo disso no processo de adesão e afirma ser vítima de islamofobia dos europeus.

“Caso Erdogan vença as eleições, o processo de adesão à União Europeia vai finalmente perder todo o sentido”, diz à Folha o analista turco Ozgur Unluhisarcikli, especializado em diplomacia. “Não há interesse de nenhuma das partes. Ao menos não nesta Turquia nem nesta União Europeia.”

Mas o cenário poderá ser diferente se a oposição turca conseguir avançar nestas eleições, em que se vota ao mesmo tempo para presidente e para o Parlamento.

Erdogan deve vencer o pleito presidencial (pesquisa com 2.460 pessoas em 13 de junho estima que ele terá 44,5% dos votos, enquanto o social-democrata Muharrem Ince, em segundo, obterá 29%).

Mas a disputa pelo Parlamento está acirrada, e uma aliança de partidos de oposição pode tirar do presidente a sua maioria legislativa. A sigla dele, o AKP (Partido Justiça e Desenvolvimento), aparece com 41,5% dos votos em sondagem feita de 8 a 11 de junho com 2.410 pessoas. Nas eleições de 2015, tinha recebido 49% dos votos. Em ambas as pesquisas, a margem de erro não foi divulgada.

Se o governo perder de fato sua influência no Parlamento, poderão avançar ali alternativas à adesão à União Europeia, como acordos bilaterais e de cooperação entre a Turquia e o bloco econômico, diz Unluhisarcikli. Já há conversas sobre não exigir mais visto aos turcos no bloco europeu. “Isso sim pode interessar aos dois lados”, afirma.

Enquanto lida com as críticas europeias, no entanto, o governo turco tem encontrado interlocutores mais afins. Nos últimos anos em especial, Erdogan investiu em um potente eixo alternativo entre Ancara, Moscou e Teerã.

As relações entre Turquia e Rússia têm sobrevivido inclusive às divergências estratégicas na guerra na Síria, onde o governo turco aposta nos rebeldes e os russos defendem o ditador Bashar al-Assad.

O fato de a Turquia ter se envolvido na guerra da vizinha Síria sob a justificativa de cuidar de sua própria segurança deve ainda ajudar Erdogan neste pleito, segundo Unluhisarcikli. O presidente turco usa a Síria para se projetar como um um poderoso líder global, de acordo com ele.

“A população se enxerga no Exército e gosta de vê-lo em ação. Isto explica, por exemplo, as recentes incursões militares turcas na Síria.”

Nesta segunda-feira (18), por exemplo, em comício às margens do mar Negro, Erdogan falou dos avanços da campanha no país vizinho —agradando seu eleitorado nacionalista e conservador com as notícias da guerra.

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