Esvaziada, Nagorno-Karabakh recebe primeira missão da ONU em 30 anos

Tomada de controle pelo Azerbaijão impulsionou êxodo de ao menos 100 mil armênios étnicos com receio de Baku

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Emil Guliyev Mariam Harutyunyan
Lachin (Azerbaijão) e Ierevan | AFP

A primeira missão da ONU em três décadas em Nagorno-Karabakh chegou neste domingo (1º) ao local "principalmente para avaliar necessidades humanitárias", informou o Azerbaijão, depois que quase toda a população armênia do enclave fugiu da região devido à ofensiva-relâmpago vitoriosa de Baku.

Esta é a primeira vez em 30 anos que a organização internacional tem acesso à região, controlada por separatistas armênios até sua rendição após a ação militar, o que provocou o êxodo dos quase 120 mil armênios étnicos que moravam na região, reconhecida internacionalmente como território azeri, para a Armênia.

Crianças refugiadas na cidade de Goris, na Armênia, após ação militar do Azerbaijão para expulsar separatistas de Nagorno-Karabakh
Crianças refugiadas na cidade de Goris, na Armênia, após ação militar do Azerbaijão para expulsar separatistas de Nagorno-Karabakh - Diego Herrera/AFP

Nazeli Baghdasarian, porta-voz do primeiro-ministro armênio Nikol Pashinyan, informou que o governo contabilizou a entrada de 100.483 deslocados até o momento. Cerca de 47.300 estão refugiados em abrigos temporários, informou Ierevan.

O fluxo ininterrupto e caótico reavivou as denúncias da Armênia de limpeza étnica, o que o Azerbaijão nega, depois que pediu aos armênios que continuassem em Nagorno-Karabakh e insistiu que seus direitos seriam respeitados.

"Nós evitamos deliberadamente exibir bandeiras do Azerbaijão, sabemos que ainda restam civis e temos consciências dos seus medos", disse Hikmet Hajiyev, conselheiro da Presidência do Azerbaijão, no sábado (30).

Nagorno-Karabakh, de maioria armênia e cristã, proclamou a secessão do Azerbaijão, de maioria muçulmana, após o colapso da União Soviética, que bagunçou as fronteiras do Cáucaso.

Desde então, dois conflitos em três décadas marcaram a região: o primeiro entre 1988 e 1994, quando armênios dominaram parte do território no entorno do enclave, e o segundo no fim de 2020, quando o Azerbaijão retomou a terra perdida na guerra passada.

Neste domingo, o posto de fronteira no corredor de Lachin, a única rodovia que liga os dois territórios, estava deserto. Serguei Astsarian, 40, foi um dos últimos a deixar Nagorno-Karabakh. "A população que viveu durante séculos deveria poder permanecer, sejam armênios ou de outros grupos étnicos. Não é certo expulsar, pela força ou de outro modo", disse.

A governo do Azerbaijão anunciou que abriu um serviço de migração em Khankendi, a principal cidade do território (Stepanakert, em armênio) para registrar os habitantes que decidiram permanecer e garantir sua "reinserção duradoura" na sociedade azeri.

Na Armênia, o fim do projeto dos separatistas de Nagorno-Karabakh foi recebido com pesar —muitos consideram este território uma parte de suas terras ancestrais. O país celebrou neste domingo uma jornada de oração por Nagorno-Karabakh e os sinos das igrejas tocaram em sinal de respeito.

Karekin 2º, o patriarca da Igreja Ortodoxa Armênia, celebrou uma missa na principal catedral do país, em Echmiatsin, perto de Ierevan. Na capital, centenas de pessoas compareceram a uma cerimônia na igreja de São Sarkis, um santo e herói armênio. No Vaticano, o papa Francisco pediu o "diálogo" entre os países vizinhos e o fim da crise humanitária com a ajuda da comunidade internacional.

"Uma das páginas mais trágicas da história da Armênia está sendo escrita hoje", afirmou à AFP Mariam Vartanian, de 28 anos. A Armênia, com população de 2,8 milhões de pessoas, enfrenta agora um desafio para abrigar os refugiados.

Stepanakert, em Nagorno-Karabakh, será palco de negociações entre autoridades azeris e armênias nesta segunda-feira (2). O presidente do Azerbaijão e o primeiro-ministro da Armênia devem se reunir na quinta-feira (5) na cidade espanhola de Granada.

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