Rússia e China vetam resolução dos EUA que determinava cessar-fogo em Gaza

Washington fracassa em votação no Conselho de Segurança da ONU e ouve críticas de hipocrisia vindas de Moscou e Pequim

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Washington

A Rússia e a China vetaram uma resolução proposta pelos Estados Unidos no Conselho de Segurança das Nações Unidas que determinava "o imperativo" de um cessar-fogo imediato e duradouro na guerra entre Israel e o Hamas na Faixa de Gaza associado à libertação dos reféns em poder do grupo terrorista.

O placar foi de 11 votos a favor (EUA, Reino Unido, França, Equador, Japão, Malta, Moçambique, Coreia do Sul, Serra Leoa, Eslovênia e Suíça), 3 contrários (Rússia, China e Argélia) e 1 abstenção (Guiana).

A embaixadora dos EUA nas Nações Unidas, Linda Thomas-Greenfield, durante reunião do Conselho de Segurança - AFP

A votação ocorreu nesta sexta-feira (22). O embaixador russo na ONU, Vassili Nebenzia, rotulou o texto de enganoso por não ser claro o suficiente sobre a necessidade de um cessar-fogo, atrelando-o somente à libertação dos reféns, e por supostamente dar um sinal verde para a ofensiva de Tel Aviv em Rafah.

"Isso liberaria as mãos de Israel e resultaria em toda Gaza e sua população tendo que enfrentar destruição, devastação e expulsão", afirmou o enviado de Vladimir Putin.

O representante da China, Zhang Jun, também não poupou adjetivos e chamou os EUA de hipócritas. Pediu ainda que uma resolução alternativa, mais clara sobre a cessação permanente das hostilidades, seja posta em votação.

A acusação de hipocrisia contra Washington foi ecoada também por Nebenzia, que pontuou que os americanos vinham bloqueando as resoluções que pediam um cessar-fogo —foram três propostas vetadas pelos EUA: de Brasil, Emirados Árabes Unidos e Argélia.

O russo disse ainda que a proposta votada hoje é uma tentativa de o governo Joe Biden "jogar um osso" para seus eleitores —o americano vem sendo alvo de protestos por seu apoio a Israel, sobretudo da comunidade árabe-americana e de jovens, grupos que podem fazer a diferença em uma eleição apertada contra Donald Trump.

Além de falar em um cessar-fogo, o texto proposto pelos americanos destacava "a necessidade urgente de expandir o fluxo de ajuda humanitária" e a suspensão de "todas as barreiras" para que esses recursos cheguem aos habitantes de Gaza. A proposta também condena os atos de terrorismo cometidos pelo Hamas e ações que reduzam o território palestino.

A embaixadora dos EUA na ONU, Linda Thomas-Greenfield, não ouviu as críticas de forma passiva. "A Rússia tem a audácia e a hipocrisia de jogar pedras quando ela própria tem um teto de vidro", afirmou, em referência à Guerra da Ucrânia.

Antes do fracasso da resolução, ela havia destacado o que chamou de "trabalho incansável" dos EUA em nome de um cessar-fogo "duradouro e imediato", "Esse é um momento em que o Conselho de Segurança tem um papel crítico. Essa resolução vai colocar pressão sobre o Hamas para aceitar um acordo", disse.

A proposta americana acontece em meio às tentativas do país de fazer Tel Aviv desistir de uma operação militar em Rafah. Nesta sexta, o secretário de Estado, Antony Blinken, esteve em Israel para reiterar a mensagem de que "uma grande operação militar em Rafah seria um erro".

O chefe da diplomacia americana criticou os vetos russo e chinês, classificados de "cínicos" por ele. "Acredito que estávamos tentando mostrar à comunidade internacional um senso de urgência em conseguir um cessar-fogo ligado à libertação de reféns —algo que todos, incluindo os países que vetaram a resolução, deveriam ter apoiado. A resolução, é claro, também condenava o Hamas. É inimaginável por que países não seriam capazes de fazer isso."

O forte apoio americano ao seu maior aliado no Oriente Médio passa por um período turbulento diante das críticas às operações de Israel. Segundo o Ministério da Saúde de Gaza, controlado pelo Hamas, mais de 32 mil pessoas foram mortas desde o início da guerra, em sua maioria mulheres e crianças.

Pressionado dentro e fora dos EUA, o presidente Joe Biden mudou seu discurso e passou a cobrar publicamente o primeiro-ministro israelense, Binyamin Netanyahu. Em conexão com a postura mais crítica ao aliado, Washington também implementou sanções contra colonos judeus na Cisjordânia associados a episódios de violência.

No ano passado, os EUA vetaram uma resolução proposta pelo Brasil pouco tempo após a eclosão do conflito que falava em pausas humanitárias, sob a justificativa de que o texto não reconhecia o direito de Israel de se defender.

No início de dezembro, Washington também derrubou o texto proposto pelos Emirados Árabes Unidos alegando que ele era utópico e "incapaz de mudar a situação em campo em termos práticos".

Em fevereiro, os americanos usaram novamente seu poder de bloqueio contra uma resolução proposta pela Argélia. O argumento foi que o texto não vinculava o cessar-fogo à soltura dos reféns que continuam em Gaza e, portanto, poderia comprometer "negociações delicadas" em curso.

Esta é a nona vez que o Conselho de Segurança vota uma resolução sobre o conflito entre Israel e o Hamas. Até agora, apenas duas foram aprovadas. O fracasso de mais uma resolução reforça as críticas à inação da instância máxima da ONU, imobilizada pelo poder de veto dos seus cinco membros permanentes.

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