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Eleições 2018

Ao apoiar Bolsonaro, Edir Macedo volta às origens antipetistas e à 'satanização' de Lula

Líder da Igreja Universal declarou nas redes sociais seu endosso a presidenciável do PSL

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São Paulo

O apoio do bispo Edir Macedo a Jair Bolsonaro põe sua Igreja Universal do Reino de Deus de volta aos trilhos antipetistas que foram sua rota preferencial nos anos 1980/90.

Dono da TV Record, Macedo declarou sua simpatia pelo presidenciável do PSL na sexta (28) no Facebook, após ser provocado por um de seus seguidores: "Queremos saber, bispo, do seu posicionamento sobre a eleição para presidente". O líder evangélico respondeu com uma só palavra: "Bolsonaro".  

Tudo menos PT: a mesma lógica guiou Macedo no primeiro pleito de um Brasil redemocratizado. E Fernando Collor de Mello era então o candidato que melhor rivalizava com o petismo.  

No Facebook, bispo Edir Macedo diz que apoia Bolsonaro
No Facebook, bispo Edir Macedo diz que apoia Bolsonaro - Reprodução

"No segundo turno de 1989, os evangélicos viam no candidato da esquerda, Luiz Inácio Lula da Silva, um verdadeiro 'satã'; era o medo de 'um comunista' ou 'anticristo' ganhar as eleições", diz o doutor em ciências sociais pela PUC-SP  Rafael Lopez Villasenor no artigo "A Estratégia Política da Igreja Universal do Reino de Deus: Um Estudo sobre as Eleições Presidenciais 1989, 1994 e 2002". 

Havia temor, por exemplo, que o petista fechasse igrejas. Naquele ano, o líder da Universal chegou a declarar que, "após orar e pedir a Deus que indicasse uma pessoa, o Espírito Santo nos convenceu que Fernando Collor de Mello era o escolhido”.

Em 2012, Silas Malafaia —que 23 anos antes apoiou Leonel Brizola e, no segundo turno, Lula— lembraria em entrevista à Folha "quando ele [o petista] era o diabo no meio evangélico". O colega Edir Macedo, afirmou o pastor,  "chegou à igreja, abriu a camisa escrita Collor e chamou Lula de diabo".

As bordoadas no PT se repetiram em 1994, quando a igreja usou seu jornal, a Folha Universal, para atacar Lula, presidenciável pela segunda vez.

Naquela eleição, da qual Fernando Henrique Cardoso (PSDB) emergiria como vencedor, o petista estampou mais de uma capa da publicação. Uma delas trazia como manchete, em letras vermelhas, "Lula apela para o candomblé", mais a foto do candidato na Baixada Fluminense com uma mãe de santo.

As religiões afrobrasileiras, em geral, são mal vistas pelo segmento evangélico, cisma alimentada pelo próprio bispo Macedo, que nos anos 1980 lançou o livro " Orixás, Caboclos e Guias: Deuses ou Demônios?" —especialistas associam parte da rivalidade a uma disputa pelo mercado de fiéis à disposição das religiões "nanicas", já que bater de frente com a ainda hegemônica Igreja Católica ainda não era uma hipótese plausível (hoje os evangélicos já são três em cada dez brasileiros).  

Os humores da Universal com o PT só mudaram na quarta tentativa de Lula (esta, bem-sucedida) de chegar ao Palácio do Planalto, em 2002.

A aproximação teve como maestro Carlos Rodrigues, então deputado pelo PL de José Alencar (o vice de Lula) e bispo da Universal. Ele acabaria perdendo o título religioso em 2004, no auge das denúncias de envolvimento no caso Waldomiro Diniz, naquele que ficou conhecido como escândalo dos bingos. Depois seria condenado e mandado à prisão no julgamento do mensalão.

Em 2001, quando ganhavam força os burburinhos de uma aliança entre petistas e Universal, a coluna Painel reproduziu a reação irônica de um ministro tucano: "Lula tem de engolir Edir Macedo como parte de seu visual light. Mas com uma dieta dessa ele vai acabar com uma indigestão!".

A eleição da sucessora de Lula também contou com a estima de um dos líderes religiosos mais influentes do país. Em 2010, a Folha Universal publicou reportagem com o título "Boato do Mal" para respaldar Dilma Rousseff, sob tiroteio de católicos e evangélicos por uma declaração favorável ao aborto que havia dado três anos antes, em sabatina da Folha: "No Brasil, é um absurdo que não haja [descriminalização do aborto], até porque nós sabemos em que condições as mulheres recorrem ao aborto".

A dias da votação, Dilma se encontrou com o dono da Record, que publicara na internet uma carta em sua defesa. Nela, Macedo dizia que a petista era vítima de mentiras e acusava aqueles que espalhavam boatos de fazer "o jogo do diabo". "O Senhor Jesus não precisa de advogados, nem de assessores de comunicação que saiam em 'defesa' de Seu Nome. Ele precisa de verdadeiros cristãos, que entendam, vivam e preguem a Verdade", escreveu.

Dilma precisou repetir várias vezes, naquela campanha, que era pessoalmente contrária ao aborto e que não sugeriria uma medida para mudar a legislação. O assunto, dizia, precisa ser tratado como sendo de saúde pública.

O apoio do bispo foi recompensado, e um dos maiores quadros do PRB, braço político da Universal, chegou à Esplanada de Dilma: Marcelo Crivella, sobrinho de Macedo e hoje prefeito do Rio.

O endosso a Bolsonaro é um retorno às origens antipetistas da Universal.

Oficialmente, o PRB está coligado com a chapa do tucano Geraldo Alckmin  —a sigla surgiu em 2005 e teve como um dos fundadores José Alencar, o vice lulista. Mas a polarização em 2018 levou um quinhão da legenda a se inclinar àquele que veem como adversário mais capacitado a vencer o PT. Bolsonaro.

Presidente do PRB e ex-ministro de Michel Temer, Marcos Pereira afirma que a sigla, se pudesse, não teria embarcado no governo petista. As pautas do Partido dos Trabalhadores, "principalmente para economia e costumes, nas questões ligadas à família, não coadunam com as nossas", diz à Folha. "Não tem como reescrever a história, mas podemos reescrevê-la para frente."

Edir Macedo prega há tempos o engajamento dos evangélicos com a política. Em seu livro “Plano de Poder” (2008), ele alerta para uma inércia “nociva” no eleitorado cristão, em parte por uma “interpretação errônea de que Deus fará tudo sem que a pessoa precise mover uma palha”

“Maquiavel definiu [a política] como ‘a arte de governar e estabelecer o poder’ ('O Príncipe'). Sendo assim, do ponto de vista de Deus, com quem você acha que Ele desejaria que estivesse esse poder e domínio? Nas mãos de Seu povo ou não?”

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