Descrição de chapéu Governo Bolsonaro

Bolsonaro quer doar sobra de campanha para hospital, mas resolução proíbe

Justiça Eleitoral determina devolução à União dos recursos obtidos em vaquinha durante eleição

Santa Casa de Juiz de Fora (MG), hospital no qual Jair Bolsonaro (PSL) foi atendido após sofrer ataque durante ato de campanha
Santa Casa de Juiz de Fora (MG), hospital no qual Jair Bolsonaro (PSL) foi atendido após sofrer ataque durante ato de campanha - Ricardo Moraes - 6.set.2018/Reuters
Rodrigo Borges Delfim
São Paulo

O presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) anunciou nesta terça-feira (30) que pretende doar o excedente do valor arrecadado em vaquinha virtual por sua campanha à Santa Casa de Juiz de Fora (MG), onde foi atendido após o ataque com faca sofrido no último dia 6 de setembro.

"Nossa campanha custou cerca de R$ 1,5 milhão, menos que a metade do que foi arrecadado com doações individuais. Pretendo doar o restante para a Santa Casa de Juiz de Fora, onde nasci novamente. Acredito que aqueles que em mim confiaram estarão de acordo", escreveu o presidente eleito em sua conta do Twitter.

À luz da Justiça Eleitoral, no entanto, esse ato de benevolência, terá de ser revisto. Ou pelo menos não poderá ser feito com o valor não utilizado pela campanha que veio a partir de financiamento coletivo, conforme anunciado pelo capitão reformado.

A resolução 23.553 do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), de 18 de dezembro de 2017, determina que sobras de campanha eleitorais arrecadadas por meio das chamadas vaquinhas virtuais sejam recolhidas ao Tesouro Nacional.

Especialistas ouvidos pela Folha endossaram o que indica a legislação eleitoral sobre o financiamento coletivo de campanhas. Esta é a primeira eleição a contar com esse tipo de fonte de recursos para o processo.

"É um dinheiro que passa a ser público, ainda que ele tenha recebido de pessoa física. E os eventuais excedentes têm de ser depositados e devolvidos para os cofres da União. O candidato não pode fazer aquilo o que ele bem entender com as sobras de campanha", afirmou o advogado especialista em direito eleitoral Alexandre Rollo.

De acordo com a prestação de contas disponível no site do TSE, a campanha de Bolsonaro arrecadou R$ 4.150.097,17, sendo que 89,85% desse valor —R$ 3.728.964— vieram por meio de financiamento coletivo. Outros R$ 348.125,24 (8,39%) vieram da direção nacional do PSL, partido pelo qual Bolsonaro disputou a eleição.

Já as despesas totalizaram R$ 2.452.212, 91, deixando um excedente de R$ 1.697.884,26 —contrariando as cifras mencionadas pelo presidente eleito na rede social.

Tais valores ainda podem ser atualizados, já que a prestação de contas ainda não está finalizada.

"Provavelmente o jurídico [da campanha] vai avisá-lo de que ele vai ter que recuar [dessa promessa]. Não vai poder cumprir essa palavra porque a legislação eleitoral não permite", aponta Rollo.

Já Diogo Rais, professor de direito eleitoral na Universidade Mackenzie, aponta que toda sobra da campanha deve ser destinada ao partido político, salvo o que vem de financiamento coletivo —que deve ir para o Tesouro Nacional. Do contrário, fica configurado um desvio de finalidade desse recurso.

"As pessoas que doaram [à campanha] participaram de um projeto, que tem começo, meio e fim, que se finalizou com a eleição. Por mais que possa ser nobre [a doação], juridicamente falando haveria um desvio de finalidade."

Sobre a possibilidade de o próprio partido, o PSL, decidir fazer a doação anunciada por Bolsonaro, Rais pondera que a verba do Fundo Partidário deve ser usada para fins partidários.

"Doações, ainda que sejam do partido, não me parece que esteja alinhado com essa finalidade partidária".

Outro lado

Karina Kufa coordenadora jurídica da campanha de Bolsonaro, informou que nada será feito sem a previsão legal ou autorização da Justiça Eleitoral.

"Os recursos de campanha terão destinação conforme determina a legislação eleitoral, como sempre foi feito ao longo de toda campanha por orientação do próprio presidente eleito, Jair Bolsonaro. O desejo do candidato de transferir a sobra de campanha por arrecadação da vaquinha é pela enorme  gratidão que tem em razão do atendimento que recebeu após o atentando". 

A coordenadora afirma ainda que vai checar junto ao TSE a possibilidade de realizar a doação. "Como a sobra será destinada ao diretório nacional, como determina a lei, já que não se trata de sobra de FEFC que seria recolhido à União via GRU, nem fundo partidário que teria destinação específica na conta do partido, vamos questionar ao TSE sobre a possibilidade de se realizar a destinação conforme a autonomia partidária, já que não incide a regra do art. 44 da Lei 9096/95 a essa espécie de recurso". 

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