Bolsonaro se refere a aniversário do golpe de 64 como 'dia da liberdade'

Relatório da Comissão Nacional da Verdade afirma que 423 pessoas foram mortas ou desapareceram na ditadura militar

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Brasília

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) se referiu ao aniversário do golpe militar de 1964, nesta terça-feira (31), como "o dia da liberdade".

Ao sair do Palácio da Alvorada, o presidente parou para conversar com apoiadores. Questionado por um simpatizante sobre o 31 de março, o presidente respondeu: "Hoje é o dia da liberdade". Capitão reformado do exército, Bolsonaro é um defensor da ditadura militar que vigorou no Brasil de 1964 e 1985.

O golpe inaugurou uma ditadura que durou 21 anos, período em que o país teve cinco presidentes militares. Em seu momento de maior repressão política, o regime fechou o Congresso Nacional e as assembleias estaduais.

Relatório final da Comissão Nacional da Verdade, apresentado em 2014, afirmou que 423 pessoas foram mortas ou desapareceram no período que vai de 1964 a 1985. Segundo a comissão, os crimes foram resultado de uma política de Estado, com diretrizes definidas pelos presidentes militares e seus ministros.

O presidente Jair Bolsonaro cumprimenta apoiadores e fala com a imprensa ao sair do palácio da Alvorada - Pedro Ladeira - 30.mar.2020/Folhapress

Bolsonaro não foi a única autoridade a defender o regime de exceção nesta terça-feira. O vice-presidente, general Hamilton Mourão, publicou uma homenagem em sua conta no Twitter.

"Há 56 anos, as forças armadas intervieram na política nacional para enfrentar a desordem, subversão e corrupção que abalavam as instituições e assustavam a população. Com a eleição [indireta] do general Castello Branco [o primeiro presidente da ditadura], iniciaram-se as reformas que desenvolveram o Brasil", escreveu o vice-presidente.

Além das manifestações do presidente e de seu vice, o Ministério da Defesa publicou, na noite de segunda (30), uma nota alusiva à data. O texto chama a tomada de poder pelos militares de "marco para a democracia brasileira".

O informe, conhecido como ordem do dia, também diz que, à época, "a sociedade brasileira, os empresários e a imprensa entenderam as ameaças daquele momento, se aliaram e reagiram".

O ministério se refere às supostas ameaças como "ingredientes utópicos" que "embalavam sonhos com promessas de igualdades fáceis e liberdades mágicas". "O movimento de 1964 é um marco para a democracia brasileira. Muito mais pelo que evitou", conclui o documento.

Em nota, o Instituto Vladimir Herzog repudiou o posicionamento do governo. "Tal conduta não pode passar desapercebida e, por isso, nos somaremos a outras entidades para denunciar mais esta afronta à democracia a instâncias nacionais e internacionais, na expectativa de que medidas cabíveis sejam tomadas", diz a nota sobre os posicionamento do vice-presidente e do Ministério da Defesa.

O instituto, que leva o nome de um jornalista torturado e assassinado durante a Ditadura Militar, afirmou que ainda hoje "convivemos com o legado autoritário dos anos de chumbo".

"Marco para a democracia e desenvolvimento para o Brasil será o dia em que o Poder Judiciário —atento ao fato de que a República Federativa do Brasil se constitui em um Estado Democrático de Direito e tem como fundamento a dignidade da pessoa humana— processar e, se demonstrada a responsabilidade, punir os muitos torturadores já identificados do período", afirma a nota.

Ao deixar o Alvorada nesta terça-feira, Bolsonaro também foi questionado sobre as declarações de seu ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta. Na segunda, o ministro disse que, diante da pandemia do novo coronavírus, não adianta isolar apenas os idosos, como tem defendido o presidente.

O presidente reagiu. Primeiro disse que não sabia o que seu subordinado tinha falado —"eu parto do princípio que tenho que ver, porque acreditar no que está escrito"— e em seguida afirmou: "Não se esqueça que eu sou o presidente".

Bolsonaro também usou uma fala do diretor-geral da OMS (Organização Mundial da Saúde), Tedros Adhanom Ghebreyesus, para justificar seus argumentos de que a população precisa voltar a trabalhar para não sofrer os prejuízos econômicos do período de isolamento.

"Vocês viram o que o diretor da OMS falou? Que tal eu ocupar a rede nacional de rádio e tevê à noite para falar sobre isso? O que ele disse praticamente? [Que,] em especial os informais, têm que trabalhar."

Apesar de sua declaração, Bolsonaro não mencionou que o dirigente da organização internacional também destacou que o isolamento social é hoje a principal medida de enfrentamento ao Covid-19.

A entrevista de Bolsonaro nesta terça foi marcada por interrupções de seus apoiadores.

Em determinado momento, um dos simpatizantes, que gravava a conversa, acusou os repórteres presentes de "jogar os ministros contra Bolsonaro" e, aos gritos, os chamou de "canalhas".

Diante das queixas dos repórteres de que o objetivo da entrevista era ouvir o presidente, e não um apoiador, Bolsonaro respondeu: "É [o apoiador] ele que vai falar". Nesse momento, os profissionais de comunicação presentes na coletiva se afastaram da área de imprensa e se retiraram da entrevista.

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