Descrição de chapéu forças armadas

Almirante ligado a Bolsonaro deixa Marinha escanteado e sem função de oficial-general

Flávio Rocha era o último almirante na Força vinculado a ex-presidente

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Brasília

Ex-secretário do governo Jair Bolsonaro (PL), o almirante de esquadra Flávio Rocha foi para a reserva da Marinha no início do mês após concluir o período de quatro anos no Almirantado, a cúpula da Força naval.

Rocha era o último almirante diretamente vinculado a Bolsonaro nos quadros da ativa da Marinha, por mais que não tenha mantido contato com o ex-presidente após o fim do governo.

Sua saída representa o fim de uma crise que envolveu a Marinha, o Ministério da Defesa e o Itamaraty.

O almirante Flávio Rocha foi secretário de Assuntos Estratégicos do governo Bolsonaro enquanto estava no Almirantado, cúpula da Marinha - Marcos Correa/Presidência da República

Foi por pressão do Ministério das Relações Exteriores que o governo evitou que Rocha assumisse o cargo de secretário de Segurança Nuclear e Qualidade da Marinha.

Os pedidos da diplomacia tinham como pano de fundo a atuação do almirante como uma espécie de chanceler paralelo durante o mandato de Bolsonaro, passando a influenciar decisões no Itamaraty tanto nas gestões de Ernesto Araújo como de Carlos França.

O protagonismo de Rocha causou incômodo entre diplomatas, e a reação só ocorreu quando o almirante voltou à Marinha após a derrota de Bolsonaro.

O ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, foi o responsável por barrar a nomeação de Flávio Rocha na secretaria que cuida de assuntos nucleares.

Rocha acabou escanteado, sem cargo executivo, nomeado como assessor do gabinete do comandante para assuntos de segurança nuclear e proteção radiológica —função que não figura entre os 91 cargos privativos para oficiais-generais na Marinha.

"A Marinha ressalta que não houve cerimônia para a passagem à reserva do referido Almirante", disse a Força, em nota. A Folha procurou Flávio Rocha, mas ele preferiu não comentar.

A Marinha teve uma das transições de cargo mais complicadas entre as Forças quando Lula (PT) venceu a disputa presidencial. O então comandante, almirante Almir Garnier, dificultou conversas com a nova gestão, negou convites de José Múcio para reuniões e, em ato inédito desde a redemocratização, faltou à passagem de comando para o almirante Marcos Olsen.

Garnier é apontado pela Polícia Federal como o único chefe militar que teria concordado com os planos golpistas apresentados por Jair Bolsonaro após perder a eleição. Segundo o ex-comandante da Aeronáutica Baptista Júnior, ele teria colocado tropas à disposição do ex-presidente.

O histórico recente da Marinha e a indisposição do governo com os militares que haviam trabalhado em posições de destaque sob Bolsonaro fizeram Rocha cair —sem perder, porém, o apoio e admiração dos pares.

O almirante Flávio Rocha era um dos oficiais-generais da Marinha mais envolvidos em assuntos nucleares. Na Secretaria de Assuntos Estratégicos, ele foi um dos responsáveis por promover uma virada nas negociações pelo combustível do submarino nuclear brasileiro.

Enquanto a Marinha buscava desatar nós na negociação com a França, Rocha buscou autoridades russas para iniciar conversas com foco em conseguir a tecnologia para a integração do reator nuclear ao submarino.

O almirante visitou Moscou no fim de 2021 para amarrar os pontos da cooperação militar, e Bolsonaro apresentou o projeto do submarino nuclear a Vladimir Putin durante a polêmica viagem à Rússia pouco antes do início da guerra contra a Ucrânia, em fevereiro de 2022.

Mesmo escanteado e com cargo rebaixado na burocracia da Marinha, Flávio Rocha fez, já no governo Lula, seis viagens internacionais para tratar de negociações sobre o submarino nuclear brasileiro.

Foram quatro visitas à França no período. A primeira, em fevereiro de 2023, acompanhando o comandante Olsen em Paris. Outras viagens foram a Cherbourg, Toulon e Orly.

Ele também foi a Viena, na Áustria, para participar de pelo menos duas reuniões da AIEA (Agência Internacional de Energia Atômica) —presença que causou rebuliço na missão brasileira junto ao órgão de 35 nações.

Diplomatas com conhecimento do assunto afirmam que o problema era o caráter militar em um evento civil, ainda mais no momento em que a AIEA questiona os desígnios do Brasil, que pediu à agência um acordo para poder usar combustível nuclear em uma embarcação militar, apesar de não ter armas atômicas.

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