Equilíbrio na saúde privada passa por integração e mudanças na remuneração

Especialistas debateram o tema no 5º fórum A Saúde do Brasil, organizado pela Folha, nesta segunda-feira (23)

Simone Sanches Freire, diretora da ANS, Denise Eloi, diretora-executiva do Instituto Coalizão Saúde, Bruno Sobral de Carvalho, consultor da Federação Brasileira de Hospitais, e Everton Lopes Batista, jornalista da Folha e mediador do debate - Reinaldo Canato/Folhapress
Gabriel Bosa
São Paulo

A integração entre todos os agentes de prestação de serviços de saúde, as mudanças na forma de remuneração das operadoras e a orientação aos usuários são meios para retomar o equilíbrio no sistema de saúde suplementar do Brasil.

Estas foram as conclusões dos especialistas que integraram a primeira mesa do quinto fórum A Saúde do Brasil, organizado pela Folha, com patrocínio da Amil, da Anab (Associação Nacional das Administradoras de Benefícios), e apoio da Fundação Getulio Vargas, da FenaSaúde (Federação Nacional de Saúde Suplementar) e da Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein.

O sistema de saúde privado no país perdeu cerca de 3 milhões de beneficiários desde 2015, segundo Denise Eloi, diretora-executiva do Instituto Coalizão Saúde, entidade criada para a fomentação de políticas para o segmento.

“Um dos grandes desafios do setor é o aumento dos custos em saúde. É uma preocupação não só no Brasil, mas em todo o mundo, e isso não passa só pelo sistema privado, é uma preocupação que não vemos nenhuma saída sem que haja uma ação na cadeia produtiva”, disse.

A recessão econômica brasileira e a queda nos empregos formais foram apontadas como a principal razão da diminuição do número de beneficiários.

A queda de usuários do sistema privado está associada também ao fechamento de unidades de saúde em todo o país, de acordo com Bruno Sobral de Carvalho, consultor da Federação Brasileira de Hospitais.

Segundo o especialista, entre janeiro de 2010 e janeiro de 2018, houve um déficit de 430 hospitais, entre os que encerraram as atividades e os que abriram. O índice reflete em 31 mil leitos a menos à disposição do sistema privado.

“Em 2010, tínhamos 2,2 leitos para mil habitantes, agora temos 2 leitos por mil habitantes. A OMS [Organização Mundial da Saúde] não preconiza um número ideal, mas a média mundial é de 3 leitos para cada mil habitantes”, afirmou Carvalho.

Com base em dados do Ministério da Saúde, a Federação Brasileira de Hospitais identificou que 71% das instituições fechadas não eram filantrópicas, que 69% delas não estavam nas capitais e que 94% delas mantinham até 150 leitos.

“As perdas foram maiores no Nordeste, com 13% do total. O Sudeste aparece depois, com 11%. Do total do Sudeste, o estado do Rio perdeu 34% dos seus leitos.”

Além da crise financeira, Carvalho cita o desencontro entre o valor pago pelo governo federal pelos serviços e o seu preço real. “A maioria dos procedimentos é precificada de uma maneira que não cobre a despesa. Hoje, os atendimentos em hospitais privados giram em torno de 60% no atendimento do SUS. Também há uma carga tributária muito grande. Os hospitais estão pagando 38% em tributos.”

Pagamento deve priorizar eficiência

A forma de remuneração no sistema privado também foi criticada pelos debatedores. Atualmente, o pagamento é realizado pelo sistema “Fee For Service”, que integra o número de procedimentos realizados, como consultas, processos cirúrgicos ou medicamentos receitados.

“É um modelo posto que privilegia a ineficiência. Quanto mais doente o cidadão, mais o hospital ganha. É um modelo perverso e falido”, afirmou Eloi.

Entre as formas alternativas estudadas, a remuneração por performance é um dos mais avançados. A metodologia prevê o pagamento por meio da análise dos resultados de desempenho no tratamento dos pacientes de cada unidade.

A mudança é encarada positivamente pelos órgãos públicos e trará melhorias aos usuários do sistema, segundo Simone Sanches Freire, diretora da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar).

“A medição de qualidade em saúde é indispensável. As coisas nunca são feitas isoladamente, precisam ser feitas em conjunto e precisam lidar com mais transparência de dados para chegar a um modelo de remuneração mais justa ao paciente.”

A alteração, porém, deve se seguida de uma série de análises para comprovar a sua eficácia, segundo Carvalho. “Medir a performance do sistema é mais importante do que medir a performance de um prestador, de um médico ou de uma clínica.”

Apesar dos debates, Eloi afirma que qualquer alteração será acompanhada por representantes de todos os meios do sistema privado de saúde. “Os players têm demonstrado disposição para o diálogo e soluções em conjunto. O desafio é transformar em algo que dê resultados. Tem de buscar articulações tendo o cidadão no centro do cuidado”, afirmou.

A especialista também afirmou que as transformações serão alcançadas por meio do investimento em tecnologias e preparação de todos que atuam no sistema.

“Nenhuma mudança é tranquila. As operadoras estão se posicionando de forma diferente. Há dez anos, elas vendiam o acesso à saúde, agora elas passam a atuar como gestora. Dentro da agência reguladora, estamos abertos para chegar em um consenso”, complementou Freire.

Orientação aos pacientes

O uso inadequado pelos beneficiários também contribui pelo desequilíbrio do sistema privado de saúde. De acordo com os especialistas, os usuários devem ser orientados quanto às atribuições de seus planos.

“O usuário precisa ser educado para conhecer os custos daquele cuidado, conhecer que demanda efetiva reverte pagamento de tarifa mais cara. Educar e informar são necessários por nossa parte como órgão regulador e também por quem oferece o serviço”, disse a diretora de fiscalização da ANS.

Para ela, o uso do pronto-socorro como consultório de especialidade reflete em prejuízos para toda a cadeia do sistema. “Ele não é orientado a agir de outra forma. É preciso fazer uma ação muito forte de educação para o beneficiário ser o gestor da saúde dele.”

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