Nelson Barbosa

Professor da FGV e da UnB, ex-ministro da Fazenda e do Planejamento (2015-2016). É doutor em economia pela New School for Social Research.

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Nelson Barbosa

Analistas apontam frequentemente que a carga tributária brasileira é elevada, sobretudo quando comparada com a de outras economias emergentes.

Embora isso seja verdade, é preciso mencionar que ela caiu nos últimos dez anos. Esse dado, juntamente com a evolução e a composição da carga tributária brasileira de 2016, foi divulgado no apagar das luzes de 2017.

Não obstante a discrição do governo em divulgar a carga tributária com um ano de defasagem, os números revelam alguns fatos interessantes para nosso debate de política econômica.

Em primeiro lugar, ao comparar o Brasil com países da América Latina e Caribe, a própria Receita apontou que nossa carga tributária caiu 1,2 ponto percentual do PIB entre 2006 e 2015. Na maioria dos países latino-americanos houve aumento no mesmo período, com Equador (+8,3 pontos percentuais) e Argentina (+7,0 pontos) no topo da lista.

Em segundo lugar, considerando 2016, a carga tributária atingiu 32,4% do PIB (vou poupar os leitores segunda casa decimal), ante 32,1% no ano anterior. Esse aumento decorreu basicamente da regularização de ativos no exterior por parte de contribuintes brasileiros.

A arrecadação total da "repatriação" de recursos foi de R$ 46,8 bilhões em 2016 (uma herança bendita do governo Dilma). Porém, como o conceito de carga tributária não inclui multas e encargos legais, o impacto da repatriação sobre a arrecadação de impostos foi de R$ 23,5 bilhões (0,4% do PIB) em 2016.

A reversão parcial da desoneração da folha de pagamentos, aprovada ainda em 2015, também foi importante para o aumento da arrecadação do governo em 2016 (outra herança bendita).

Considerando somente os tributos sobre renda, propriedade e folha de salários, a arrecadação subiu 0,8 ponto do PIB em 2016. Assim, apesar das evidências e de comentários em contrário, o besouro voa. Houve recuperação de receita centrada em tributos diretos e contribuições sobre a folha em 2016, fruto de medidas propostas e aprovadas ainda em 2015, durante o governo Dilma.

Do ponto de vista federativo, a carga brasileira se divide entre tributos federais, estaduais, municipais e "parafiscais". O último item corresponde às contribuições para o FGTS e o sistema S, que, apesar de arrecadas pela União, não são receita do governo federal.

Comparando os dados de 2016 com 2002, houve alta de 0,3 ponto do PIB na carga tributária devido à elevação da arrecadação dos municípios (mais 0,5 ponto do PIB) e do FGTS e do sistema S (mais 0,5 ponto do PIB). No caso da União, houve redução de receita tributária (menos 0,6 ponto do PIB), enquanto nos Estados o valor ficou praticamente estável (menos 0,1 ponto do PIB).

Esses resultados demonstram que, contrariamente à visão de algumas lideranças empresariais, não houve "sanha arrecadadora" do Estado desde 2003. O que de fato ocorreu foi um aumento da arrecadação do governo puxada pela formalização do mercado de trabalho (beneficiando o INSS, FGTS e até líderes empresariais sem empresa do sistema S) e pelo aumento de tributos municipais (ISS e IPTU).

Olhando para a frente, ainda há muito que avançar. O Estado brasileiro continua a obter a maior parte de sua receita tributária de modo indireto e regressivo, taxando bens e serviços. O aumento da progressividade de nossos tributos é um dos temas difíceis, mas necessários, para o debate eleitoral de 2018.

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