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Senado recorre de decisão sobre desoneração, e Pacheco critica governo

Presidente do Senado se reuniu com consultores e disse que ação da AGU foi 'catastrófica'

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Brasília e São Paulo

O Senado recorreu na noite desta sexta-feira (26) da decisão do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Cristiano Zanin que suspendeu trechos da lei que prorrogou a desoneração da folha de empresas e prefeituras.

O presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), criticou o governo Lula (PT) e chamou a ação da AGU (Advocacia-Geral da União) —que representa a União— de "catastrófica". Ele disse que o Congresso foi surpreendido com a decisão do governo federal de acionar o Judiciário e que o erro foi não só técnico, mas também político.

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, e o presidente Lula em evento no Palácio do Planalto - Pedro Ladeira - 30.ago.2023/ Folhapress

"[O assunto] surpreendeu a todos, especialmente pelo momento que nós estamos vivendo de discussão e busca por alinhamento entre o governo federal e o Congresso Nacional", disse Pacheco após se reunir com consultores do Senado.

O presidente do Senado elencou medidas do Ministério da Fazenda aprovadas pelo Congresso que deram fôlego às contas públicas e disse que o governo agiu como se o problema do Brasil fosse provocado pelos municípios e pelos 17 setores da economia beneficiados.

"O que gerou perplexidade e muita insatisfação ao Congresso Nacional foi o comportamento do governo federal. Por que precipitar uma ação dessa natureza, que acaba fomentando o fenômeno que nós queremos evitar no Brasil, que é a judicialização política, quando nós estamos discutindo justamente nessa semana adiamento de sessão do Congresso Nacional [...]?", disse o presidente do Senado.

"Já que se invoca tanto essa questão de responsabilidade fiscal nessa petição que parece muito catastrófica da Advocacia-Geral da União, como se a desoneração da folha fosse o grande mal do país, os municípios brasileiros fossem a grande razão do problema, é preciso então ter uma ampla discussão sobre gasto público e corte de gasto por parte do governo federal. Qual a proposta do governo além de arrecadar, qual é a proposta de corte de gasto para poder equilibrar as contas?"

Apesar das duras críticas ao governo federal, o senador poupou o Supremo e fez questão de dizer que "a indignação é com o governo e não com o Judiciário". Pacheco declarou ainda que "qualquer decisão será respeitada", "evidentemente".

"Decisões judiciais, não nos cabe fazer qualquer tipo de ataque. Por mais que a gente discorde, a gente respeita. É muito importante que a gente retome a lógica de respeito a decisões judiciais no Brasil. O que nos surpreendeu foi a decisão do governo federal", afirmou.

"Está todo o empresariado perplexo e com dificuldades hoje de trabalhar no Brasil em razão dos excessos de oneração, criação de impostos, aumento de alíquotas. Já que houve essa provocação de uma reflexão em relação a isso, então vamos fazer um grande debate agora, também, a respeito de como se aumenta a arrecadação sem sacrificar o contribuinte que produz e gera emprego e onde podemos cortar os excessos de gastos públicos."

Após a declaração, o ministro da AGU, Jorge Messias, afirmou em nota que tem "profundo respeito" por Pacheco, que o ministério apresentou argumentos técnicos jurídicos na ação e que é importante o "diálogo institucional".

"Do ponto de vista da atuação institucional da AGU, faz-se necessário pontuar que apresentamos argumentos técnicos jurídicos pela inconstitucionalidade da chamada legislação que prorrogou e/ou criou desoneração para 17 setores e para os cerca de 5 mil municípios", disse Messias.

"A atuação da AGU, portanto, em assistência ao Presidente da República, sempre se pautará pelo mais elevado respeito institucional aos Poderes da República e seguirá no bom rumo da construção da harmonia entre os Poderes", afirmou o ministro na nota.

O principal argumento do relator da matéria no STF é o de que a desoneração foi aprovada pelo Congresso "sem a adequada demonstração do impacto financeiro". O governo diz que há violação da LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal) e da Constituição.

Do ponto de vista técnico, Pacheco afirmou que o Congresso vai demonstrar ao Supremo que houve a estimativa orçamentária e financeira exigida por lei. O senador ainda sugeriu um estudo para analisar o impacto da desoneração no pagamento da contribuição por parte das prefeituras.

"Esse requisito invocado pela AGU como descumprido para justificar o acolhimento da ADI [ação direta de inconstitucionalidade] não procede. Isso está materializado no processo legislativo e nas demonstrações que nós faremos ao Supremo Tribunal Federal."

A desoneração da folha foi criada em 2011, na gestão Dilma Rousseff (PT), e prorrogada sucessivas vezes. A medida permite o pagamento de alíquotas de 1% a 4,5% sobre a receita bruta, em vez de 20% sobre a folha de salários para a Previdência.

A desoneração vale para 17 setores da economia. Entre eles está o de comunicação, no qual se insere o Grupo Folha, empresa que edita a Folha. Também são contemplados os segmentos de calçados, call center, confecção e vestuário, construção civil, entre outros.

A prorrogação do benefício até o fim de 2027 foi aprovada pelo Congresso no ano passado e o benefício foi estendido às prefeituras, mas o texto foi integralmente vetado por Lula. Em dezembro, o Legislativo decidiu derrubar o veto.

SETORES FALAM EM 'RETROCESSO' E AUMENTO DO DESEMPREGO

As entidades afetadas pela medida reagiram com reprovação. Uma nota conjunta assinada por representantes dos 17 setores, destaca que eles empregam 9,3 milhões de profissionais, e que foram criados 151 mil empregos nos dois primeiros meses de 2024. "Além disso, o salário médio nestes setores é 12,7% superior aos setores que não contam com essa desoneração tributária."

De acordo com a Cbic (Câmara Brasileira da Indústria da Construção), restabelecer a tributação exclusivamente sobre a mão de obra implicará na queda da competitividade e na redução de postos de trabalho.

"A construção trabalha com ciclos de produção e planejamento de longo prazo. É danoso para o setor que uma obra seja iniciada considerando uma forma de contribuição e que, no meio do processo, [a empresa] precise considerar um novo formato", diz Renato Correia, presidente da entidade.

O presidente executivo da Abicalçados (Associação Brasileira da Indústria de Calçados), Haroldo Ferreira, classifica a medida como um "retrocesso".

"É um balde de água fria para o setor calçadista, que recentemente reportou a criação de mais de 5 mil empregos no primeiro bimestre do ano, no que parecia ser o início de uma recuperação lenta e importante depois de um ano de 2023 de dificuldades."

Um estudo divulgado pela entidade estima um impacto de redução da produção acima de 20% (o equivalente a 150 milhões de pares), e a demissão de aproximadamente 30 mil trabalhadores após dois anos de reoneração da folha.

"Ao judicializar a questão, o Executivo cria um cenário de total imprevisibilidade, que gera incertezas, abala a confiança dos setores produtivos e conspira contra a manutenção e criação de empregos", avalia a Abit (Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção).

Para os representantes do setor têxtil, a insegurança jurídica tem corroído a competitividade e agravado os custos das empresas que operam no Brasil.

Segundo a Fetpesp (Federação das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado de São Paulo), a decisão, "claramente contrária à preservação dos empregos no país", vai ter um impacto negativo nas empresas de transporte que ainda sofrem com os efeitos da pandemia.

"Além disso, aumentará o custo das tarifas de ônibus, sobrecarregando a população que depende desse meio de transporte."

"Caso a medida seja derrubada, os impactos socioeconômicos serão graves, pois a imprevisibilidade referente à contribuição previdenciária patronal, agravando os ônus trabalhistas, causará imenso prejuízo às empresas", diz nota da Ciesp (Centro das Indústrias do Estado de São Paulo).

Segundo a entidade, as empresas já fizeram investimentos e admitiram trabalhadores a partir de cálculos que consideravam a manutenção da desoneração.

A Firjan (Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro) defende a manutenção da lei, "de forma a manter a competitividade de importantes setores da economia nacional, evitando, assim, penalizar novamente o setor produtivo".

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